COISAR –

Fui uma sofredora na disciplina de inglês na época da escola. Não conseguia entender o tal do verbo TO BE, que, segundo meus filhos, não tem nem o que entender. Daí se percebe meu tormento. Tivemos um professor fofo, chamado Silvino. Foi através dele que me encantei com Somewhere over the rainbow e as aulas de inglês, ainda difíceis, deixaram de ser um fardo para mim.

Depois de algum tempo, cursinhos e um mestrado, o inglês se encaixou melhor em minha vida, mas não ao ponto de ser segunda língua. Sei que entre professores e teachers, um deles me disse:

– A palavra saudade só existe na língua portuguesa. Não tem correspondente no inglês.

Que romantismo envolve esta afirmação! Todos sentimos saudade, porém apenas nós, brasileiros, conseguimos expressar em palavras?

Saudade… Saudade sempre presente em nossas histórias. Saudade dos cheiros da infância. Saudade das brincadeiras com os amigos. Saudade da sensação de poder conquistar o mundo e superar qualquer dificuldade. Saudade…

Hoje me peguei pensando na palavra manga, que pode ser fruta, pode ser parte da camiseta, pode vir do verbo mangar, que aqui no nordeste significa zombar. Pensava na palavra pata. Pata do caranguejo, pata do ovo de pata. Lembrava sorrindo de nosso Felipe me perguntando:

– Quando o pato perde a pata ele fica viúvo ou manco?

Que saudade deles pequenos…

Volto à saudade…

Enquanto minha cabeça divagava diante desta afirmação poética de nossa superioridade nos sentimentos diante de outras línguas mais triviais e sem emoção, algo mais prático me surgiu: e o verbo coisar? Acho que não há nada mais brasileiro que o verbo coisar! Ou será apenas nordestino? Ou potiguar? Sei que o verbo coisar, que vem do substantivo COISA, serve para praticamente tudo. Eu coisei o almoço hoje. Estava coisada e nada me serviu na loja. Ele fica coisando perto de mim e isto me irrita.

Engraçado como amo este verbo e suas nuances coisentas. Como cada coisa fica em seu lugar! Penso que uma coisa é uma coisa, enquanto outra coisa é outra coisa e as duas coisas são completamente diferentes, mesmo coisando meu raciocínio.

Aliás, que saudade de coisar por aí, sem destino, sem preocupação, apenas coisando…

Saudade…

 

 

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, professora universitária e escritora

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *