ESCÁRNIO – 

O cientista político Francis Fukuyama escreveu que um dos pilares da democracia liberal é aquele no qual o Estado usa seu poder para prover o bem estar de seus cidadãos. Esta advertência ressurgiu-me ao ler a notícia sobre o aumento do número de brasileiros que estão vivendo na extrema pobreza. Eles possuem uma renda per capita de até R$ 89 mensais. Enfrentam insegurança alimentar recorrente embora o governo alardeie que a agricultura brasileira abastece boa parte do mundo.

Este incômodo cresceu ao ler uma recente reportagem do jornalista Lúcio Vaz sobre o STF. Segundo o jornalista, “O Supremo Tribunal Federal vive um mundo paralelo, com milhões de reais investidos em segurança armada, carros blindados, sala vip no aeroporto e jantares nababescos, com direito a bacalhau, lagosta, camarão, vinhos e espumantes com pelo menos quatro premiações internacionais, servidos em taças de cristal, e café à francesa. As mordomias estão registradas nos contratos do STF nos últimos três anos. No mundo real, milhões de brasileiros convivem com a violência e a fome, nas favelas, nos sertões.”

Diz o adágio popular que somos o que comemos. Especialmente, os que se alimentam com o dinheiro do contribuinte. O cardápio da Corte é requintado: bobó de camarão, medalhões de lagosta com molho de manteiga queimada, bacalhau à Gomes de Sá, frigideira de siri, moqueca capixaba, galinha d’Angola assada, vitela e codornas assadas, carré de carneiro, pernil de cordeiro assado e boeuf bourgignone e etc. O artista plástico Vik Muniz, que transforma lixo em arte, costuma diferenciar o lixo do rico e o do pobre.

Para acompanhar as bebidas, também, eram requintadas: “espumante extra brut pelo método champenoise, com pelo menos quatro premiações internacionais. Amadurecido, em contato com leveduras, por período mínimo de 30 meses”. Vinho tinto seco só de safra igual ou posterior a 2010 e se fosse detentor de quatro premiações internacionais. Detalhe: “o vinho deveria ser envelhecido em barril de carvalho francês, americano ou ambos, de primeiro uso, por período de 12 meses”. E seriam servidos, obviamente, em copos e taças de cristal.

Como diz o dito talmúdico: “infeliz a geração cujos juízes precisam ser julgados”. Quem sabe, um dia?

 

 

*Publicado originalmente em O PODER 28/9/21)

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