
Manobras contábeis feitas no orçamento motivam o processo de Denúncia por Crime de Responsabilidade (DCR) contra Dilma Rousseff, com poder de cassar seu mandato. Apesar das inúmeras denúncias de corrupção contra o governo e o Partido dos Trabalhadores, nenhuma delas faz parte do que, ao menos em tese, deverá ser analisado pelos 513 deputados para dizer se deve ou não continuar o processo de impeachment. A acusação foi apresentada no ano passado pelos juristas Hélio Bicudo, fundador do PT; Miguel Reale e Janaína Paschoal. Eles listam acusações mais genéricas de corrupção e manobras contábeis de 2014 e 2015. No entanto, em 2 de dezembro, o presidente da Câmara aceitou apenas a parte da denúncia que trata das chamadas “pedaladas fiscais” e abertura de créditos ilegais em 2015, pois se referem ao atual mandato. À época, parte das suspeitas de corrupção não existia, a exemplo da delação premiada do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral (ex-PT-MS). E uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou que os parlamentares considerassem apenas as pedaladas fiscais e a abertura de créditos suplementares de 2015.
De acordo com o trio de juristas, Dilma cometeu crime de responsabilidade, previsto na Lei nº 1.079 de 1950, e feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição. As chamadas pedaladas fiscais são ações que, na prática, significaram tomada de empréstimos pelo governo em bancos públicos. Em 2015, isso envolveu o Banco do Brasil e produtores rurais. A instituição opera um programa de crédito rural que contém uma espécie de subsídio bancado pelo Tesouro para reduzir as taxas de juros. Com esse dinheiro, o percentual de juros é “equalizado”, para níveis considerados mais competitivos para os agricultores. Numa situação normal, o governo passa o dinheiro para o BB, que empresta o dinheiro mais barato para os produtores. Porém, devido à crise financeira e à falta de caixa, o governo deixou de repassar o dinheiro para o banco, que, mesmo assim, fez os pagamentos aos produtores. Na prática, isso significou uma operação de crédito, de acordo com o Reale, Bicudo e Janaína Paschoal. A dívida do governo com o BB somava R$ 12,7 bilhões em março de 2015 e só foi paga após a divulgação do caso. Para os juristas, ao fazer isso, Dilma cometeu crime de responsabilidade, por tomar empréstimo sem autorização e fora das permissões legais.
A outra acusação se refere aos créditos suplementares. Em 27 de julho do ano passado, Dilma assinou quatro decretos suplementares sem autorização do Congresso Nacional. Em 20 de agosto, baixou mais dois. O objetivo dos créditos eram garantir o cumprimento da meta de superavit primário, a economia que o governo faz ao fim do ano para pagar juros da dívida. Os juristas dizem que a presidente sabia que a meta não poderia ser cumprida e, por isso, abriu créditos incompatíveis e com fontes de receita irreais. Os decretos resultaram em obter R$ 95,9 bilhões no orçamento, embora R$ 93,4 bilhões viriam de anulação de outros gastos já previstos. Seriam obtidos ainda R$ 1,6 bilhão a partir de superavit e mais R$ 863 milhões com excesso de arrecadação. Para o trio de juristas, essa medida também feriu a lei orçamentária e é crime de responsabilidade, além de atentar contra a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição.