MEU TIO PROTÁSIO –

Posso dizer que fui um sujeito de sorte. Todos os meus tios eram gente fina. Já falei sobre Pelúsio e agora chegou a vez de Protásio. Com ele, tinha muitas afinidades. Foi o meu primeiro professor de Inglês. Começo da entrada de Natal na guerra, primeiros americanos chegando, e a quase exigência de saber Inglês se acentuando.

Protásio foi um dos que inventou falar Inglês em Natal. Nos idos de 1940, falavam essa língua em Natal o Professor do Atheneu Celestino Pimentel, inglês da Inglaterra, Protásio e Arnaldo Lyra. Talvez pudéssemos incluir um ex-empregado dos ingleses na ponte de Igapó, mas que, convidado para ser intérprete, confessou que o inglês dele só servia para assunto da construção da ponte. Fugiu daí, estava perdido. Arnaldo, que não conheci, muito amigo de Protásio, foi brutalmente assinado pelos comunistas em 1935.

Tinha muitas afinidades com ele. Meu desejo de aprender Inglês nos aproximou. Gostava de colecionar coisas. Tinha uma ótima coleção de selos, com uma correspondência volumosa com o mundo todo. Mas também colecionava carteiras de cigarro, caixas de fósforos, postais. Já na universidade, começou uma coleção de besouros e borboletas, que doou ao Instituto de Antropologia da UFRN, do qual foi Diretor. E eu o imitei e comecei também a colecionar selos.

Antes de tudo, foi um boêmio. Meu avô dizia que ele sofria do mal das telhas; não podia ver um telhado e ia logo para a rua. Foi contemporâneo de algumas figuras inesquecíveis de Natal, como Alvamar Furtado, Humberto Nesi, Odilon Garcia, Luiz Tavares. Encontravam-se toda as noites no Grande Ponto e depois do noticiário da BBC, transmitido pelo Serviço de Alto-falantes de Luiz Romão, às 9 horas da noite, “iam pra noite”, como contava Odilon.

Formou-se em Direito, no Recife, em 1936. Eu tinha seis anos, mas meu pai e minha foram para a formatura, pois Pelúsio também terminou Medicina na mesma época. Fui com eles, para mim uma viagem inesquecível. De trem, saindo de Natal às cinco da manhã e chegando no Recife às nove, quando não havia atraso. Nunca esqueci de uma macarronada com queijo do reino que comi no restaurante do trem.

Estudante em Recife, foi músico da Jazz Band Acadêmica. Tocava bateria. Um dia, aqui em Natal, foi com Alvarmar, Nesi e Odilon, para a apresentação de uma orquestra americana no teatro. Quando terminou a apresentação, os três ficaram esperando por ele, que tinha ido falar com os músicos, e o receberam com a advertência: de hoje em diante o senhor está proibido de tocar bateria. A Jazz Band vinha de vez em quando à Natal, e os ensaios eram na casa de vovô,

Praticamente, não fez uso do diploma. Dedicou-se a ensinar Inglês. Foi Professor de Português em Parnamirim durante a guerra, para os oficiais americanos, onde fez boas amizades. Tem até uma história muito boa dessa época; os americanos anunciavam o dia de pagamentos com um “pay day”. Os brasileiros riam muito e um dos responsáveis pelo pagamento perguntou a Protásio o porquê de tantas rizada. Protásio explicou o significado de “pay day” em português, e eles passaram a dizer “payment day”. E foi professor de Inglês a vida toda no Atheneu. Só deixou de dar aulas quando foi nomeado para o Instituto de Antropologia da UFRN.

Foi fundador do SCBE e seu Diretor por muitos anos. Em razão desse trabalho, foi convidado pelo governo americana para conhecer escolas nos EUA e fazer algumas palestras. Conta que, como os americanos achavam que a gente chegava sempre atrasado, ele chegava na hora certa, mais esperava dez minutos antes de entrar. Para não quebrar a tradição.

Já escrevi demais e ainda não disse o que gostaria. Protásio era original e deixou histórias inesquecíveis. Conto mais uma e encerro. Quando os missionários Mormons começaram a chegar por aqui, descobriram Protásio e quase todos os dias iam à casa dele, na época era em frente ao Juvenal Lamartine. Um dia, convencidos que Protásio já aderira à religião dele, convidaram-no para batizar-se. Protásio explicou que não podia, por três razões, e disse: minha mãe já está velhinha e não entenderia nunca  ele ter mudado de religião, depois eles não permitiam bebida e a cerveja dele todos os dias era indispensável e, finalmente, eles queriam batizá-lo no Potengi e a água era muito fria. Garantiu a tranquilidade da mãe, a cervejinha e evitou um resfriado.

 

 

 

Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN

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