ANA LUIZA EE

AS VOLTAS AMIGAS DA VIDA… –

Quando escrevo, geralmente apresento um assunto genérico e o insiro no nosso cotidiano. Hoje, farei o oposto.

O mundo, em suas “eternas” atribuições, costuma nos ensinar através da repetição, da visualização e dos reencontros com aqueles assuntos que costumamos deixar para trás. Cada chegada ao ponto final nada mais é do que um retorno à linha de partida. Assim, aprendemos que lembranças levar, que momentos guardar, o que deixar para trás, mesmo que seja o que devemos carregar, pois, ao retornar, recomeçamos e podemos selecionar tudo de novo. O mundo é assim. A vida é assim.

Cada um tem uma biblioteca particular, guardada em sua mochila eterna. Existe todo tipo de livro, de álbum de coleções, de interações, lá guardados, esperando a hora de serem relidos, entendidos e arquivados.

Muitas vezes, somos tomados pela preguiça, pelo medo, até mesmo pela dor e, assim, adiamos reencontros vezes sem fim.

Acontece que, se apenas enchermos a mochila da vida de questões pendentes, ela ficará mais e mais cheia, podendo mesmo arrebentar ou causar dor e exaustão de tanto ser levada da partida à chegada e de volta à partida.

Muito do que levamos são fatos passados, rancores mofados, sentimentos de dor e tristeza que estão cheios de poeira… E isso não precisa, nem deve, ser carregado por uma jornada inteira.

Todos, por mais perfeitos que sejam (eu, de fato, estou bem longe da perfeição), erram, desagradam, ofendem, exageram ou exploram aqueles que estão a sua volta. Muitos foram injustiçados, mal julgados, diminuídos (ou até mesmo verdadeiramente confrontados para o seu próprio bem). Todos passamos por alguma dessas situações, então não há dedos a se apontar ou pedras a se jogar.

O nosso verdadeiro e único erro é passar mais do que o momento de reflexão necessário preso às artimanhas da inveja, do orgulho, do ciúme, da soberba e exagerada autoconfiança.

Se precisamos andar cada dia com a nossa bagagem, vamos fazê-la mais leve, mais agradável. Levemos, certamente, as lições que devemos aprender, mas também levemos desculpas, mimos, querer bem, palavras doces, amor e interesse verdadeiro pela melhora e crescimento alheio. Vamos engarrafar risadas de felicidade, encaixotar um tanto de perdão, colocar um saquinho leve, e que dura muito, de um ingrediente importante e esquecido nos dias de hoje, um saquinho de deixaparalá. Vamos nos munir também de um grande saco, de fundo furado, onde armazenaremos, sem o menor cuidado ou apreço, tudo o que tentar nos ferir.

Levemos também um grande e dobrável espelho, que não pesa nadinha e nos mostra os nossos erros e onde podemos aprender; que ajuda a tentar melhorar não só a nós mesmos, mas nos conduzirá numa jornada gentil de ajuda ao próximo.

Com a mochila mais leve, teremos tempo para observar melhor o que fizemos e com quem fizemos a nossa vida. Aquele amigo que nunca vemos e sempre sentimos saudades, aquele primo que foi tão presente e que nunca nos imaginamos sem ele, aquela irmã que a vida te deu, mesmo antes de você ter irmãs de verdade.

Tem o pai, a mãe, o tio e a tia que chamamos de “tortos”, mas que são retos e repletos de amor. E tem tanta gente que entra torta só para nos endireitar! Vamos contar essas pessoas, esses ocorridos, esses encontros, com a valiosa medida do amor.

E se, mesmo assim, dentre essas pessoas, insistirmos em guardar sentimentos de desagrado, de mágoa, de ciúmes, lembremos que, se os atos deles não foram movidos pelo nosso bem, vamos voltar e verificar que somos apenas imperfeitos e humildes humanos, tentando, aprendendo, falhando e superando a cada volta amiga da vida.

Ana Luíza Rabelo Spencer, advogada ([email protected])

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *