LUÍS GOMES SALES (MACEIRA): Bem, pelo nome ninguém conhece ou se lembra dessa figura popular de Macaíba dos anos cinquenta, sessenta. Atendia pelo apelido de Maceira, o homem do choque irreprimível. Sofria de um distúrbio neurológico que o condicionava, a cada cinco minutos, incontrolavelmente, detonar um espasmo que o fazia levar a mão direita a boca, ao umbigo e a genitália com um dito final curioso: “Cêta!!”. Em Macaíba trabalhava pra Leonel Mesquita, fazendeiro, agropecuarista e político. Maceira é quem dava os recados do “major”, transportava encomendas, etc. Era o office-boy desajeitado mas útil. Certa manha, Maceira foi incumbido de levar um cartão de Leonel ao Juiz de Direito da Comarca doutor Alcebiades Fernandes e Silva. “Basta entregar em mão e venha embora”, recomendou Leonel. Cartório cheio, audiência em andamento com juiz, promotora, tabelião, testemunhas, etc. Chega Maceira, cartório à dentro interrompendo: “Dôtor, “Cêta”, meu padrinho mandou essa “cêta, carta pro senhor!”. O doutor Alcebiades e a promotora que não conheciam as facetas do mensageiro, julgando falta de respeito, deram-lhe ordem de prisão, imediatamente, a qual, somente foi contornada, à muito custo, graças a intervenção do tabelião Geraldo Pinheiro que explicou a doença de Maceira e o seu pornofônico choque irreprimível.

LÚCIA ARAÚJO – era uma funcionária da prefeitura de Macaíba. Amiga de infância, Lúcia, tornou-se popular na cidade por ser muito prestativa nas “outras atividades” ligadas a igreja católica, ao cartório localizado na parte baixa da cidade e a delegacia de polícia local que ficava no alto do Conjunto Alfredo Mesquita. Gostava de “advogar” problemas e queixas junto a delegacia onde desfrutava de prestigio incomum. Portava uma pasta com papeladas difusas e profusas sobre as questões da periferia macaibense. Assisti, em várias ocasiões o atendimento a sua clientela na minha casa com aquele fraseado cartorial: “O seu processo sobe hoje para a delegacia e amanhã desce para o cartório!!”, sentenciava Lúcia didaticamente. De pequena estatura, voz rouca proveniente do vício de fumar, ela tinha um apelido que detestava ouvir: “Lúcia Pitôco”. Mantinha com o desportista José Felix Barbosa uma rusga antiga e nunca curada. Um dia, foi designada a servir na Secretaria de Esportes, onde reinava Felix. Este ao vê-la entrar na repartição, exigiu: “Dona Lúcia, aqui está o livro de ponto”. A funcionária encrespou-se, pegou a sua pasta indefectível e arrematou à queima roupa: “Não assino ponto que não sou de xangô, nem tenho chefe que não sou índia”. Escafedeu-se e nunca mais voltou. Politicamente sempre foi minha correligionária, a começar dos seus pais Luiz Cassimiro de Araújo e Luzanira Lima de Araújo, residentes à rua do Pernambuquinho, em Macaíba. Criou os seus filhos e educou-os. Será lembrada pela maneira extrovertida de ser, fiel às amizades e as inimizades também. Um tipo popular inesquecível.

MARIA CABRAL – Morena, magra, cabelos longos, vestia-se de preto em sinal de protesto pelas coisas ao seu redor que sempre reprovava. Fazia discursos intermináveis praguejando contra a ordem constitucional dos seres e costumes. Com uma rosa vermelha presa aos cabelos, caminhando sempre pelo meio da rua, dava-nos a impressão de uma “Diana” perdida ou bêbada de um pastoril imaginário. Ai de quem dissesse: “Vai trabalhar Maria Cabral”. Despachava uma verdadeira cascata de impropérios que atingia até a 3ª geração do xingador. Morreu há cerca de cinquenta anos e com ela os seus mistérios, pois não se vê mais dessas Marias como antigamente.

SEBASTIÃO MELO foi um dos maiores seresteiros de Macaíba. Boêmio das madrugadas, o seu violão era patrimônio sentimental da cidade. Aniversários, casamentos, batizados ou simples reuniões pelos bares da vida lá estavam a sua voz e o violão interpretando Orlando Silva, Chico Alves, Nelson Gonçalves ou Silvio Caldas. Numa dessas noites, Sebastião pagou pelo excesso e adormeceu, alta madrugada, no batente da rua do comércio (hoje Nair Mesquita). O novo delegado de Macaíba, tenente José Medeiros, exigente e autoritário, patrulhava as ruas em traje civil, armado de um cipó de brocha. Ao se deparar com o seresteiro dormindo bateu-lhe levemente com o cipó. “Acorda!”. Sebastião, fora de si, boceja e desperta. “E o violão?”, pergunta o delegado. “Toco”, responde o boêmio. “Acompanhe-me”, responde ríspido o militar. Segurando o violão, Sebastião foi solícito: “Me dê o tom!”. Mal sabia o próprio que o perigo esta no tom. Foi pro xadrez.

Valério Mesquita, escritor e presidente do IHGRN – Mesquita.valerio@gmail.com

 

Ponto de Vista

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