PASSEANDO NOS 80 –

Os desenhos do passar dos anos impressos no corpo humano são implacáveis. Algo imutável, inevitável e incessante, que não pode ser impedido, acelerado, revertido ou alterado. O tempo avança de maneira constante, deixando traços indeléveis e difíceis de destruir, suprimir ou fazer desaparecer totalmente.

Para alguns de nós habitantes deste mundo de meu Deus, conviver com as marcas do tempo é motivo de embates incansáveis, visando deter ou minimizar os efeitos deletérios nos visuais de homens e, de forma mais contundente na vaidade feminina – bem que a natureza poderia ser mais complacente com as mulheres.

O homem, em razão de sua fortaleza, sempre privilegiou a força em detrimento do belo. Ao passo que a mulher, considerando a fragilidade e a leveza do ser, prioriza a beleza, a atração e a tentação, além do encanto da maternidade.

Oitentões de hoje se entristecem quando comparam os semblantes angelicais de Brigitte Bardot, Elizabeth Taylor, Claudia Cardinale e de outras tantas atrizes de papéis românticos dos filmes de Hollywood, com o que visualizaram no ocaso de suas carreiras profissionais.

É claro que a ação do tempo também deixa marcas na silhueta do marmanjo, porém essa realidade não o atinge com a mesma intensidade da reação da mulher ante os efeitos degradantes observados no seu perfil. Ao final, tudo se prende à maneira de como acatar o passar dos anos no corpo de cada indivíduo.

Feliz daquele que se conforma com os seus traços sovados vistos no espelho após o transcurso de décadas. É da índole feminina investir na tentativa de manter ou melhorar as ações do tempo em suas feições e corpos antes irretocáveis, porém somente conseguem parcelas irrelevantes do que desejam obter.

Tentar esconder a idade é uma desdita e somente trás dissabores e frustrações. Já saber envelhecer é uma dádiva. Isso não implica em se omitir de cuidar da aparência num processo salutar. O lastimável é se deixar escravizar pela busca incessante da fonte inalcançável da eterna juventude.

No patamar dos 80 anos não vejo necessidade de mudar os meus traços faciais nem meus gostos e preferências adquiridos ao longo da existência. Conheço bem os limites da idade e já não me atrevo a encetar voos que extrapolem a capacidade física que detenho.

Lamento haver parado com o tênis, esporte que pratiquei durante duas décadas e meia. Hoje, eu ando devagar porque já tive pressa; obedeço às placas de Pare, Olhe, Escute e as de Não Corra, Não Mate, Não Morra. Cultivo hábitos saudáveis e sinto saudades de meus pais e irmãos que se anteciparam na viagem para a morada eterna.

Embora sejam maravilhosas e intensas as boas lembranças que detenho eu não sou saudosista, razão de abdicar de um impossível retorno ao passado. Confesso que vivi com a intensidade que quis, cometi erros e acertos e sofri arrependimentos e frustrações, mas no fundo sou feliz por ainda estar aqui.

Nem pensem que isso é algo parecido com algum testamento antecipado, porque a vida começa todo dia com o nascer do sol trazendo alegria para todos nós, sem especificar idade ou sexo, apenas mostrando que ela é a batida de um coração e uma eterna ilusão.

Eis-me aqui, passeando nos 80, de mãos nos bolsos e solfejando para o tempo a música do poeta que exalta a vida, dizendo: “…é bonita, é bonita e é bonita!”

 

 

 

 

José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro civil

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