GRANDES FIBURAS: EUDES MOURA –

Participando de uma reunião virtual da Academia de Medicina, assistindo a uma palestra de Iaperi Araújo, lembrei-me de artigo publicado no POUCAS E BOAS -3, sobre o professor Eudes Moura. Vale a pena reler:

O professor Eudes Moura é uma figura sem par, portanto, ímpar. Tem uma inteligência brilhante e cultura diversificada. Na medicina fez escola na ortopedia e traumatologia, com projeção nacional e internacional. Mais destaque não teve por obediência à máxima de Câmara Cascudo: Natal não consagra nem desconsagra ninguém. É a pura verdade. Eudes Moura fala vários idiomas com fluência. Morou na França, onde era chamado de Monsieur Moura (pronuncia-se mourrá).

É arquiteto autodidata, com alguns projetos executados, como a Associação Médica, o Hospital da Polícia e a casa de Araken em Cotovelo. Entende de música, toca vários instrumentos e solfeja blues e clássicos de ponta a ponta. Mestre na culinária, é um gourmet cuidadoso que prepara os mais variados e sofisticados pratos. Entende de vinhos, conhaques, uísques, champanhes, enfim, todas as bebidas. É fumador de charutos e cachimbos, conhecendo-os em profundidade.

É um exímio conferencista que discorre com propriedade e carisma sobre os muitos dos assuntos que domina, deixando a plateia encantada. Um papo envolvente e espetacular, o professor Eudes não conta uma história, simplesmente interpreta. É um artista nato.

Sofrido, viu o seu filho, o grande Paolo Bruno, ser assassinado na flor da idade. Por ironia, problemas ortopédicos na coluna vertebral tentam atrapalhar a multiplicidade de tarefas que desfruta com sabedoria no merecido ócio com dignitate. Mas o melhor do professor Eudes é o seu bom humor, o que me permite contar algumas das suas histórias engraçadas, sem sequer consultá-lo.

VIAGEM DEMORADA

Um dos seus grandes amigos é Dalton Melo de Andrade. Certo dia, na casa de Dalton, na praia de Jacumã, após os licores e cafés, os convidados todos se foram. O professor Eudes, no entanto, resolveu fumar um dos seus enormes charutos, um Cohiba, por volta das quatro horas da tarde. Deu uma enorme baforada e perguntou:

– Dalton, eu tenho que esperar um amigo às sete da noite. Quanto tempo eu levo daqui para a rodoviária?

Dalton, que não troca a sua sesta por nada neste mundo, não perdeu a oportunidade:

– Você saindo daqui neste exato momento vai chegar na rodoviária mesmo em cima da hora!

Eudes entendeu o recado e tomou a estrada.

A BOA FAMA

Caminhando pela Afonso Pena, começou a chover e o professor Eudes abrigou-se embaixo do toldo de uma loja, Cantinho Sertanejo, que vende produtos de Caicó. O dono, muito conversador, ao ver Manoel Duarte passar apressado, sem ligar para a chuva, comentou:

– Esse doutor aí é médico, anestesista. Muito rico. É dono desses prédios todinhos dessa avenida. Antigamente os médicos não ficavam ricos desse jeito. Me lembro de um ortopedista, um moreninho baixinho que operava todo mundo de graça lá no Hospital das Clínicas, doutor Eudes… morreu pobre, mas fez o bem a muita gente…

O professor Eudes Moura, olhou firme para o velho sertanejo que contemplava extasiado a chuva e perguntou:

– E ele já morreu?

– Morreu pobre, não ligava pra dinheiro…

A chuva arrefeceu e o professor continuou a sua caminhada, reconfortado com a reputação que deixara na terra.

CASTIGO A JATO

Ao terminar a solenidade de comemoração dos cinquenta anos da faculdade de medicina, após um brilhante discurso do professor Carlos Ernane Rosado Soares, as pessoas formavam pequenas rodas para bater papo. George Tarcísio, que deixara a barba crescer, aproxima-se de José Delfino, também barbudo e comenta:

– Pôxa, Delfino, como você está parecido com o professor Eudes!

– Eu vim cumprimentá-lo pensando que era ele… só está faltando o cachimbo e a bengala.

Delfino, grande amigo do professor Eudes, ficou meio sorumbático por conta da diferença de idade. Nesse exato momento, uma senhora bate no ombro de George Tarcísio. Quando este se vira, a senhora exclama com convicção:

– Doutor Eudes, há quanto tempo não nos víamos?!

E deu um forte abraço no professor Eudes, digo, em George Tarcísio, para alegria e garbo de José Delfino.

 

*Texto extraído do livro Poucas e Boas 3 e também publicado no Jornal de Hoje, o que provocou o seguinte comentário do Professor Eudes Moura: é um verdadeiro necrológio em vida!

 

 

 

Armando Negreiros – Médico e Escritor, [email protected]
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

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