NELSON FREIRE 1

Inicio de ano complicado. Com aumento do custo de vida, de produtos, de serviços, uma inflação inquietante e a terrível sensação de que as coisas ainda podem piorar. No rosto de cada um, a perplexidade. De todos, mas principalmente dos que se situam na classe média, sempre a mais penalizada nessas horas. E os rumores dão conta de que novos problemas se avizinham. Na esfera politica, na área econômica, todos eles atingindo brutalmente tanto os setores empresariais como o cidadão comum. Uma época de constrangimentos e de angústias. De preocupação e de reflexões sobre o futuro do país e da própria sociedade.

 Assistimos a um festival de denúncias, de indícios de corrupção, de prejuízos de empresas e de desmoralização de instituições. Isso tudo acontecendo em todos os níveis possíveis e imagináveis. E também de muita violência. A violência pura e simples, dos assaltos, das mortes, dos acidentes, do aumento do tráfico das drogas, dos atentados e até das guerras, quando extrapolamos nossos limites geográficos. E elas começaram a fazer perigosamente parte do nosso dia a dia. Pois os noticiários já quase não nos informam mais sobre avanços científicos, ações humanitárias, nenhuma atitude benemérita de quem quer que seja.

Tomamos café da manhã ao som dos tiroteios entre policia e bandidos. Almoçamos da mesma forma com tais noticias. E jantamos inquietos com outra saraivada de reportagens que abordam o mesmo tema. Fazendo do sono das pessoas algo intranquilo, com medo do que poderá acontecer na madrugada. E quando vez por outra escapa um assunto diferente, ele é, via de regra, banal e mostra apenas a futilidade desses nossos tempos modernos. Onde, por exemplo, o sexo se transformou em carro chefe para se promover alteração de comportamentos, ou então para vender espaços caros em alguns meios de comunicação.

 A procura por poesia, pela música, pelos belos textos escritos, a delicadeza, a serenidade, o entendimento, a integridade moral, o conteúdo das pessoas, são coisas de um passado já remoto. Mais do que nunca o conflito entre o Ser e o Ter assumiu uma forma gigantesca. Erich Fromm já havia previsto essas mudanças na década de setenta. Um imenso hiato entre valores de antes e os que começavam a se impor no mundo contemporâneo. Exatamente como vemos hoje em dia. O individualismo exacerbado, a cultura do possuir sempre mais, de se exibir com produtos de marcas conhecidas, e a busca por ascensão social a qualquer custo.

 Não é demais pensar aqui em algumas declarações feitas por Jesus Cristo, vinte e um séculos atrás. Como por exemplo, ao ser instado por um grupo de judeus ávidos por riqueza e poder, ele afirmou em alto e bom som de que o Seu reino não era desse mundo. E que a sua pregação era voltada para o espirito e não para a carne. Outra feita, falou que nem só do pão viveria o homem, mas da palavra que sai da boca de Deus. Exortações para apascentar o coração e a mente de pessoas ligadas somente nas coisas da matéria. E ainda outra afirmação categórica e definitiva. Vocês são o sal da terra. E se ele for insipido, o que irá salgar?

Vivemos os tempos de um século de transformações rápidas e nem sempre positivas. E uma pergunta inquieta fica solta no ar: somos verdadeiramente felizes? É essa a realidade na qual desejamos permanecer? De violência, de agressões de incertezas, de desequilíbrio, de caos econômico, de tanta suspeição e de impunidade? Sem dúvida é um momento triste o que estamos vivendo, com uma reversão profunda de valores. Mas talvez ele seja propício para iniciarmos, cada um de nós, uma série de avaliações sobre nós mesmos e a nossa própria sociedade. E tentarmos encontrar as saídas para um futuro melhor.

Nelson FreireEconomista, Jornalista e Bacharel em Direito

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