EUGENIO

Eugenio Bezerra Cavalcanti Filho

Viu-se de tudo, nessa sessão da Câmara dos Deputados, para definir sobre a admissibilidade da abertura do processo de impeachment. Certas coisas me causaram certo constrangimento. Não me atenho, aqui, ao mérito da questão sobre aquilo que teria de ser resolvido. E nem desejo discorrer com respeito ao resultado, que já era tido como certo, pelas análises prévias levadas a cabo. Gostaria apenas de deixar registrada a razão do que teria me provocado o constrangimento a que aludi no início deste texto.

Chamou-me muito a atenção o desagradável comportamento desses nossos parlamentares, cuja esmagadora maioria não se dá ao respeito, e demonstra elevado grau de deseducação e incivilidade. Sempre se nota isso, mesmo nas sessões ordinárias da casa legislativa. O que também se observa, amiúde, quando nas sessões das Comissões Temporárias. E ainda nas sessões do Conselho de Ética, a exemplo das que tratam sobre a quebra de decoro parlamentar envolvendo o presidente da Câmara.

Bem diferente das sessões em outras câmaras por esse mundo afora, quando todos os participantes mantém-se devidamente acomodados em seus respectivos lugares, e somente se manifestam quando lhes é franqueada a palavra. O exemplo melhor que me vem à mente seria o das sessões na ONU, além dos parlamentos em países mais desenvolvidos, como aqueles de língua inglesa na América do Norte e boa parte dos europeus (especialmente os escandinavos).

Na célebre sessão do domingo passado, e nas que a antecederam sobre o mesmo assunto, as irregularidades e desrespeitos se elevaram a níveis incomuns. Nem preciso me expandir muito sobre isso, pois tudo o que já tem sido divulgado a respeito, em diferenciadas mídias, e notadamente nas redes sociais, dá ideia perfeita de tudo o que aconteceu. O que saiu de “memes” e gozações sobre o assunto daria até para compor um livro inteiro. Não deveria ser assim, desde que os excessos fossem previamente evitados, com regulamentação específica visando a se obter comportamento bem mais civilizado, por parte dos parlamentares.

Muita coisa contribui para que as sessões cheguem a essa aparência de espetáculo circense. A começar pela enorme difusão daquelas placas com dizeres alusivos ao evento (contra ou a favor), coisa copiada dos americanos, pois que são largamente utilizadas nos comícios e manifestações por lá, como se vê nessa época de prévias para a eleição presidencial. Nessa sessão do domingo até mesmo uma faixa de elevadas dimensões foi exposta, por alguns momentos, por trás da mesa da presidência, solicitando o afastamento do titular. Outro fator que conduz a enorme desordem seria a contínua movimentação dos participantes, e sua permanência em determinados locais, precisamente na área frontal à mesa da presidência.

O procedimento da apuração, previamente definido, igualmente se constituiu, senão o maior, um dos mais impactantes motivos de balbúrdia e confusão. O processo de indicação explícita do voto, por cada um dos 513 deputados sufragistas, conduziu a manifestações individuais que sabiam mais a contentamento pela exposição relâmpago que a casa e a ocasião lhes propiciavam, pela primeira e, por certo, única vez. E, aproveitando a excepcional oportunidade, foram contra ou a favor, do assunto em pauta, pelas mais variadas razões, como parentes, amigos, eventos, situações, etc. Pode até ter havido, mas, nos momentos em que estive assistindo (e que não foram poucos), não ouvi quaisquer menções aos motivos que deveriam estar sendo discutidos, quais sejam as “pedaladas fiscais” e os “créditos suplementares”.

Parecia até que as celebridades instantâneas não tinham conhecimento (apesar da ampla divulgação) dos reais motivos da votação e do teor do relatório da comissão, que descrevia os fundamentos jurídicos para o crime de responsabilidade. Não ouvi, também, menções quanto às deficiências nos setores de saúde, educação, segurança, transportes, etc. E das muitas razões descritas para o voto, uma é singular e estranha, a do deputado Lucas Vergílio (SD/GO), que afirmou: “Voto SIM pela minha filha que vai nascer, pela minha sobrinha Helena, e por todos os corretores de seguros do Brasil”.

Contudo, a declaração antes de voto que causou maior indignação teria sido a do deputado Jair Bolsonaro (PSC/RJ), que, em meio a outros registros, falou: “… em memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Russeff”. Para quem não sabe, o coronel homenageado, gaúcho de Santa Maria (28/07/1932), dirigiu por cerca de quatro anos o DOI-Codi de São Paulo, um dos mais famosos centros de repressão do Exército durante a ditadura. Foi o primeiro agente a ser reconhecido pela Justiça brasileira como torturador. Morreu a 15/10/2015, de câncer, em Brasília. O deputado Bolsonaro também esteve envolvido em dois outros fatos desabonadores acontecidos na famosa sessão de domingo passado na Câmara. O deputado Jean Wyllys (PSOL/RJ), quando retornava após ter dado seu voto, foi insultado pelo Bolsonaro, e revidou com atitude execrável, dando uma cusparada em direção ao autor do insulto. Em seguida, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSC/SP), filho do Jair, revidou o indigno ato, cuspindo no Jean Wyllys. Quanta baixaria!

Façamos votos para que as sessões no Senado Federal, em continuidade ao andamento do processo de impeachment, transcorram com mais ordem, respeito, e urbanidade.

Eugenio Bezerra Cavalcanti Filho – Empresário aposentado / Escritor

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