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      Carlos Alberto Josuá Costa 

             Sexta-feira da terceira semana da Quaresma.

            “-Vovó, por que vovô nunca mais fez um peixinho?!”

            “- Lucas seu avô agora só quer viver escrevendo”.

A forma, a entonação, não ficou muito clara se era um incentivo ao dedilhar as letras que se juntam para tornar tangível a inspiração, ou se crítica velada por me recolher em colóquio com pensamentos, palavras e obras – o papel, a caneta, o teclado.

Passei seguramente cinquenta anos tendo lampejos e gravando em pedaços de papel, cadernos de brochura e em folhas datilografadas, poesias, frase, poemas, relatos de momentos vividos, lamentos, indagações, e até um arremedo de diário ‘culposo’ – sem intenção de registrar tim por tim tim.

Ainda na juventude, lá pelos avançar dos anos 60, juntamente com colegas salesianos, Pontes Pessoa, Napoleão de Paiva, Ivanildo Cortez, Sérvulo Godeiro, Luiz Varela, Humberto Micussi, Dorian Ximenes – entre outros, instituímos o Grêmio Literário Câmara Cascudo, da forma mais amadorística possível, apenas para o deleite de transitar ora pelas letras, ora em visita ao próprio escritor folclorista, Luiz da Câmara Cascudo, ali vizinho, na sua escrivaninha e com seu charuto em fumaças de retidão.

Chegamos a criar um jornalzinho denominado “O POINT”, mimeografado e distribuído entre os alunos da época. Em um momento mais audacioso, com a anuência do Professor Luiz Sampaio, e sob o comandado do amigo Pontes, fazíamos uso do alto- falante da secretaria, aproveitando o intervalo das aulas – o recreio, para levar ao ar o jornal falado, com uma novidade: a alternância de locução.

O destino, abençoado pelo plano de Deus, tinha, no entanto, diretrizes outras para mim e esses jovens amigos, e nos repartimos entre o Marista, o Ateneu e a Escola Técnica Federal, cada um em prosseguimento ao aprendizado escolar, com olho na realização profissional. Afinal, o Maj. Cleantho Homem de Siqueira tinha-nos incitados que éramos o futuro do Brasil. E sua ‘profecia’ se realizou.

O tempo caminhou e me arrastou junto no cumprimento de missões construtivas de ‘barro e pedras’ e, muito mais, em ‘enxergar pessoas’ naquilo que há de melhor para aprender e compartilhar.

E os escritos?!

Foram ficando em caixas, gavetas, em bordas de agendas, muitas vezes elaborados na mente e perdidos nas lembranças. Hoje não quero perder a aliança que o Senhor restabeleceu em recuperar o que ficou para trás e o regalo do tempo que me resta.

É por isso que manirroto boa parte do meu tempo, estudando, lendo e escrevendo o que me vem de inspiração e de contemplação.

 E não faço isso só por deleite, mas pensando em você.

 “Em mim?!”

Sim! Em você que me concede a primazia de articular o seu olhar pelas letras que se aglutinam em forma de aceitação, de amor e de respeito. Não sei escrever sem ter você, e você também, no pensamento. É como se estivesse dando um recado nas entrelinhas para que percebam os quanto os admiro e os quanto são importantes para gerar a energia de minha gratidão.

Espere só um pouquinho… Vou pegar aquele meu arremedo de diário…

Taqui… Ano 1970.

Nele, gostos, desgostos, ansiedades, incertezas, amores, pensamentos, relatos de amizades, incompreensões, reconciliações, inspirações, preocupações com o futuro – conflitos, daquele tempo, de um jovem de dezenove anos.

Hoje, ao lê-lo, percebo como é real a mudança que experimentamos com a vivência continuada. Nunca foi tão verdadeiro atestar que só o tempo é capaz de equilibrar nossos sentimentos.

Memórias não são segredos. Mas tá bom. Ainda bem que minhas ‘maldades’ eram escritas com letras minúsculas.

No período da generalizada e estridente insatisfação juvenil, que varreu o mundo em todas as direções – 1968 a 1972 – com transformações políticas, éticas, sexuais e comportamentais foi onde floresceu a maioria de meus escritos, quase todos eles em forma de poemas que relatavam amores e tragédias, ditas, segundo Roberto Lima, fragmentos de lembranças passadas.

Depois disto, um vácuo inspirador.

Novos lampejos no ‘entardecer’ dos anos setenta e de forma mais animadora, por estes tempo.

Agora, acumulado de anos vividos, de horizontes renovados pela evolução do mundo, pela mudança dos comportamentos sociais, pela unificação dos povos, pelas crenças e descrenças nas atitudes humanas, resta-me escrever aquilo que é possível contribuir para uma leitura amena, sincera, com toda a emoção que carrego, até o momento em que as mãos já não possam mais desenhar o sentimento de amor que tenho por vocês.

Percebo que cada pessoa é uma escrita que vai se construindo, uma história em capítulos. Ao final, elas se misturam, se modificam e se acabam. Porém o fascínio das palavras faz movimentar e nascer novas histórias – que captam o extraordinário de nossas vidas.

Pois é. Lá no velho diário está escrito: Emudeço quando minhas mãos “calam”.

E o peixe?!

Ainda gosto de preparar. Meu preferido é a moqueca feita com Pescada Amarela, acompanhada de um tinto seco e compartilhada com aqueles, que insisto, em perpetuar em meu coração.

É assim…

Carlos Alberto Josuá Costa – Engenheiro Civil e Consultor ([email protected])

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