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 (*) Rinaldo Barros

O tema da conversa de hoje foi colocado em pauta por Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, frade dominicano, escritor, autor de 53 livros: “por que a esquerda brasileira logrou ser alternativa de governo, mas nunca conseguiu ser alternativa de poder?”

Refrescando a memória, lembro que, ao chegar ao Governo Federal – além de renunciar aos princípios do seu partido no documento “Carta ao povo brasileiro” (22.06.2002) – o governo Lula preencheu considerável parcela das mais de 20 mil funções administrativas com a nomeação de militantes do PT e aliados, líderes de movimentos sociais e sindicais; fenômeno conhecido como “aparelhamento do Estado”. O mérito e a competência não foram considerados, o que – em parte – explica a incompetência e a corrupção.

Afastados de suas bases, essas lideranças estão hoje perfeitamente adaptadas às benesses do poder, sem o menor interesse em retomar o “trabalho de base”. Instados a se manifestar, são a voz do governo junto às bases, e não o contrário. Ou seja, contrariando os princípios do PT original, o PT governo optou por uma governabilidade baseada numa política clara de beneficiar o capital financeiro e as grandes empresas, (com crédito fácil, juros altos e isenção de impostos) e; na outra ponta, políticas compensatórias para os excluídos, dominados e subalternos, com milhões de famílias endividadas, iludidas pelo crédito fácil e juros altos; sem perspectiva de alforria.

Os lucros astronômicos dos bancos, empreiteiras e grandes montadoras de veículos assim o comprovam.

Lula ou Dilma poderiam ter assegurado sua sustentabilidade política em duas pernas: 1) o Congresso Nacional e; 2) os movimentos sociais. Poderiam, mas não o fizeram. Julgando-se espertos, tornaram-se reféns (voluntários) de forças políticas tradicionais, oligárquicas, reacionárias, conservadoras; que ora integram o grande arco de alianças de apoio ao PT governo; a exemplo do Sarney, Collor, Maluf, Renan e Cunha.

Paralelamente, o PT adotou uma política para os excluídos, sem a mediação dos movimentos sociais, como é o caso do programa “Bolsa Família”, que ocupou o lugar do fracassado “Fome Zero”, o qual se apoiava em comitês gestores integrados por lideranças da sociedade civil, que controlavam e fiscalizavam a iniciativa.

É óbvio também que tal prática enfraqueceu e imobilizou os movimentos sociais e, ao mesmo tempo, pôs o núcleo governante voltado unicamente ao seu próprio projeto de perpetuação no poder. O poder pelo poder.

Este projeto de poder, em seu desvario, gerou monstros como o mensalão e petrolão; tenebrosas transações que colocaram em risco o próprio Regime Democrático de Direito. O patropi está à beira de uma crise institucional.

Ou seja, o fenômeno do lulopetismo se descolou do petismo histórico. A direção nacional do PT, por sua vez, aceitou restringir-se ao jogo do poder. Em outras palavras, o lulopetismo mantém um falso discurso neopopulista de esquerda ou, pior ainda, fazendo-se de vítima das “zelites”.

Lamentavelmente, na verdade, não passa de uma espécie de “inocente útil” a favor do Sistema.

Tais características apontam para a perda do horizonte ético que sempre norteou a esquerda. Trata-se agora apenas de sobreviver politicamente, a qualquer preço. Literalmente.

O Brasil é hoje um Estado obeso, depredador do meio ambiente, com crescimento zero, com alta carga tributária, juros altos, infraestrutura precária, obras estruturantes paralisadas ou atrasadas, sem planejamento, sem capacidade de poupança, nem de inovação, nem de competitividade. E continua a ser o campeão da concentração de renda e da desigualdade social; com ignorância, analfabetismo, miséria urbana e violência crescente.

Registre-se que questões maiores da pauta histórica da esquerda, como as Reformas agrária, fiscal, urbana, política e universitária foram relegadas a um futuro incerto. Um retrocesso histórico lamentável, sem dúvida.

Dilma, por sua vez, representava a esperança dos petistas históricos, mas não conseguiu corresponder a essa expectativa. Explico: a ‘mãe do PAC” até queria, mas não conseguiu ser alternativa de poder. Em nome da governabilidade (com menos habilidade e menos astúcia que o Lula), Dilma está refém de forças políticas e econômicas descompromissadas com o desenvolvimento sustentável de nossa sociedade.

Resumindo, o PT está no governo, mas não exerce o poder de fato; apenas o serve como preposto.

Daí a obsessão com o controle da imprensa, uma ideia fixa do PT que, envergonhado, diminuído, esmagado, na contramão da história; imagina ser possível disfarçar suas contradições.

O PT governo dá mostras visíveis de perda de controle, sem que se saiba ao certo quem manda no país. Decifro assim a charada do lulopetismo: a ilusão do poder matou o PT. Choremos.

Termino citando Frei Betto, em seu artigo “A pasteurização da esquerda”, publicado no Le Monde Diplomatique, dez. 2008: “o Projeto civilizatório da Nação brasileira foi descartado em benefício de um projeto de poder de um grupo dominante, fazendo alianças com partidos e forças sociais e econômicas que o PT, o PSB, o PCdoB, e o PDT, ao serem fundados, propunham enfrentar e derrotar”.

P.S – Exéquias são ritos e orações com os quais a comunidade cristã acompanha seus mortos e os encomenda.

 (*) Rinaldo Barros é professor – [email protected]

 

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