EVOCANDO JUCA CHAVES –

Adoro Circo. Sempre fui fã de Juca Chaves. O seu humor inteligente e picante, seus poemas musicados e românticos, além da veia irônica sempre presente em suas composições, fizeram dele, para mim, um dos maiores artistas brasileiros, dono de uma inteligência ímpar e de uma verve irônica imbatível.

A ironia é uma figura de linguagem que tem suas raízes no contexto cultural e na comunicação humana. Compreender o significado de ironia e sua aplicação é essencial para qualquer pessoa que deseje se aprofundar nos meandros da língua portuguesa, seja na literatura, na arte, ou mesmo nas interações cotidianas. A ironia pode ser definida de várias maneiras, mas, em essência, refere-se a uma discrepância entre o que é dito e o que realmente se quer dizer.

Juca Chaves, nome artístico de Jurandyr Chaves, nasceu no Rio de Janeiro, no dia 22 de outubro de 1938, filho de Clarita e de um austríaco, naturalizado brasileiro, que montou a primeira fábrica de plásticos no Brasil.

Juca Chaves cresceu ouvindo música erudita em sua casa. Ainda criança mudou-se com a família para o Jardim Europa em São Paulo. Interessado por música e poesia, com seis anos compôs “Hino aos Cachorros”.

Com sete anos, começou a estudar violão. Com 12 anos, compôs “Semente Bonitinha”, sua primeira modinha de amor dedicada a Neusa, que tinha apenas 10 anos.

Juca foi matriculado no curso de piano, mas depois de cinco aulas abandonou o curso porque, dizia ele: “a professora batia em minha mão e eu batia na mão dela”.

Com 13 anos, Juca reuniu uma coletânea de onze poesias em “Meus Primeiros Versos” que falavam do amor por musas diversas. Com 16 anos frequentava o Clube Pinheiros e foi alí que conheceu Ana Maria, sua mais famosa musa e para quem fez várias canções.

Junto com Lemos Brito e Ricardo Amaral, fundou a revista “Rua Augusta Chic” na qual escrevia crônicas e versos. Ingressou no Centro de Oratória Rui Barbosa recebendo o diploma de História e Composição da Música Brasileira em 1955.

Nessa época, começou a se revoltar com a sociedade e daí nasceu o espírito satírico que o acompanhou em todas as suas modinhas.

Com 19 anos, foi reprovado no curso científico. Seu pai o colocou num banco para trabalhar, obrigando o poeta a cortar o cabelo, o que o revoltou.

As brigas com o pai culminaram com a saída da casa, indo morar com sua avó. Para se sustentar passou a dar aulas de violão, “mas só para meninas”, dizia ele.

Com mais tempo livre, realizou seu primeiro recital no Teatro Leopoldo Fróes, patrocinado por jovens da alta sociedade.

Em 1960, Juca lançou, pela RGE, com arranjo de Simonetti, o LP intitulado “As Duas Faces de Juca Chaves”, no qual gravou “Por Quem Sonha Ana Maria?” feita para sua musa:

“Por Quem Sonha Ana Maria?

Na alameda da poesia
chora rimas o luar
Madrugada e Ana Maria
sonha sonhos cor do mar.
Por quem sonha Ana Maria
nessa noite de luar?… “

Foi nessa época que Juca compôs a modinha “Presidente Bossa Nova” uma sátira inspirada no presidente Juscelino Kubitschek que foi gravada em 1961:

“Presidente Bossa Nova

Bossa nova mesmo é ser presidente
desta terra descoberta por Cabral
Para tanto basta ser, tão simplesmente,
simpático, risonho, original,
depois desfrutar da maravilha
de ser presidente do Brasil…”

A música ficou mais famosa depois que foi proibida pela censura.

Com um mandado de segurança, ele ganhou pela primeira vez, no Brasil, uma questão judicial com a censura.

Alguns dias depois, Juca conseguiu uma entrevista com o presidente e compareceu descalço ao encontro.

Daí para frente, diversas sátiras foram feitas com políticos, homens da sociedade, problemas urbanos etc., que continuavam incomodando muita gente.

