LIBERDADE É UMA SENSAÇÃO RESPLANDECENTE –

Há uma senhora que não conheço pessoalmente. Já muito ouvi falar sobre ela, já li muito sobre ela, já a vi de longe, mas nunca de perto. Muitos pensam que é norte-americana. Mas é francesa de nascimento. Alguns afirmam que ela é uma mística que procura representar um conceito da realidade.

Outros, mais cépticos, dizem que ela é como aquelas ciganas enganadoras.  Embora a respeitando, estranho ver que uns a tratam como se fora uma pessoa da família; outros a veneram e têm com ela uma relação cerimoniosa, cheia de salamaleques. Mas há os que só fingem gostar dela. Esses “fazem promessas e juras e depois se esquecem”. Outros são excessivamente possessivos, e a querem só para si. E existem, também, os que a detestam publicamente e não perdem oportunidade de ameaçá-la. E, como ocorre com mulheres que se destacam, muitos já lutaram e até morreram por ela. Estou falando da liberdade e de sua estátua, plantada na Liberty Island, na baía de Upper, perto da confluência dos rios Hudson e East, em frente à ilha de Manhattan, na cidade de New York, nos Estados Unidos.

Já fui à Nova Iorque um número de vezes maior do que poderia pensar, mas nunca fui visitar a senhora Liberdade, por mais emblemática que ela seja, não só para os norte-americanos, mas para todo o mundo. Aprendi com a história da minha vida que a liberdade não é uma coisa material. Que é algo intangível, um sentimento subjetivo, uma sensação resplandecente, luminosa, individual, pessoal e particular de segurança e não algo concreto, que pode ser tocado, medido e contado. Mas duas coisas são certas. Primeiro, a importância da liberdade é mais notada quando não a temos; segundo, ela só existe onde há democracia.

Para mim é estranha e contraditória a relação que os estadunidenses têm com a liberdade. Ora ela é exclusiva para uma parte da sociedade, para os brancos, por exemplo; deve servir somente a eles, deve servir aos interesses deles. Durante muito tempo, até há anos recentes, aos negros eram negados direitos elementares, tais como entrar no restaurante que quisesse, sentar em qualquer lugar dos ônibus. Hoje eles ocupam lugares de destaque no congresso, nas cortes de justiça, nas forças armadas, para não falar no mundo dos negócios; embora se destaquem mais por serem minoria. Na música sempre pontificaram, mas até aí tiveram que lutar para serem aceitos nos palcos tidos como das elites brancas. Ainda hoje os latino-americanos são considerados cidadãos de segunda classe e mão de obra barata. Nesse aspecto, a liberdade é propriedade de branco, anglo-saxão e protestante. Estranha essa noção de liberdade que têm os norte-americanos.

Mas não há como contestar a liberdade da imprensa da terra do Tio Sam. Quem derrubou Nixon, forçando-o a renunciar à presidência do maior, mais rico, mais poderoso e importante país do mundo foi um jornal, The Washington Post, quando denunciou o escândalo do Watergate. Agora são os próprios jornais e canais de televisão dos Estados Unidos que denunciam as torturas praticadas por soldados americanos nas prisões do Iraque. E não há pressão alguma do governo contra eles. Bizarros, esses ianques. Em contrapartida, por aqui o governo faz a blindagem “dos seus”, para evitar a apuração de denúncias.

Mas voltemos à arte que faz referência à liberdade. Eu prefiro muito mais a estátua que existe na Praça da Redenção, em Mossoró. Ela pode ser menos imponente, ser bem menor, não ter tanta carga artística e até ter sido inspirada naquela que os franceses deram aos nova-iorquinos, porém é mais pontual, mais direta ao comemorar um fato histórico: a abolição da escravidão na terra de Santa Luzia de Mossoró, em 30 de setembro de 1883. Agora o “veio da Havan” está construindo uma das suas lojas aqui em Natal e, certamente, vai erigir um estatua réplica da nova-iorquina. Não entendo essa sabujice ao que é “estrangeiro”; ao que vem dos “States” ou da Europa.

*Publicado originalmente em Tribuna do Norte –  19 janeiro de  2022 

 

 

 

 

 

 

Tomislav R. Femenick – Jornalista e historiador; do IHGRN

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