QUANDO AS FUNÇÕES EXIGEM REPÚBLICA E A IMPROVISAÇÃO É A RESPOSTA –

Estamos em uma era em que ocupar cargos públicos, especialmente os que têm maior responsabilidade institucional, deixou de significar um compromisso com o bem comum e passou a ser visto como um meio de promoção pessoal, engajamento ideológico ou amadorismo na administração. O título deste texto — “Quando as Funções Exigem República e A Improvisação é a Resposta” — expressa de forma crítica a crescente desconexão entre as expectativas do Estado democrático e as ações de muitos que, infelizmente, têm sido investidos de poder.
Em uma República, o desempenho de qualquer função pública, seja ela eletiva ou técnica, traz uma série de rituais: o ritual do cargo. Este ritual vai além das formalidades e representa um conjunto de obrigações simbólicas e práticas que conferem legitimidade à posição de autoridade. Ele demanda preparação técnica, postura ética, sobriedade institucional, respeito à legalidade e, principalmente, a compreensão de que o poder não é do indivíduo, mas sim do Estado.

Entretanto, o que se observa em várias áreas da administração pública brasileira é exatamente o oposto: cargos ocupados de maneira improvisada, por alianças políticas temporárias, por conveniências eleitorais ou por indicações que priorizam relações pessoais em vez de qualificações. O resultado é previsível: decisões erradas, políticas públicas ineficazes, instituições desacreditadas e cidadãos cada vez mais céticos em relação à democracia.

Quando um secretário não conhece a estrutura do órgão que comanda, quando um deputado cria leis sem entender a Constituição, quando um gestor municipal age com a mentalidade de um coronel local, ou quando um ministro trata sua posição como uma extensão de suas redes sociais, o que se observa é a falência da função pública como um instrumento republicano.

O ritual do cargo impõe limitações — limitações morais, legais e simbólicas — que protegem a sociedade de abusos de poder e do uso irresponsável da autoridade. A falta desse ritual transforma o cargo público em um palanque, o poder em vaidade e a República em um espetáculo.

A improvisação, quando se torna sistemática, transforma-se em método. E esse método tem um nome: falta de preparo institucional. Em vez de considerar o Estado como uma estrutura de longo prazo, onde políticas públicas precisam de continuidade, avaliação e profissionalismo, a gestão passa a ser guiada por impulsos momentâneos, retórica emocional e decisões focadas em interesses imediatos.

É dessa lógica que surgem absurdos administrativos, decisões sem apoio legal, ações populistas disfarçadas de políticas públicas e comportamentos claramente opostos ao interesse coletivo. O custo não é apenas político; é também social, financeiro e moral.
A República, por sua essência, refere-se ao bem público. Ela demanda que cada pessoa em um cargo público reconheça que está servindo à sociedade e não a si própria. Isso se aplica tanto a vereadores quanto a presidentes, a servidores efetivos e a funcionários comissionados.

Não é suficiente apenas ser eleito ou nomeado. É necessário estar à altura das responsabilidades da função. Isso envolve respeitar as instituições, valorizar o conhecimento técnico, ouvir a sociedade de forma atenta, atuar com transparência e prestar contas de forma contínua. Onde não existe protocolo, existe confusão. Onde há improvisação, reina a desconfiança.

É fundamental restabelecer, em todos os níveis da gestão pública, a verdadeira essência da função pública. O cargo não pertence a quem o exerce — é uma responsabilidade concedida pelo povo e regulamentada pela Constituição. A improvisação pode parecer inovação a curto prazo, mas tem um custo elevado quando se torna a norma.

As formalidades do cargo são o remédio contra a trivialização da autoridade. Elas asseguram que o poder seja exercido com responsabilidade, respeito e compromisso com a República. Quando um cargo clama por valores republicanos e se oferece ao improviso, o que se resulta é o colapso da ordem institucional — levando consigo a perda de credibilidade do próprio Estado.

 

 

 

Raimundo Mendes Alves – Advogado e vereador

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