Claudia Sta Rosa

Guardo comigo um depoimento que reforçou, definitivamente, a importância que dispenso à biblioteca escolar. Não faz muito tempo, ouvi de Samuel Augusto (9 anos, em 2009), então estudante da Escola Estadual Hegésippo Reis, a seguinte declaração: “Aprendi a ler e a gostar de ler, assim: eu via a professora Evania ler aqui na biblioteca e achava muito bonito, muito mágico.

Ai um dia eu cheguei para a professora, lá na sala de aula, e disse assim: professora, eu não quero mais ler só pelas figuras, eu quero ler do jeito que a professora Evania lê pra gente. Eu quero ler pelas palavras. Aí eu comecei a me esforçar para descobrir o que as palavras estavam dizendo e a professora me ajudou, e eu aprendi a ler as palavras.”

O menino Samuel Augusto explicitou uma proposta de biblioteca escolar que jamais pode ser compreendida como superior e tampouco inferior àquela que é implementada nas salas de aula. Ambas se complementam e dialogam na tarefa de democratizar o acesso à cultura escrita. Samuel jogou luzes sobre a relevância do trabalho qualificado que é desenvolvido pelo professor mediador de leitura, o docente que atua, de forma competente, viva e criativa, na biblioteca da escola. Ele fala da figura da professora que faz a diferença na vida dos estudantes, por meio do seu ofício, exercido num espaço pedagógico legítimo: a biblioteca.

Porém, excetuando-se os casos exemplares – aqui destaco a Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Parnamirim, no RN –, não são todos os gestores públicos que enxergam o papel fundamental da biblioteca escolar. Ainda predomina a ideia de espaço secundário, descartável, menos importante do que as salas de aula, de pouca ou nenhuma contribuição a oferecer para o projeto educacional da unidade de ensino. Tanto é assim que, em 2010, foi preciso ser sancionada uma Lei Federal, a nº 12.244, que estabelece o ano de 2020 como prazo limite para que todas as escolas públicas e privadas do país contem com biblioteca e que as redes de ensino contratem bibliotecários para atendê-las.

Logo, é de um atraso sem precedentes as tentativas de desqualificar a biblioteca, em detrimento de se investir para fortalecê-la, tonando-a espaço vivo, dinâmico, movido por um projeto de formação de leitores, por uma programação voltada para toda comunidade escolar. Infelizmente não são raras as tentativas ou até mesmo o desmonte de experiências bem sucedidas, pelo poder público, amparado por alegações esdrúxulas, nada convincentes.

 De tão comum, virou uma preocupação o tratamento que algumas secretarias de educação dispensam ao professor que exerce a sua docência na biblioteca escolar, ajudando a formar leitores. Esses professores têm sido penalizados com a subtração de direitos por estarem em docência na biblioteca, ainda que seja escolar. Acreditem, mas há secretarias que punem os professores em atividades nas bibliotecas, quando, por exemplo, não lhes garantem o terço das horas contratadas para atividades de planejamento, conforme preconiza a Lei do Piso Nacional do Magistério ou quando o tempo para aposentadoria é ampliado em anos.

De igual modo, tais secretarias de educação só aceitam que sejam encaminhados para as bibliotecas escolares, professores próximos da aposentadoria ou readaptados de funções por problemas de saúde, negando as possibilidades, também, a outros mestres identificados com o trabalho de mediação de leitura.

 A imagem do docente em atividades na biblioteca escolar precisa ser reconstruída. Alguns gestores públicos e outros desavisados persistem com a ideia de que são profissionais improdutivos, justamente porque o conceito de biblioteca que carregam difere daquele da biblioteca que o menino Samuel Augusto frequentou. Que os erros sejam corrigidos. Acordemos, pois!

Cláudia Santa Rosa – educadora ( www.claudiasantarosa.com )

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