O Hippie Drive-in foi um empreendimento deslocado de seu tempo que existiu em Natal entre 1967 e 1974. Não era clube nem restaurante nem boate, mas uma mistura de tudo isso e mais alguma coisa.

Consistia numa área de lazer com 40 mil metros quadrados abrigando bares, restaurantes, boates, parque de diversão, quiosques para vendas de guloseimas, zoológico e drive-in onde casais enamorados trocavam carícias dentro de carros com privacidade e segurança.

Durante o dia o ambiente era menos mundano. Viam-se famílias se divertindo nos equipamentos do parque – entre os quais uma roda-gigante; consumindo baganas nos quiosques ou visitando o zoológico, isso mesmo, um pequeno zoológico, o primeiro e único de Natal.

No zoológico do Hippie conviviam onça-pintada, tamanduá-bandeira, anta, cotia, porco-espinho, urubu-rei, faisão e outras variedades de aves. Nos restaurantes serviam iguarias desconhecidas do paladar local como escargot e caviar, e bebidas como tequila e cervejas importadas – 15 marcas de 8 países.

Mas, a motivo do êxito do Hippie Drive-in estava nas duas boates. Uma ao ar livre e outra reservada. O sucesso dessa última era a luz negra, a primeira da cidade. O efeito da animação estroboscópica causava surpresa ou satisfação ao frequentador casual ou contumaz da boate.

Os casais bailavam sob a sensação de estarem tremendo ou se movimentando aos saltos e isso levava a todos para a pista de dança. O gim com água tônica era o pedido comum de seus habitués, devido o efeito brilhoso decorrente da incidência da luz negra sobre a bebida.

Entretanto, o sucesso ficava por conta de garotas desinibidas que, proposital ou distraidamente, fossem para o dancing com roupas íntimas brancas. O sutiã e a calcinha ficavam evidenciados do restante da vestimenta pela ação da luz negra, deixando as curvas do corpo bem delineadas causando o efeito sensual almejado por elas. Por lá se apresentavam o Impacto 5, The Jetsons, Infernais, Os Primos e outros conjuntos da capital e de fora do Estado.

Detalhe interessante: todos os garçons empregados no complexo eram homossexuais. Naquela época, a intolerância contra gays era gritante, e isso os tornava naturalmente retraídos. Talvez a discrição decorrente dessa postura os tornassem as pessoas adequadas para atender os casais no drive-in, quando estivessem aos “amassos” em seus carros.

Aos visitantes que desejassem uma lembrança, encontravam à disposição, nas mesas, um pires pintado à mão pela artista plástica Lourdes Guilherme, com a inscrição “Este eu roubei do Hippie Drive-in”.

A ideia saiu da cachola do empresário Luiz Carlos About Galvão. Segundo comentários, ele se espelhou em algo idêntico visto na cidade do México. Não cobravam entrada, mas exigiam consumação.

Eram comuns excursões de Pernambuco e da Paraíba, porque não existia nada semelhante no Nordeste. O ambiente chegou a acomodar, de uma só vez, 1.800 pessoas, algo inacreditável para casas de shows de quase meio século atrás.

Luiz Carlos fechou o complexo de divertimento por conta da concorrência nas redondezas e, também, porque abrira o “Kazarão”, outra iniciativa sua em evidência na Avenida Campos Sales.

Repito, o Hippie Drive-in foi um empreendimento para além de sua época. Funcionou em local ermo da atual Av. Roberto Freire na altura do Sea Way.

José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro civil e escritor – [email protected]

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *