VIRAMUNDO 139 –

Zaira de Lima era uma menina esperta, mas calada.

Vivia observando tudo o que acontecia em sua volta.

A mãe, costureira, o pai, trabalhava numa oficina mecânica de automóveis e o irmão mais novo só queria jogar bola no meio da rua.

Naquela época a Rua do Areal era só areia fofa e só passava jipe e carroça.

Zaíra adorava quando passava jipe porque corria atrás e pegava carona.

Podia ser quem fosse.

Ela foi estudar no Grupo Escolar Isabel Gondim, nas Rocas, pertinho de casa.

Era de casa pra escola e não brincava muito na rua.

Um dia a diretora da escola mandou chamar dona Naeciza, a mãe dela.

– Quero informar a senhora que Zaíra anda falando palavrão e isso não permitimos.

– Pois ela aprende isso aqui na Escola. Lá em casa ninguém fala palavrão.

– Não é possível. Aqui na Escola não ensinamos isso.

– Pois veja isso porque eu nunca vi minha filha falar nada feio.

Volta e vai pra casa e Zaíra perguntou:

– Mãe, porra é “nome feio”?

– É horrível. Nunca mais fale isso, viu?

– quem você ouviu falar?

– A professora Zilda quando cortou o dedo.

– Pois não fale não. É feio.

Zaíra passou a ter cuidado com palavras desconhecidas e sempre perguntava pra mãe o significado delas.

Os meninos da rua falavam muito “nome feio”, mas Zaíra não ligava.

Pertinho da casa dela morava uma cantora famosa que se apresentava no Programa Domingo Alegre, da Rádio Poti.

Era Luiza de Paula, que tanto cantava bem como era “boca suja”. Falava palavrão demais e dona Narcisa proibiu Zaíra de ver os shows dela.

– Porra, mãe, já sou adulta, tô namorando e não posso ficar a vontade?

– Tá certa. A vida é sua.

Zaíra gostava de música e arranjou um namorado que levava ela, aos domingos pra dançar no América, clube da moda.

Eles iam cedo, jantavam lá e ficavam pras “tertúlias” e dançavam até não querer mais.

Chegava em casa de táxi, a rua já era calçada, um luxo.

Zaíra saiu do Isabel Gondim e foi estudar no Colégio das Neves, no Alecrim, ao lado da Igreja de São Pedro.

Era um colégio de freiras com muita disciplina e exigências.

Saia azul marinho abaixo do joelho e meiões compridos escondendo as pernas mas.

Zaíra tinha umas coxas bonitas e aí ela dobrava o cós da saia e baixava os meiões, de forma que mostrava um pouco suas maravilhosas pernas.

Quando entrava na escola, ajeitava a farda pra não causar problemas.

Mas um dia a Irmã Verônica viu Zaíra na rua vestida daquele jeito e deu dez dias de suspensão.

– Mas, irmã, na rua eu ando do meu jeito.

– Com a farda da escola, não.

– Eu não sabia disso.

Fez uma confusão grande e cancelou a suspensão.

Ela ficou desgostosa e saiu pra estudar no Atheneu.

Lá conheceu Manoelzinho, professor de português e se apaixonaram.

Tiveram dois filhos e foram morar em Fortaleza.

Manoelzinho foi dirigir um grande colégio e colocou uma loja de móveis usados na Praia de Iracema.

Uma forma de ficar em casa; trabalhando.

Tiveram dois filhos e separaram depois de dez anos de casados.

Zaíra ficou com as crianças e Maboelzinho voltou livre e solto, pra Natal.

Não dava nenhuma ajuda e Zaíra se virava sozinha com sua loja de móveis usados.

Um dia fechou tudo e veio morar na casa dos pais com os dois filhos.

Um sufoco.

Um grande amigo dela pediu pra Zaíra deixar a filha Laura ir passar um tempo na Espanha.

Laurinha adorou e ficou lá um bom tempo.

Quando voltou pra Natal casou com um Pastor Evangélico e foram morar nos Estados Unidos.

O filho também foi passar uma temporada na Espanha, casou, tem uma filha e mora na Inglaterra.

Zaíra ficou só em Natal, arranjou namorado mas nada de casamento.

Desenvolveu suas habilidades para artesanato e vive disso.

Mantém contato permanente com os filhos e netos e curte sua independência, feliz, ao lado da mãe que ficou viúva.

Encontrei Zaíra jantando com uma amiga no Restaurante Nau, especializado em frutos do mar e perguntei:

– Zaíra em quem você se inspirou pra sua vida?

– Maria Jailda de Oliveira Carlos.

 

 

 

 

 

 

Jaécio Carlos –  Produtor e apresentador dos programas Café da Tarde e Tribuna Livre, para Youtube

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