OS ASPECTOS EMOCIONAIS E PSICOLÓGICOS NO PROCESSO DE ADOECIMENTO –

Quando um profissional se submete a trabalhar com o processo de adoecimento ele deve estar preparado para um eterno aprender e reaprender, portanto ele deve estar aberto para essa experiência e, consequentemente, não saíra o mesmo, seja como pessoa ou profissional.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1948 afirmou que, saúde é o estado de completo bem-estar físico, mental e social, não apenas a ausência da doença, ou seja, o cuidar vai para além do diagnóstico médico, seja ele qual for. Os processos de adoecimento, principalmente os que ameaçam a vida de alguma forma, não se resumem apenas ao adoecimento físico, mas também a um luto simbólico de algo que não está mais presente, gerando nos indivíduos sentimentos ambivalentes, de medo, estresse, ansiedade, tristeza e culpa. A forma como cada pessoa vivencia um diagnóstico é subjetiva tanto para ela, quanto para o grupo ao qual pertence, envolve contextos históricos com outros adoecimentos, fases do desenvolvimento, idade e como lida com as perdas.

O psicólogo vai atuar na linha de frente desse processo de elaboração e ressignificação do adoecimento fazendo uma ponte entre o indivíduo, seus familiares e equipe. Quando uma pessoa está enfrentando uma doença, tudo o que ela tem como crença, ideais e o que pensa sobre o mundo e se mesma são colocados à mesa. Mudanças no corpo, rotina, família, trabalho e finanças começam a surgir, fazendo-a acreditar que ela perdeu totalmente o controle, algo que comumente não se está preparado para enfrentar.

O profissional irá auxiliar no momento do diagnóstico de forma que, o sujeito e os envolvidos conheçam o diagnóstico, suas estratégias de enfrentamento e suas possibilidades de adaptação para a nova realidade. Cada pessoa irá interpretar o processo de adoecimento de forma diferente, portanto, o tratamento vai se estender a todos os envolvidos de forma singular desde o paciente, redes de apoio, seus familiares, cuidadores e profissionais. O respeito e um ambiente onde essa subjetividade possa ser expressada vai trazer ao paciente e seu acompanhante a oportunidade de elaboração diante da nova realidade. Os sujeitos precisam sentir-se seguros que poderão trazer seus maiores medos e seus pensamentos mais íntimos e serão ouvidos de forma genuína, acolhedora, ética e profissional.

Trazendo um pouco para nossas experiências, no percurso nos cuidados a pacientes acometidos com doenças que ameaçavam a vida, especificamente pacientes oncológicos na Casa Durval Paiva, vivenciamos junto a esses pacientes e familiares as mais diversas formas de enfrentamento. Ainda que tenhamos a teoria, a prática nos mostra que ninguém vivencia do mesmo jeito pois, muitas vezes, as dores vão para além do adoecimento.

Alguns episódios marcantes que podemos exemplificar essa questão: em uma visita de rotina, quando uma mãe não sabia como introduzir o uso da touca para a filha que acabará de cair todo o cabelo. O marido não tinha conseguido e para ela também era muito ruim, porque sempre lembravam dos cabelos longos e cheios da filha e começavam a chorar. Participamos desse processo e foi diferente de tudo que já vivenciamos. Outra situação foi em meio a uma dinâmica grupal (Projeto Grupo Mãos Dadas voltado para as mães e acompanhantes), durante uma dinâmica onde era preciso dizer o que sentiam falta, uma mãe relatou sentir falta de como o filho era antes de ser amputado, de como ele era antes de tudo, “não faltava um pedaço”.

Esses relatos reais, só reafirmam que o cuidado transcende não somente a visão do diagnóstico e patologia, mas temos que estar atentos aos pequenos detalhes, discursos marcantes de uma mãe que ainda não elaborou a perda do membro de um filho e que se sente culpada por ainda ter falta disso, mesmo que o filho esteja bem. Outra que ainda sente pela dor da vaidade da filha e se vê sem poder fazer nada, apenas buscar estratégias que possam de alguma forma atenuar o momento. Com isso, vemos que a perda da saúde é bem mais que só a ausência de doença e é nesse contexto que atuamos, nesses relatos diários ou nos olhares que nem mesmo as mais elaboradas palavras conseguiriam descrever.

 

 

Adelaide Alaís Alves Targino da SilvaPsicóloga da Casa Durval Paiva, CRP 17/4085

 

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