A SOMA DE TODOS OS MEDOS – Valério Mesquita

A SOMA DE TODOS OS MEDOS –

“A morte é hedionda e a vida também”. Nesta frase de Marguerite de Yourcenar em “Memórias de Adriano”, perpasso o drama que vive Macaíba, minha terra, onde a juventude sem rumo da periferia está sendo dizimada pela droga. Toda semana, tomba no asfalto – como carcaça de animal no abatedouro – um adolescente.

Na sexta-feira passada (02), ocorreram seis homicídios num intervalo de poucas horas. Foram dois homicídios no centro da cidade, onde é realizada a feira. Outros dois no bairro Campo das Mangueiras e o quinto no Loteamento Esperança. Numa região próxima, ao tentar entrar em casa, mais um jovem foi alvejado na cabeça e veio a óbito. Outras duas pessoas foram baleadas e sobreviveram ao atentado.

Como cidadão macaibense, quer queiram ou não, toma conta de mim o sentimento da dor de pai. Os bairros da cidade: Campo das Mangueiras, Alto do Vilar, Araçá, Alto da Raiz, rua do Fio, Alto do Ferreiro Torto e outros tantos ferrados pelo cartel, a tragédia virou rotina e impunidade.

Semanalmente, ocorrem tiroteios dignos das favelas do Rio de Janeiro. As vítimas, como de costume, são jovens. À noite, as ruas são tristes e desertas. As praças que pertencem ao povo, às famílias, hoje desabitadas, delas se apoderaram os traficantes como esconderijos prediletos. Os reforços e os esforços da polícia local não têm sido suficientes. Macaíba detém uma 3a. Companhia da Polícia Militar, além de uma delegacia civil, mas falta o padrão Fifa, entende? Elas não foram implantadas apenas para recolherem cadáveres e digitarem boletins de ocorrências! A população indefesa não vê muito interesse e empenho das autoridades municipais no sentido de enfrentar o problema. Pesa nas pálpebras da segurança pública de Macaíba o grude da indiferença.

Vejo a terra das minhas raízes perigosamente perdida e sem rumo. A cidade geme sob o peso dos escombros das más administrações passadas. Além de haver perdido muito de sua alma, ela e seus habitantes, são meros e casuais transeuntes inúteis, sem proteção e sem guarida. Quando revejo Macaíba, não me revejo mais, tal a promiscuidade e o abandono a que foi relegada.

O tráfico está migrando de Natal para essas cercanias. A droga está no quintal, à sombra das bananeiras, debaixo dos coqueirais. As manhãs, tardes e noites, as ruas e calçadas são tingidas de sangue de jovens vítimas da impunidade. Os costumes se barbarizaram. O sangue dos conterrâneos está contaminado pelo vício e pela mentira social da burocracia. É tempo de curar os cortes desfechados na carne do tecido comunitário. Os adolescentes não são escória, mas estrutura, promessa, futuro, classe social, mão de obra e ser humano. O jovem tomba inerte em Macaíba porque os governos não amparam, nem protegem. Os que me entenderam, leiam e reflitam.

 

 

 

 

 

 

Valério Mesquita – Escritor, Membro da Academia Macaibense de Letras, Academia Norte-Riograndense de letras e do Conselho Estadual de Cultura  e do IHGRN– mesquita.valerio@gmail.com

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