VIRAMUNDO 30 –
Marivaldo Ornelas era um camarada tímido e adorava música. Música de qualidade, não esses forrobodós que existem por aí. Todo fim de semana ia pros botecos onde neguinho cantava samba, canção, boleros e outros bichos. Ele sentava numa mesa de canto, quase imperceptível e ficava fazendo anotações, ou composições.
O lugar era muito frequentado e tinha aqueles compositores natos que negociavam suas criações.
– Doutor ouça essa minha composição. Tô vendendo por cem merreis. Se o senhor gostar, é sua.
Pessoas humildes, simples e de boa criatividade, produziam pérolas e eles conheciam o Marivaldo. Sabiam que ele era um compositor que comprava letras, até mesmo arranjos musicais e registrava coo sendo dele.
Emplacava, de vez em quando, um sucesso na voz de alguns cantores famosos.
Aí ele começou a cantar suas próprias musicas. Uma voz diferente que ficou como marca registrada.
E tome comprar musica dos pobres coitados que vendiam suas composições pra comer, pagar aluguel do barraco que morava, enfim, vivia disso. De vez em quando ele fazia parceria e registrava a música como sendo deles dois. Uma colher de chá.
– Mariva, vai ter um festival de música e podemos nos inscrever. Vamos nessa?
– Bora Catolé.
Os dois, Mariva e Catolé, ganharam o festival com Mariva cantando com banda e tudo. Uma festa que o lançou nacionalmente. Ganharam dinheiro mas a maior parte da grana ficou com Mariva. Catolé, não tinha a mesma presença musical, recebeu uma merreca, mas ficou feliz. O lançamento do primeiro disco teve o seguinte título: MARIVALDO E SUAS CANÇÕES. um sucesso. A capa era uma foto de rosto com aquele sorriso dos vencedores.
Mariva comprou um apartamento em Ipanema e logo se cercou de mulheres e homens também. Bebedeiras mil, mas continuou comprando composições de pessoas humildes frequentadores dos botecos da vida. Era assim que ele ganhava a vida.
– Seu Mariva, tô sabendo que boa parte dessas suas músicas são de outros compositores, que o senhor comprou. É verdade? – Nada, são parcerias, mas a maioria é minha mesmo.
– Mesmo aquelas que o senhor compõe como se fosse uma mulher?
– Sim, aí é que entra a minha sensibilidade de amante que conhece mulher.
Marivaldo se tornou famoso e rico. Como gostava de futebol, comprou uma casa no Realengo e mandou construir um campinho de futebol onde jogava com os amigos nos fins de semana. A vida que pediu a Deus. Casou e descasou centena de vezes. Parou de gravar e escreveu dois livros que foram bem vendidos. Depois parou de escrever também e foi ser comunista e ateu. Hoje mora em Paris, como todo comunista bem sucedido na vida.
Encontrei Mariva jantando na Torre Eiffel e perguntei: – Marivaldo quem é seu ídolo?
– Chico Buarque de Holanda
Jaécio Carlos – Produtor e apresentador dos programas Café da Tarde e Tribuna Livre, para Youtube.
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