EM NOME DA PAIXÃO –

A personagem deste texto é uma velha conhecida nossa, pois tem abrigo no âmago de cada ser humano e atende pela alcunha de paixão. Controlada, ela admite conviver com urbanidade na sociedade, mas, sem peia nem cabresto torna-se uma besta ensandecida e cruel. Em nome da paixão excessos são cometidos e o radicalismo ganha contornos obscuros. A paixão, tal qual determinadas drogas, embota os sentidos e induz a caminhos perigosos onde não existem limites.

A metáfora “Eu amo de paixão!”, deixa margem à interpretação de que, por amor excessivo a alguém ou a qualquer causa, o indivíduo é levado a cometer loucuras. Existem segmentos que ordenam a vida em comunidade, onde é apavorante constatar o descontrole da paixão. O esporte, a religião e a política são alguns deles.

A paixão pelo esporte, particularmente naqueles coletivos, atinge com facilidade o histerismo. Sem domínio, leva o público a elevados níveis de catarse, que derivam para ações exacerbadas de entusiasmo e de agressão. E aí nos vem à lembrança o êxtase das plateias dos circos romanos ao assistirem cristãos sendo dilacerados por leões famintos.

Comparação não tão distante das cenas da antiguidade, estão hoje nos estádios de futebol. Torcedores insatisfeitos com resultados adversos de simples pelejas esportivas, agridem adversários e, ensandecidos, pisoteiam e matam assistentes indefesos em situações de entusiasmo descontrolado.

A paixão sem limites na religião também deixa marcas quando gera extremismo, fanatismo e intolerância. Sob a égide da Inquisição, defensores da Igreja resolveram combater o sectarismo religioso erradicando a heresia. Tudo começou no século XII, na França, mas tomou forma no início do Renascimento, na Espanha e Portugal, quando tribunais inquisidores tentaram converter judeus e muçulmanos ao catolicismo.

Com a justificativa de ameaça ao cristianismo católico exageros foram cometidos por protetores da fé, torturando e queimando hereges. O símbolo da crueldade dessa época ficou nas ações do inquisidor-geral de Castela e Aragão, o frade dominicano Tomás de Torquemada. A vítima mais emblemática da Inquisição foi Joana d’Arc, que morreu queimada na fogueira condenada por heresia. Por ironia, a heroína francesa se tornou santa da Igreja Católica e padroeira da França.

Um exemplo do extremismo da paixão pela política ainda se mantém vivo na lembrança de nações, mundo afora. Seis milhões de pessoas foram exterminadas em nome da purificação de uma raça. A ideologia formulada por Adolf Hitler praticada pelo Partido Nazista foi adotada pela Alemanha de 1933 a 1945.

O resultado? Homens, mulheres e crianças de origem judia sendo perseguidos e aprisionados por carrascos do Terceiro Reich, em quase toda Europa. Em campos de extermínio, judeus foram assassinados por fuzilamento, pelo gás Ziklon B, por inanição ou por doenças oportunistas. A “solução final da questão judia” ficou conhecida como “holocausto”, e representa uma nódoa na história da humanidade, emoldurada pelo horror da II Guerra Mundial.

Pelo o visto acima, o “amar de paixão” nunca foi nem será um procedimento inofensivo. Em outubro próximo exerceremos, outra vez, o livre direito de votar. Por acaso, não seria essa mais uma oportunidade de acessarmos às urnas desprovidos de paixões sem medidas?

José Narcelio Marques Sousa – É engenheiro civil – [email protected]

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