DE CINEMA –

“Tudo em Todo Lugar do Mundo” é um filme distópico. A um só tempo, real e irreal. Eu diria, até ao ponto onde se poderia classificar de “ficção especulativa”. A personagem principal, dona de uma lavanderia quase em falência vive sob pressão do dia a dia: o olho vivo do fisco; um casamento beirando o divórcio; uma filha lésbica que ela reluta em aceitar como tal; e de contrapeso,  um pai, um tanto gagá, com o qual ela reluta compartilhar tais fatos. Resumindo, suas necessidades materiais implicam sobrevivência. E as existenciais e afetivas convivem de forma instável e difícil. É quando ela adentra o multiverso. O grupo hipotético de todos universos disponíveis.
Os universos paralelos que podem existir ou não. Onde ocorreriam situações diferentes em cada vida, na mesma hora em que ocorrem as do universo atual e real. Sobre o que está a acontecer, ou poderia estar, em outras dimensões do binômio espaço-tempo de nós próprios. Ocorrem em forma de cortes abruptos a todo instante, de forma cada vez mais crescentes, rápidos, avassaladores.
O filme é uma babel onde a imaginação beira o nonsense. Uma inflação caótica de situações exibidas de forma figurada (quase metafórica) em que predominam a violência, o tormento, e a infelicidade. A falta de paz na vida das pessoas. O tema transita do reino animal humano até o reino mineral ; onde a personagem principal e a filha sob forma de duas pedras inanimadas numa região inóspita e sem vida, pensam e filosofam. E vivem. Não é um filme difícil de ver e entender, desde que você se entregue ao poder das imagens e do som sem reservas. As pedras se encaixarão no fim. Afinal, essa história de universos paralelos é ancestral. Basta ler os “Nove Mundos” da mitologia nórdica. Você pode concordar, acreditar ou não, com o que está exposto. Mas o seu entendimento sobre o que se quis dizer chegará a um porto seguro. Pode se falar tudo sobre este filme. Menos que faltou arrojo e fôlego em quem fez o roteiro, o dirigiu e o montou. Se você gosta de cinema, estética, beleza plástica; alta qualidade e boa condução, dê uma olhada nele. Em tempo, ele ganhou mais prêmios no Oscar 2023 do que eu imaginava.
José Delfino – Médico, poeta e músico
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