Em 1962, Juca lançou a sátira “Caixinha Obrigado”, quando insistia em falar nas mazelas político – administrativas da época. A música causou polêmica e o autor teve que retirar da letra o nome de uma deputada.

“Caixinha, Obrigado

A mediocridade é um fato consumado
na sociedade
onde o ar é depravado.
Marido rico, burguesão despreocupado
que foi casado
com mulher burra, mas bela
o filho dela é político ou tarado.
Caixinha… obrigado!…”

Em 1963, Juca partiu para a Europa. Esteve em Portugal onde se consagrou como ídolo dos jovens.

Na Itália, começou tocando órgão numa igreja. Pouco depois estava tocando em cabarés. Apresentou-se na televisão e gravou oito compactos e um LP.

A música “Pequena Marcha Para um Grande Amor” foi um sucesso de vendas. Em 1969, retornou ao Brasil e começou a fazer shows pelo país.

“Pequena Marcha Para Um Grande Amor

A lua vai dormir encabulada
na passarela da madrugada.
Meus olhos vão sonhar sob a janela
dos olhos dela, dos olhos dela.
Meu amor de amor se esconde
se esconde aonde
o teu não vê
não vê porque
Meu amor não é segredo
morre de medo
do segredo
que é você.”

Juca criou o “Circus Sdruws” (S de snob, D de divino Dener, R de ralé, U de wonderful, W de Water-closed e S de souvenir), que instalou no Rio de Janeiro nas proximidades da Lagoa Rodrigo de Freitas, onde apresentava o show “Menestrel Maldito”.

O humorista costumava contar a seguinte história sobre o Sdruws, perto do qual ficava uma favela.

Juca convidara para o circo políticos, empresários e também pessoal da alta-sociedade carioca, e antes da primeira apresentação resolveu reunir os líderes da favela para lhes falar com franqueza, indo direto ao assunto: “Vim aqui para saber como vai ficar o negócio do roubo!” – Uma mulher baixinha, morena, (líder da favela), foi logo respondendo com firmeza: “Olha aqui seu Juca, nós entendemos a sua preocupação e lhe agradecemos pela sinceridade, mas pode o senhor ficar tranquilo, porque a nossa comunidade já se garantiu, e pediu proteção à polícia!”.

Juca foi um crítico da Ditadura Militar, da grande imprensa e do próprio mercado fonográfico. Chegou a ser exilado em Portugal na década de 1970, mas, ao incomodar o regime ditatorial vigente no País com suas sátiras, que ganhavam espaço nas rádios e televisão locais, transferiu-se para a Itália.

De volta ao Brasil, apresentou programas de televisão. Na década de 1980, lançou sua gravadora independente, a Sdruws Records. O bordão mais famoso do “menestrel”, como gostava de ser chamado, era: “Vá ao meu show e ajude o Juquinha a comprar o seu caviar”.

Em 2003, outro sucesso de Juca Chaves nos anos 70 – a canção “Take me Back to Piauí” – foi editado na coletânea “Brazilian Beats Volume 4” da gravadora britânica Mr. Bongo, especializada em música popular brasileira.

Em 2006, lançou-se candidato a senador na Bahia pelo PSDC, ficando em 4º lugar, com 19.603 votos (0,35% do total). Suas propagandas em formato de poesias distinguiam-no dos demais candidatos.

Em 2015, lançou a música “Adeus em ritmo de Lava Jato“, referenciando as investigações de corrupção em curso na época e posicionando-se de forma crítica ao então governo do Partido dos Trabalhadores.

Juca Chaves residia na Bahia, com sua esposa Yara Chaves desde 1975 e teve duas filhas adotivas, Maria Morena e Maria Clara.

Juca Chaves faleceu em Salvador, Bahia, no dia 25 de março de 2023, em consequência de problemas respiratórios.

No ano de 2024, a canção “Take me Back to Piauí” foi tema de cena clássica do filme “Ainda estou aqui“, de Walter Salles, ganhador do Oscar de Melhor Filme Internacional. A música embala a família de Rubens e Eunice Paiva em uma dança envolvente, regada a risadas e coreografias, momentos antes do desaparecimento de Rubens e sua morte pela Ditadura Militar.

 

 

 

 

 

Violante Pimentel – Escritora
As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

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