COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: COISAS DO PLANEJAMENTO URBANO, OU DA FALTA DELE –

Há poucos dias, Luciano, o meu genro, me mandou um artigo que falava sobre problemas ocorridos quando da aprovação pela Prefeitura, para a construção da Cidade Satélite.

O artigo de curiozzzo.com, diz que a Cidade Satélite já foi considerada “cidade proibida”, coisa que eu não conhecia, ou não me lembrava, mas, o autor, faz algumas observações, que se aproximam muito da verdade, como pode ser visto adiante.

Nesta semana, ouvia a Rádio Cidade, e acompanhei parte de uma entrevista que tratava sobre os trabalhos relativos ao Plano Diretor de Natal, para a sua atualização, suas pretensões e justificativas.

Pelas dificuldades mostradas, vi que a coisa mudou para pior, comparando com os idos dos anos 70, do século passado.

Como liguei o rádio do carro, com a entrevista em andamento, e desliguei, em função de compromissos, não consegui identificar o entrevistado.

Porém, como, vez por outra, converso com Wilson Cardoso, um abnegado, que não sei onde arranja tempo e nem “saco”, para aguentar determinadas figuras, burras e xiitas, que se metem para complicar o que deveria ser simplificado, sei que continua sendo um trabalho difícil.

Ontem, vindo para Monte das Gameleiras, e passando pela BR101, no trecho Parnamirim – São José de Mipibu, vejo que ainda existe uma placa da “CIDADE BELA”, que foi um empreendimento lançado em 2011.

Vamos por parte.

A CIDADE BELA

Revendo um artigo que escrevi, recuperei a informação a respeito desse empreendimento, com os números respectivos, que seriam: 2.700 lotes, com 10m de frente e 20m de fundo.

Ou seja, um diminuto tamanho de lote, para provocar um grande adensamento, numa área, que pode ser classificada como de expansão urbana da Cidade de Parnamirim.

O que foi denominado de CIDADE BELA, na verdade, seria mais um conjunto habitacional, carente de estudos pelo poder público, e que, bem poderia se chamar de FAVELA BELA.

 

O PLANEJAMENTO URBANO

Com a vivência de quem participou de experiência semelhante, é fácil afirmar que o terreno localizado entre Parnamirim e São José de Mipibu, numa área situada em cima de importante aquífero, mereceria contar com sérias preocupações, com relação a este aspecto.

O abastecimento da Capital, Natal, e sua região metropolitana, depende das lagoas próximas, inclusive da Lagoa do Bomfim e do sistema lacustre onde está incluída.

No entanto, nem o Governo do Estado, e muito menos os municípios onde ela está situada, estão se preocupando com isso, e os terrenos estão sendo submetidos a intenso retalhamento, para um também intenso adensamento e, consequentemente, para uma intensa e excessiva impermeabilização, com a previsível e inevitável poluição do aquífero.

O BNH X PLANEJAMENTO URBANO

Quando do lançamento do loteamento, CIDADE BELA, ao ver a notícia, era como se eu estivesse revendo o filme que assisti na década de 1970.

Nessa época, o Banco Nacional de Habitação – BNH, com a justificativa de acabar com o déficit habitacional e, arvorando-se disso, retalhava em pequenos lotes, grandes glebas, situadas nas áreas de expansão urbana, como forma de reduzir o preço da compra, porém, segundo se comentava, recompensando, muito bem, essas transações.

Nesses projetos, não havia preocupação com o meio ambiente e muito menos com a integração desses novos núcleos habitacionais com o tecido urbano existente.

No popular: a Prefeitura que se lixe!

Diante desse quadro, que parecia sem solução, a Secretaria Municipal de Planejamento de Natal, contando com o apoio do Conselho Municipal de Planejamento Urbano, e, por uma questão de justiça, também com apoio do Prefeito Vaubam Faria, passou a exigir o atendimento da legislação, com os olhos no presente e no futuro.

Foi um acinte ao “status quo”.

Dois projetos eram as “meninas dos olhos” de uma Cooperativa Habitacional, o INOCOOP, criada à sombra do BNH.

Eram eles: o CONJUNTO PONTA NEGRA e o CONJUNTO CIDADE SATÉLITE, ambos a serem edificados em áreas de expansão da Cidade do Natal.

CONJUNTO PONTA NEGRA

Para a construção do CONJUNTO PONTA NEGRA, o preço do terreno, por ser mais valorizado, era a justificativa para tentar convencer a área política – Governador, Prefeito, Senadores, Deputados e Vereadores – que não seria possível atender as exigências da legislação, quanto ao tamanho dos lotes, a largura das ruas e a reserva de áreas verdes.

Apesar das pressões dos políticos e também dos empresários da construção civil, com as mais diversas tentativas de “convencimento”, não houve recuo da área do planejamento municipal.

Não foram permitidas as reduções pretendidas, que possibilitassem construir um maior número de casas, em detrimento das condições de conforto, circulação e lazer, e em desobservância das normas legais.

