PACIÊNCIA COM DEUS –

Entro numa livraria como entro num templo: com todo o respeito e admiração pelo conhecimento que ali, nas prateleiras, estão à espera de leitores para que sejam “adotados”.

Tenho a impressão que cada autor, estando lado a lado, “conversam” sobre o que trazem nos seus conteúdos e, quando a nossa mão guiada pelo olhar, deles se aproximam, com a intenção de folheá-los, “dizem” tchau e se desejam, boa sorte!

O que me leva a escolher um livro a outro?

Fico às vezes refletindo: tomo essa decisão baseado no meu estado de espírito, pela quarta capa onde um relato breve apresenta o tema, os personagens, e como eles se desenvolvem durante a história, ou ainda, pelo título?

Não tenho uma regra para tal, mas certamente, cada um desses procedimentos será determinante para facilitar minha decisão.

Recentemente testei minha “resistência” numa livraria da cidade – depois de passear pelas estantes, as mais diversas, tomei emprestados alguns livros para pacientemente escolher qual deles faria companhia aos meus velhos “conhecidos” autores que se debruçavam na minha cabeceira.

Cada livro “mostra” para mim, sua parte mais visível (lombada) que é o lado vertical do livro onde se ligam capa e miolo que contém informações como o título e o autor da obra. Como estava me testando, nada li sobre aqueles escolhidos.

Esse momento é cerimonioso.  Um assento, uma cadeira qualquer, dá o amparo para prosseguir na decisão. Mas, de pronto retomei consciência do descaso que a totalidade das livrarias tem com os leitores burilados pela idade, que “adoram” descansar as pernas folheando e fazendo “amizade” com cada autor, e nada de um lugarzinho para tal.

Em sinal de protesto, fui penosamente, devolvendo aos seus devidos lugares, justamente aqueles que nada tinham com o menosprezo dos atuais livreiros da cidade.

Vingança? Não. Pernas sem condições de pausadamente criar vínculos com o pensamento, a mensagem, que o livro oferece.

Porém, um fato curioso me chamou atenção: ao reconduzir um dos livros a sua posição original, eis que sua “vaga” estava ocupada por outro.

Que atrevimento!

Retirei-o e devolvi o espaço ao seu dono primeiro. Mas, fiquei novamente com um livro nas mãos. Dissipei meu protesto – afinal não levei minha bandeira, e me fixei no título: PACIÊNCIA COM DEUS – Oportunidade para um encontro, de Tomás Halik, cientista social e teólogo, nascido em Praga (1948).

Paciência com Deus?!

A todo instante tenho clamado pela paciência de Deus e não “de lá pra cá”.

As pernas deixaram de incomodar, a “revolta” sumiu e com um sorriso fui me acomodar num cantinho do balcão com o olhar vidrado na “Oportunidade para um encontro”.

A cada página aberta e escaneada pelo olhar acolhedor, apenas fragmentos de frases me absorviam.

Vejamos algumas:

Mas onde é que Deus está quando não há amor, quando só há crueldade, dor, pecado e sofrimento?”

“Sempre que seguimos no encalço de Jesus, aproximamos os outros de nós, incluindo os que estão “afastados”, o Reino de Deus é alargado na terra”.

O autor, Tomás Halik, desenvolve o seu pensamento a partir de Lucas (19,1-10) que trata da história evangélica de Zaqueu, porém refletido sobre três aspectos: Horizonte (olhar para as margens), Perspectiva (paradoxos da vida) e Estilo (modo sapiencial de olhar a vida).

Diz ele: “Zaqueu é, aqui, muito mais que ele próprio. Ele é símbolo de uma procura, de um desassossego. Ou melhor, é símbolo de quantos vivem de maneira desassossegada em atitude de procura”.

Não é um livro de autoajuda, mas de reflexão sobre o Cristianismo como hermenêutica das luzes e sombras da vida, que tem na paciência sua grande regra.

Não sou de me apegar a certas ligações, mas foi como se o Senhor me dissesse: “Desce da árvore do orgulho”.

Sorri para a atendente do caixa, já com o livro na sacola e, como “humano” desassossegado retruquei: coloque umas cadeiras para os “velhinhos”.

 

Carlos Alberto Josuá Costa – Engenheiro Civil e Consultor ([email protected])

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2 respostas

  1. Parabéns Josuá pela excelente narrativa para a obra literária. Deixa qualquer leitor com desejo de “visitar” a livraria mais próxima.

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