Quem se propõe amar um gato tem bom coração. E decide com ele fazer parceria, porque ninguém consegue ser dono do menor dos felinos.

O parceiro bípede procura entender o segredo escondido nos olhos do outro. Neles estão conexões insólitas, inexplicadas. Talvez até sejam expressões extrassensoriais.

Possivelmente por isso, os gatos tornaram-se ícones de civilizações antigas, despertam fascínio, veneração, medo, estigmas.

O gato de casa, nunca é domesticado do mesmo modo que um cachorro, ou as avezinhas treinadas como o concriz, ou a graúna, ou o sabiá-laranjeira e da mata. Uma anedota popular ilustra a diferença. O cão disse: “Ele me dá casa, comida, atenção, carinho. O homem é meu deus”. O gato disse: “Ele me dá casa, comida, atenção e carinho. Eu devo ser um deus”.

Os gatos guardam predileção pelo oculto, pelo invisível. E isso lhe confere um código de conduta secreto, só em aparência revelado. Eles são irmãos da noite. Escapam para aventuras indescritíveis. Alguns chegam a andar quilômetros, segundo atestam estudiosos veterinários e até mesmo etnólogos que dão conhecimento aos humanos do comportamento animal.

Especialistas atestam que a “domesticação” dos gatos ocorreu há mais de oito mil anos. Para mim, não foi assim. Ele é apenas um animal selvagem que se aproximou voluntariamente do homem. Esta é uma das causas do seu poder sedutor. Também atrai o ser humano a simples possibilidade de conviver diariamente com um animal selvagem, que se sente confortável com a humana afeição.

No Egito Antigo, ele foi elevado à categoria de deusa, Bastet que era representada com corpo de mulher e cabeça de gato. Era a maior protetora do sexo feminino. Os egípcios deveriam ter notado a identificação das características: a linha curvilínea, a flexibilidade, a beleza, as manhas, o mistério. Eles e elas gostam de mostrarem-se “blasé” às circunstâncias, ficarem em atitude cética, atentos à novidade. Há mais coisas entre o céu e a terra (na cabeça de um gato e de uma mulher) do que pode imaginar nossa vã filosofia.

A sabedoria, elegância e singularidade dos gatos conquistam o amor e narrativas de intelectuais do mundo inteiro. Teófilo Gautier afirma que eles são pequenos tigres, que desejam ser amados. Quando ronronam estão atraindo a humana atenção.

Jamais se perde o tempo passado em companhia dos gatos. Carlos Drummond de Andrade presume que ele seja um animal metafísico. Machado de Assis escreveu uma carta agradecendo o presente que lhe dera uma menina, assinando apenas Gatinho Preto. Na carta, o gatinho compara-se ao escritor: “Se não mia como eu, é porque lhe custa. Mas espero que chegue até lá”. Braz Cubas (Memórias Póstumas), em seu delírio, transforma um hipopótamo, que busca a origem dos séculos, em seu gato que se chama Sultão. Baudelaire dedica-lhe poema: “Quando estão sonhando, eles assumem a nobre atitude de esfinge / que vai além / se funde à infinitude”.

Os gatos continuam a ser um agradável mistério para todos nós.

 

Diógenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN

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