 

CONJUNTO CIDADE SATÉLITE

A CIDADE SATÉLITE ficava, como ainda hoje, distante da área urbana de Natal, e o projeto foi imaginado como se, realmente, fosse algo independente.

O próprio nome, denunciava essa definição: não seria um bairro da Capital.

Se constituiria, numa Cidade Satélite.

O artigo de Curiozzzo.com, cita dados que eu não me lembrava.

Tipo assim: “criação de 6.000 casas”, “subdividida em três etapas. Na Etapa I, as ruas recebem nomes de serras brasileiras e pássaros. Na Etapa II, as ruas recebem nomes de rios. Na Etapa III, as ruas recebem nomes de árvores brasileiras”.

Segundo ele, a construção do conjunto foi marcada por algumas polêmicas, e reconhece que, “pra começar, o conjunto foi construído numa área ainda com a urbanização prematura. Havia falta (ou deficiência) de infraestruturas básicas, como comércio de bens e serviços e transporte público”.

Eu posso afirmar, que, na verdade, não havia nenhuma urbanização, abastecimento de agua e nem energia elétrica. Transporte coletivo? Nem pensar.

Era um ser estranho. Um “alienígena” urbano.

Outra afirmação do curiozzzo.com, é que “o Plano Diretor da cidade vedava a construção em áreas localizadas das dunas… Além do mais havia por lá “um potente lençol freático”

Era a realidade.

CIDADE SATÉLITE X CIDADE BELA

O que existia com relação ao Conjunto Cidade Satélite e a Cidade de Natal, hoje, existe com relação ao loteamento Cidade Bela e a Cidade de Parnamirim.

Antes de qualquer coisa, os dois, sendo terrenos situados em cima de importante aquífero, mereciam contar com preocupações com relação a esse aspecto.

Para a construção do Conjunto Cidade Satélite, também pretendiam retalhar a área em pequenos lotes, o que traria riscos ao aquífero, com adensamento e impermeabilização excessivos.

O planejamento municipal, exigiu, com base num estudo técnico, que o tamanho dos lotes, arruamentos e até o respeito a uma via de acesso e travessia à Natal – cujo projeto estava em elaboração – fossem respeitados.

Atendendo às exigências, o conjunto foi construído e, passados muitos anos, para a construção do prolongamento da Av. Prudente de Morais, na área da Cidade Satélite, não ocorreram as célebres demolições, e não foi processado nenhum centímetro de desapropriação, coisa tão comum, às obras não planejadas.

Adicionalmente, em decorrência do planejamento da Avenida, ainda se encontram disponíveis grandes áreas verdes – que se constituem num verdadeiro parque urbano – porém, as administrações municipais fazem questão de ignorar.

A HISTÓRIA DO CORNO

Quando se fala em pressões, algumas não podem ser citadas e outras, muito menos, publicadas.

Entre as ocorrências publicáveis, conto uma, por ser hilária.

Estando na sede do BNH, em Recife – tratando de projetos de financiamento para a Prefeitura – fui convidado à comparecer ao gabinete do Gerente Regional, para uma reunião.

Tal evento, não estava na agenda, e, mesmo desconfiando do “convite”, no final do expediente, fui até lá.

Ao ser anunciado pela secretária – que não me mandou entrar – o Gerente, veio ao meu encontro, e, “sem cerimônia”, foi logo me perguntando se eu conhecia a “história do corno”.

Tentando me controlar, para não lhe mandar à “PUTA QUE O PARIU”, mas querendo ser sarcástico, eu disse que ele, com certeza, devia conhecer esse tipo de assunto, e não eu.

Então ele falou: “o corno descobriu que a mulher dele estava lhe traindo no sofá da sala de sua casa e, como solução, mudou o sofá de lugar”.

Obviamente, disse: “isso não impediria que ela continuasse a traí-lo”.

A metáfora utilizada, tinha como finalidade, dizer que o fato do Planejamento Municipal de Natal, criar dificuldades, seria como mudar o sofá de lugar.

Não impediria que os conjuntos habitacionais fossem construídos, e da forma que o BNH e os empresários queriam.

Perguntando se ele tinha concluído a “sua história”, e recebendo o sinal afirmativo, me retirei.

Para contar essa coisa que eu VIVI, recorro ao testemunho do meu amigo, engenheiro Geraldo Melo, que me acompanhava.

Pois bem.

Apesar de tudo isso, os conjuntos Cidade Satélite e Ponta Negra, somente foram construídos, por atenderem às exigências do tamanho dos lotes e das suas ruas largas, além das áreas verdes, salvas da ganância, e observando às normas municipais.

Quanto ao Sr. Evaldo Amorim, que era o Gerente Regional do BNH, não sei se ele resolveu o problema dele, mudando o sofá da sala da sua casa.

Hoje, ao passar pela Cidade Satélite e pelo Conjunto Ponta Negra, me sinto orgulhoso de mim mesmo.

 

 

 

Antonio José Ferreira de Melo – Economista, [email protected]

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

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