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                                                                                                                                                                                  (*) Rinaldo Barros

“A opinião pública é a opinião publicada” (Michel Maffesoli. Professor da Sorbonne, Paris)

Faz tempo que ando me inquietando com uma questão, a qual não me sai da cabeça.

Até que enfim surgiu conhecimento novo sobre o assunto: informações de uma pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP, sob a responsabilidade do professor Paulo Sérgio Pinheiro, apresentam um retrato completo da violência através do cruzamento de dados por idade, gênero, renda, religião, moradia e comparações entre cidades.

A pesquisa confirma o que eu já suspeitava: a violência em si, substantiva, é com certeza uma questão muito grave, mas não ocorre tal qual a maioria das pessoas a percebe. Explico melhor.

Não há na sociedade brasileira, especialmente entre os jovens, a banalização da violência, nem provas de que ela esteja se disseminando. A juventude brasileira prefere valores tradicionais como família constituída, emprego e boas escolas.

O que afirmo é que não existe entre os jovens a banalização da violência e muito menos se constatou que esteja amplamente disseminada. Ao contrário do que muita gente pensa e reproduz, a maioria dos jovens da periferia não apreciam a violência e, sim, valores tradicionais como ter uma família feliz, boa saúde, um emprego que pague bom salário, cursar uma faculdade, ter boas notas, e trabalhar ou empreender para progredir.

Objetivamente, os transgressores, controlados pelo crime organizado, são muitos, mas são uma minoria. São alguns milhares, numa sociedade de 200 milhões de almas. No Brasil, temos um total de 715 mil presos no ineficaz Sistema Penitenciário. Menos de 0,5% (meio por cento).

Embora estejamos expostos direta e indiretamente à violência, àquela sobretudo que ocorre com cada vez maior frequência nas imediações de nossas casas – e que também afeta parentes, amigos e conhecidos – não se está desenvolvendo uma cultura de aceitação à violência. Ainda bem.

A exposição à violência não diminui a confiança entre as pessoas, particularmente entre os jovens. A experiência de testemunhar ou de serem vítimas da violência não parece estar afetando seus valores, suas expectativas e aspirações em relação ao futuro.

Frustrados com a (quase inexistente) atuação da Escola, da Justiça, e descrentes do Sistema Penitenciário, expostos à violência – na vida pessoal, nos relatos de parentes e amigos e na mídia, os jovens não demonstram maior aceitação da violência. Frustrados com a pouca proteção oferecida pelas leis, pelo Estado; não defendem a desobediência, mas a obediência à ordem estabelecida.

A cabeça da maioria dos brasileiros é cristã, conservadora, fundada na família e nas tradições.

Resumindo, os dados analisados pela USP sugerem que se a violência cresce dentro da sociedade brasileira isso não se deve à existência de uma “cultura da violência”.

Há uma grande diferença entre a violência real e a percepção que temos desse fenômeno.

A meu ver, salvo melhor juízo, o que cresce todos os dias é a percepção da violência, a partir do bombardeio diário de dezenas de programas policiais nas redes de rádios e televisão, com altíssimos índices de audiência, os quais amplificam em muito a repercussão das ocorrências e incutem o medo crescente na mente da opinião pública. Medo paranoico, pânico, muito maior do que a verdade dos fatos, em suas reais dimensões.

Estão fomentando o medo porque tem muita gente ganhando milhões com isso. O medo gera lucro para os veículos de comunicação e para as empresas privadas de segurança, para a indústria de câmeras, cercas elétricas, blindagem de carros, armas, entre muitos outros. Medo dá lucro.

Ingenuamente, deixo um desafio aos comunicadores: substituam os programas policiais por programas educativos, informativos, com debates e premiações para respostas do público sobre questões do vestibular ou das provas do ENEM, ou de cultura geral. Em meu devaneio, imagino que a audiência seria grande, talvez maior do que a atual gerada com o sensacionalismo da desgraça e apologia do crime. Quem sabe no próximo século?

Se a mídia divulgasse informações construtivas, tal como faz hoje com as ocorrências policiais; sem dúvida, nossa percepção sobre a violência seria bem diferente, seria mais objetiva.

Nesta época em que o discurso da mídia julga, condena, reclama autoridade e autoritarismo, somos vítimas do teorema de Michel Maffesoli “a opinião pública é a opinião publicada”.

(*) Rinaldo Barros é professor[email protected]

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