A Câmara dos Deputados concluiu no início da madrugada desta quinta-feira (11) a votação em primeiro turno da proposta de emenda à Constituição (PEC) que viabiliza a retomada do auxílio emergencial e prevê mecanismos em caso de descumprimento do teto de gastos públicos, a chamada PEC Emergencial. O texto aprovado eliminou dispositivos que impediriam as progressões e promoções de servidores públicos.
Segundo o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), o acordo tem impacto de R$ 1,5 bilhão, mas é “aceitável” diante das contrapartidas previstas na proposta.
O texto ainda precisa ser votado em segundo turno, o que deve acontecer nesta quinta, às 10h. Inicialmente, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pretendia concluir a votação ainda nesta madrugada.
Em tese, como a Câmara somente suprimiu um trecho, sem fazer modificações, a expectativa é a de que, se aprovada em segundo turno, a matéria siga para promulgação. Técnicos da Casa ainda não analisaram, no entanto, se essa retirada de trecho impacta o conteúdo da PEC – o que causaria uma devolução do texto ao Senado.
O texto-base em primeiro turno já havia sido aprovado pelos deputados na madrugada, mas ainda faltava a análise de destaques – sugestões para alterar o conteúdo que são votadas em separado.
O relator do texto na Câmara, Daniel Freitas (PSL-SC), apresentou parecer igual ao texto aprovado pelos senadores.
Auxílio emergencial
A proposta não detalha valores, duração ou condições para o novo auxílio emergencial, que terão de ser definidos em outro texto.
Originalmente, a PEC previa apenas a adoção de medidas para conter as despesas públicas, mas os parlamentares resolveram incluir a questão do auxílio emergencial na mesma proposta – que já estava com a tramitação avançada –para agilizar a retomada do benefício.
A PEC flexibiliza regras fiscais para abrir espaço para a retomada do programa. Isso porque, pela proposta, a eventual retomada do auxílio não precisará ser submetida a limitações previstas no teto de gastos.
A proposta prevê protocolos de contenção de despesas públicas e uma série de medidas que podem ser adotadas em caso de descumprimento do teto de gastos, regra que limita o aumento dos gastos da União à inflação do ano anterior.
A PEC concede autorização para descumprimento das limitações somente para a União, tentando evitar maior deterioração das contas de estados e municípios.
O texto aprovado pela Câmara estipula ainda um limite para gastos fora do teto, no valor de R$ 44 bilhões, para custeio do novo auxílio.
Essa trava não é uma estimativa de quanto custará o programa, mas um teto de recursos para bancá-lo. O limite foi definido após parlamentares tentarem estender ao Bolsa Família a possibilidade de extrapolar o teto.
Valor do auxílio em discussão
Nesta segunda (8), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o novo auxílio emergencial deve ficar entre R$ 175 e R$ 375.
Em uma transmissão pela internet na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro disse que o auxílio emergencial deverá ser retomado ainda no mês de março, com duração de quatro meses, como mostra o vídeo abaixo.
A equipe econômica do governo já defendeu o valor de R$ 200, mas parlamentares propõem pelo menos R$ 300.
O governo também quer reduzir a quantidade de beneficiários à metade, concedendo o auxílio a cerca de 32 milhões de brasileiros.
Mecanismos
O objetivo central da PEC é criar mecanismos que estabilizem as contas públicas. Atualmente, esse trabalho é feito por dois dispositivos já em vigor:
- a regra de ouro, que proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes, como salários, benefícios de aposentadoria, contas de luz e outros custeios da máquina pública;
- o teto de gastos, que limita os gastos da União à inflação do ano anterior.
Segundo a PEC Emergencial, quando a União estiver prestes a descumprir a regra de ouro ou a romper o teto, medidas de contenção de gastos serão adotadas automaticamente.
Esses “gatilhos” serão acionados no momento em que as despesas atingirem um certo nível de descontrole. Se atingido com despesas obrigatórias o índice de 95% das despesas totais, o governo federal estará proibido de:
- conceder aumento de salário a servidores;
- contratar novos funcionários;
- criar bônus.
A PEC também prevê exceções. O reajuste das remunerações poderá acontecer se determinado por decisão judicial definitiva (transitada em julgado) ou se estiver previsto antes de a PEC começar a valer, por exemplo.
Pelo texto, as novas contratações só se darão para repor vagas e cargos de chefia, por exemplo, desde que não signifiquem aumento de despesa.
Acordo
A pressão de grupos de servidores quase levou a Câmara a retirar esses gatilhos da PEC, como sugerido em um destaque apresentado pelo PT. O texto acabou mantido, mas por um placar apertado: 319 votos favoráveis (eram necessários 308) ante 181 contrários. Houve ainda 3 abstenções.
A manutenção exigiu articulação intensa no plenário. Presidente da Câmara, Arthur Lira deixou que o processo de votação se prolongasse por quase duas horas. A estratégia visava, nesse meio tempo, a fechar um acordo para convencer mais deputados a votarem contra o destaque do PT.
A saída costurada pelo relator da matéria, deputado Daniel Freitas (PSL-SC), foi a manutenção do trecho em troca da supressão de dispositivos que impediriam as progressões e promoções de todas as categorias. A medida foi para atender a uma demanda dos profissionais da segurança pública.
Segundo o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), o acordo tem impacto de R$ 1,5 bilhão, mas é “aceitável” diante das contrapartidas previstas na proposta.
Receita Federal
Durante a votação dos destaques – sugestões de alteração no texto –, os deputados aprovaram a retirada de um dispositivo que proibia a vinculação de receita pública a órgãos, despesas e fundos, com exceção dos citados no projeto, como o Fundo Nacional de Segurança Pública.
No entanto, o texto abria espaço para desvinculação de recursos destinados à realização de atividades da administração tributária e atingiria a Receita Federal, o que provocou protestos de auditores fiscais. A categoria viu o movimento como uma tentativa de fragilizar o órgão e os Fiscos estaduais e municipais.
Segundo a oposição, o Fundo Social (FS), das Telecomunicações (FUST), do Meio Ambiente (FNMA) e da Mudança do Clima (FNMC) também ficariam sem recursos vinculados e poderiam ser extintos.
Com o destaque aprovado, ficou mantida a redação atual da Constituição, que permite a vinculação dos recursos para esses fins.
Outros pontos
A PEC também prevê que:
- Caso as despesas representem 95% das receitas, governos estaduais e municipais poderão optar pelas medidas, mas os gatilhos serão adotados de forma separada pelos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Se os entes não implementarem o pacote de restrições para conter gastos, sofrerão sanções;
- A União não poderá servir como fiadora de empréstimo para um estado que se recusar a disparar os gatilhos de austeridade;
- Para a União, os gatilhos também serão acionados em caso de decreto de calamidade pública;
- No caso de calamidade, os estados e municípios poderão acionar os gatilhos. Caso não adotem as medidas, sofrerão sanções, como a proibição de contratação de empréstimos tendo a União como fiadora.
Incentivos fiscais
O texto diz que, em até seis meses após a entrada da PEC em vigor, o Executivo encaminhará ao Congresso plano de redução gradual de incentivos e benefícios federais de natureza tributária.
Não entrarão nesse plano, segundo a proposta, incentivos a zonas francas, instituições de filantropia, fundos constitucionais, cestas básicas e bolsas de estudos para estudantes de cursos superiores.
