SOBRE CRÔNICAS E CRONISTAS –

Deleito-me com a leitura de uma boa crônica, e me encanta a facilidade, criatividade e inteligência de quem bem as escreve. O Brasil é um celeiro inesgotável de bons cronistas. Nós os encontramos esgrimindo essa habilidade literária motivados por diferentes temas ou situações do cotidiano.

São escritores que sugam a seiva de fatos corriqueiros ou de menor significado, para manufaturá-la em belos textos elaborados com leveza, graça e conteúdo. Mentes privilegiadas capazes de transformar trivialidades em grandes temas.

Tenho predileção especial pelas crônicas de Rubem Braga, o escritor nascido em Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo, falecido em 1990 aos 77 anos de idade. Através dele a crônica se tornou um estilo literário de fato. Trancado na sua sisudez guardava uma alma sensível e poética.

Mário Prata – cronista mineiro de Uberaba -, descrevendo sua tietagem a Rubem Braga no badalado restaurante Pirandello, ponto de referência da sociedade paulista no começo de 1980, nos dá ideia do humor mordaz e inteligente do capixaba.

Durante o encontro entra no recinto uma mulher horrorosa e vai se admirar num dos espelhos da casa, quando o quase setentão Rubem comenta: “Os espelhos deveriam refletir melhor antes de refletirem certas imagens!”. No meu entendimento, quem melhor traduziu a diferença entre crônica e artigo foi Rubem Braga, ao dizer: “crônica é contar um caso e artigo é explicar o caso”.

Ao contrário das constantes exaltações ao cronista Machado de Assis, pouco se fala no pernambucano Antonio Maria, jornalista, compositor e repórter esportivo fulminado por um infarto aos 43 anos de idade, em 1964. Com mais de 3.000 crônicas publicadas nos principais jornais do Rio de Janeiro, seus escritos foram referência de leitura na época áurea da radiofonia nacional.

Quem não recorda Sérgio Porto – o Stanislaw Ponte Preta – e suas crônicas satíricas? E do Febeapá – Festival de Besteiras que Assola o País? Também partiu prematuramente, vitimado por um infarto, aos 45 anos de idade, em 1968. Isso sem esquecer as duas divas da literatura brasileira, Clarice Lispector e Cecília Meireles, que trabalharam a língua portuguesa com preciosismo ímpar, em suas crônicas.

Carlos Drummond de Andrade e Nelson Rodrigues dispensam comentários, pois tudo o que se acrescentar sobre o trabalho de ambos já foi dito. Fernando Sabino, aquele “que nasceu homem e morreu menino”, conforme diz a inscrição na lápide de seu jazigo, saiu do palco em definitivo, um dia antes de completar 81 anos de vida. Nunca entendi a razão de ele escrever “Zélia uma paixão”.

Acrescento à minha lista de preferências Carlos Heitor Cony e Luis Fernando Veríssimo. O primeiro, falecido em 2018 aos 92 anos, passeou por romances, contos, jornalismo, cinema, ensaios biográficos, documentários e, como não poderia deixar de ser, pelas crônicas.

O segundo, na opinião de Jaguar, “é uma fábrica de fazer humor”. A produção do escritor é de tirar o fôlego, tal o tamanho e a variedade de sua obra. É gaúcho de Porto Alegre, 83 anos, e filho do também escritor Érico Veríssimo.

O Rio Grande do Norte é um celeiro de bons cronistas. É fácil enumerar dezenas deles. Admiro a precisão dos relatos de Valério Mesquita, Diógenes Cunha Lima e Armando Negreiros.

 

 

José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro e Escritor

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