MEU TIO PELÚSIO –

Médico, formado em Recife em 1936, veio para Natal, mas foi convidado para trabalhar em Campo Grande (Augusto Severo), onde passou um certo tempo e de onde tinha lembranças de seu inicio de carreira bastante interessantes. Era o único médico da cidade, naquele tempo, e vivia sempre muito atarefado. Uma das estórias que contou aconteceu com o sargento da Polícia, que era o Delegado da cidade. Era um homem miúdo, casado com uma mulher enorme, especialmente comparada com ele. Teve a infelicidade de ser picada por uma coral e quando Pelúsio chegou ela já estava morta. O sargento, chorando (eram bem casados), emocionado, perguntou à Pelúsio: doutor, me explique, como uma bichinha dessas pode matar uma bichona dessas? A explicação não o convenceu muito. Vou botar luto fechado, eu amava essa mulher. Hoje mesmo vou mandar tinturar minha farda de preto. Diz Pelúsio que a dificuldade foi convencê-lo a não tinturar a farda e usar uma fita preta no braço.

Voltou para Natal, onde reiniciou suas atividades. Era dermatologista e não havia uma clientela boa para doenças desse tipo naquela época e começou a fazer de tudo. Na guerra, foi convocado e passou alguns anos como Tenente. Quando deixou a farda, entrou no Ministério da Saúde e foi incluído no quadro de médicos da Saúde do Porto. Deu-se muito bem com os colegas, Fernando Góes, José Pinto Jr., e o chefe deles, Antônio Feijó. E aí trabalhou a vida inteira.

Pelúsio gostava da vida. Todo dia tomava seu aperitivo preferido, um conhaque puro e forte. Era meu padrinho de batismo e de crisma e nós tínhamos um ótimo relacionamento. Quase toda semana almoçava comigo e conversávamos muito. Sempre tinha uma garrafa de um bom conhaque para degustação dele. E me contou muitos fatos interessantes de sua vida. Algumas pessoas, que também o conheciam, me contataram outras tantas histórias dele.

Uma das boas ocorreu a bordo de um navio sueco. O comandante, no final da visita, perguntou, o senhor quer beber alguma coisa? Pelúsio aceitou e ele veio com um copo de whisky. Desculpe, mas o senhor não tem daquela aguardente que vocês tomam no inverno e dizem que é muito forte? Tenho, se o senhor aceitar. Trouxe uma garrafa, Pelúsio tomou uma dose de um gole, o comandante botou outra dose e perguntou, muito forte?  Pelúsio respondeu, fortinha.

Era casado com Nair Bandeira, teve um filho, Rogério, uma grande figura, que puxou à Pelúsio em umas coisas e outras não. Comprou um apartamento num prédio da Prudente Morais e foi morar lá. Um dia, chega para o pai e diz: vou me mudar, procurar outro apartamento. Aquilo lá virou um pardieiro, cheio de mulher, uma promiscuidade danada e até mulher nua pelos corredores você encontra. Quero sair de lá. Pelúsio, sempre muito calmo, disse: tenho uma proposta a lhe fazer. Fale com sua mãe. Se ela concordar, eu vou morar lá e você vem para cá.

Nair foi acidentada, atropelada na Rio Branco. Todos os dias almoçavam no Nemésio, do lado oposto de onde eles vinham. Nesse tempo, a Rio Branco era mão e contramão. Quando eles se preparam para atravessar, vinha um carro do Alecrim e Pelúsio segurou Nair: não dá tempo de atravessar. Ela disse dá e foi atropelada. O motorista, chofer de táxi, parou o carro preocupado e se dirigiu a Pelúsio dizendo que não tinha culpa, quando viu ela já estava na frente do carro. Perguntou se podia fazer alguma coisa e Pelúsio respondeu. Não se preocupe. Vi que você não teve culpa. Vamos leva-la para a Policlínica do Alecrim, eu sou médico lá. Dias depois foi almoçar com minha mãe, que perguntou, como vai Nair? Muito bem, amanhã ou depois sai do hospital. Eu é que estou muito preocupado. Por que? Você sabe, Nair é braba como diabo e agora que fez transfusão de sangue de soldado…. Havia um parente nosso que era oficial no 16o RI e conseguiu alguns soldados para doarem sangue a ela.

 

 

 

Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN

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