DE LEGENDAS E DUBLAGENS –

Na minha vida como espectador e frequentador de salas de cinema, algumas vezes estive diante de situações como esta, nos guichês para compra de entradas. Ao informar a sessão que pretendo assistir, a pessoa que me atende indaga: “Olhe, senhor, este filme é legendado! Não é melhor escolher um dublado?”. Tenho certeza de que a pergunta tem a ver com a impressão causada pela minha pessoa. É que, pelo meu perfil, eu não teria para eles, os bilheteiros, condições para ver um filme que careça de leitura das legendas; que o dublado é mais fácil e confortável para mim, frágil e despreparado velhinho, procurando distrair-me, sem a preocupação com uma atividade enfadonha e desnecessária. Mas respondo que não importa, quero mesmo, faço questão e prefiro ver o filme legendado. Eu entendo que a preferência por filmes estrangeiros com o som original não representa – como disse um amigo – descaso com a língua portuguesa. É, em última análise, uma demonstração de acatamento e respeito pela integridade de uma obra artística.

Assistir a filmes na sua versão original vem desde o tempo em que não se pensava ou falava em dublagens e adaptações. Ainda como crianças, nos acostumamos com o hábito de tentar decifrar nos textos da tela o que diziam e pretendiam os personagens. A nossa compreensão da língua inglesa – a mais comum nos filmes da nossa preferência – era totalmente nula naquela época. Isso, porém, não nos incomodava, acostumados que éramos a diálogos – às vezes incompreensíveis – dos heróis e aventureiros, sua desenvoltura diante do perigo e seus amores pelas belas e meigas mocinhas. Por nossa conta, intitulávamos filmes e identificávamos atores, cujos nomes, lidos e pronunciados em português, obedeciam aos limites da nossa capacidade de interpretação e leitura. Se o cowboy Rocky Lane falava come on, para nós, o caubói Roquelane teria dito: caumone, ou calmone. Um rol de nomes aportuguesados, adaptados e consagrados circulava entre a garotada alheia e deliciada, e poucos – ou nenhum deles – eram referidos com a pronúncia do seu nome original. A meninada expectadora e aficionada era composta de crianças com pouco mais de oito ou dez anos, que já detinham alguma facilidade e segurança na leitura, fruto da influência dos Quadrinhos, dos livros de Monteiro Lobato, dos Contos de Fada e dos Folhetos de Cordel, que eram cultura e diversão na época em que só as obras de ficção científica poderiam prever a explosão da parafernália eletrônica que hoje preenche o tempo e o interesse da petizada.

No Brasil, existe uma tendência crescente para serem utilizadas cada vez mais dublagens nos cinemas. O que era comum apenas na televisão, está se tornando habitual, nos fazendo imaginar que em um futuro próximo teremos a maioria das películas versadas assim para a nossa língua. Não vejo muitos filmes na TV aberta, principalmente pela má qualidade das versões, e nas salas gostaria de permanecer fiel aos filmes com legendas, pelo menos enquanto eu tiver disposição e energia visual suficientes. Na televisão, limito-me a ver algumas das conhecidas sitcoms humorísticas, como eram The Nanny, Mad About You, Two and a Half Man, que já estão fora do ar, e outra, ainda em exibição, a inteligente e hilariante The Big Bang Theory. Todas estas, entre outras características técnicas e artísticas, têm som original e são legendadas. O único que preferia ver dublado era o simpático seriado mexicano Chaves, cujos roteiros ingênuos e despretensiosos eram encenados com extrema competência por atores experientes, com notável tempo de comédia. As vozes da versão original, porém, não me agradaram, talvez porque eu tenha conhecido primeiro as dublagens em português.

 

 

 

 

 

Alberto da Hora – escritor, cordelista, músico, cantor e regente de corais

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