Meu amigo Tomaz Edson é um engenheiro em permanente busca por uma vida saudável. Não o reputo hipocondríaco, embora o excesso de zelo com a saúde lembre alguém portador da mania. Em sua última estada em Portugal, ele viajou sentindo uma persistente dor no estômago. Bastaram poucos dias em Lisboa para o incômodo desaparecer sem que ele identificasse a causa do mal nem o motivo da cura.

Acontece de a tapioca, iguaria tipicamente brasileira de origem indígena tupi-guarani, feita com a fécula extraída da mandioca ser, no momento, a mais nova sensação na gastronomia lusitana. A comida caiu no gosto do português ao ponto de gerar uma febre de tapiocarias em diferentes bairros de Lisboa.

Foi num programa de televisão local que debatia a iguaria brasileira, onde Tomaz supôs encontrar o motivo da mazela que o acometeu. Ao entrevistarem um coloproctologista da terra surgiu questionamento acerca dos efeitos da tapioca no intestino humano. Assim respondeu o dito especialista: “Esse produto é letal, pois contém cianeto”. Eureka! A tapioca fazia parte da dieta de Tomaz Edson, no Brasil.

A mandioca contém o ácido cianídrico, que é transformado em cianeto, um veneno mortífero para nós humanos. Ataca células nervosas, causa danos nas funções dos pulmões e dos rins e, sobremaneira, no sistema digestivo. Devido ao poder letal é o escolhido para execuções nas câmaras de gás.

A tapioca ou goma de mandioca hidratada, é um alimento secular na gastronomia brasileira. Iguaria difícil de ser abolida, sem mais nem menos, da mesa do nordestino. Por outro lado, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), em 2016, o câncer de estômago nos homens foi o segundo tipo mais frequente nas Regiões Norte e Nordeste do país.

O professor Raimundo Nascimento da Universidade do Amazonas (UFAM) é um preocupado com a manufatura adequada da tapioca. É dele este alerta: “Quando se compra a goma para o preparo da tapioca, a pessoa não sabe como ela foi preparada. Se quem vendeu a goma retirou apenas a película, induz o consumidor a ingerir o ácido cianídrico. É necessário retirar toda a casca, que representa, aproximadamente, 10% da fécula”.

E complementa o estudioso do assunto: “A cotia – mamífero roedor que vive nas matas e capoeiras -, já ensinou isso para as pessoas. Ela retira toda a casca e come somente a batata”.

Chegando em Natal, Tomaz procurou a ANVISA atrás de respostas para tranquilizá-lo. Descobriu não existir nenhum tipo de controle sobre a industrialização do produto. Apavorado, eliminou a tapioca do cardápio.

Em recente viagem a Recife, no hotel onde nos hospedamos serviam tapiocas feitas na hora. Ao ver o “absurdo” ele saiu da sala, procurou o gerente e deu-lhe a seguinte sugestão: “Entre na internet e digite estas três palavras: mandioca, tapioca e cianeto”. Coincidência ou não, no outro dia não ofereceram tapioca no desjejum. Ao fechar a conta o tal gerente lhe falou: “Fiquei estarrecido com o que li!”.

Esta semana Tomaz me mostrou a seguinte notícia veiculada num jornal de Caracas: “Alerta en Venezuela por cinco muertes causadas por yuca amarga”. Yuca é a nossa mandioca, tubérculo com o qual é feito a tapioca.

Acho um exagero o temor do amigo, mas, pelo sim pelo não, em vez de consumir duas tapiocas no café da manhã, agora só me atrevo a comer uma.

José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro civil e escritor – jnsousa29@gmail.com

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Ponto de Vista

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  • O cianureto é encontrado na natureza em diversas plantas, como nas sementes lenhosas de algumas frutas, e em uma variedade da mandioca, vulgarmente chamada de mandioca-brava: uma planta sul-americana altamente tóxica quando in natura, mas sua raiz é muito consumida e apreciada na forma de farinha torrada, quando perde suas toxinas.

    • Aqui no RS sempre consumimos mandioca, ou aipim, sem maiores problemas. Ultimamente a tapioca também está sendo usada e apreciada, sem restrições. Instalada a polêmica sobre os perigos da tapioca e , consequentemente , da sua matéria prima, que a mandioca ou aipim, gostaria de saber como, simplesmente pela "aparência física", ou in natura, podemos distinguir a que é de mesa daquela denominada brava, que, ao que parece, é a vilã da história???

  • Os indios podem até não saber o nome, mas sabem, desde sempre que a mandioca tem um elemento venenoso. Eu não sei onde retiram apenas a película da mandioca durante a manipulação, eu vi minha família trabalhar com isso e sei que toda casca é descartada e nada da mandioca pode ser consumido cru.

  • DISCORDO DESTE CIDADÃO,
    Que ha cianeto na mandioca sim, só que o processo de retirada desta substancia é onde está o perigo pois, vai depender da lavagem da massa, ela precisa ser lavada por várias vezes até ficar só a goma a qual pode -se fazer sem nenhuma restrição. O problema está em pessoas sem o conhecimento prévio para manusear na extração da fécula da massa da mandioca.... Surgiro ao cidadão que se aprofunde mais no conhecimento dessa iguaria tão rica em vitaminas e sais minerais.

  • Que absurdo!! Quem já viu a extração da tapioca, sabe que os antigos nem eram químicos mas sabiam do perigo, muitas vidas foram sacrificadas para chegarem ao ponto certo do pó de tapioca para o consumo!! Assim como o tacacá e todos os derivados da "mandioca brava"!! Muitas pessoas brasileiras e até estrangeiros, sabem disso!! Tem que haver controle por partes dos órgãos fiscalizadores SIM - inclusive nos países onde a tapioca é só um produto estrangeiro industrializado, já que se externalizou este consumo; mas em contrapartida isso tudo é uma consequência do modismo exacerbado nos dias de hoje!! Produção sem controle pra suprir o mercado
    CONSUMISTA que quer vender saúde a qualquer preço!!!
    Deus onde vamos parar!! Se chega errado AQUI EM PORTUGAL e as pessoas inclusive aqui não fiscalizam, parece que "soa" como algo que é feito proposital!! Não é!! Tem que ter cuidado a manifestar posicionamentos porque pode provocar a queda da produção de povos que sobrevivem deste mercado para consumo local no Brasil. Eu conheço muitos.
    Este médico que fez este comentário "desinformação" com certeza desconhece que no Brasil, especialmente no Pará, muitas pessoas consomem e não têm problema algum!!
    Querem comer e sequer procuram saber onde foi feito ou como?!?
    As tapiocas que encontrei na Europa nos supermercados eram todas rotuladas, que infelicidade acontecer isto da forma como foi informado!! Claro que o excesso deve fazer mal, como todo excesso de qualquer produto!!
    Meu Deus onde vamos parar?!?!?!!!!

  • O ácido cianídrico está presente em toda a mandioca, inclusive nas folhas, os antigos habitantes de Pindorama, entretanto, descobriram como domesticá-la, extraindo-lhe a parte líquida, "a Manipueira", da polpa, que contém o ácido em teores elevados. Extraíam-no através do "Tipiti", instrumento rudimentar e muito eficaz de prensagem. O resultante, ou seja, a massa, era então torrada, retirando-se qualquer umidade (ácido cianídrico) que permanecesse na massa, transformando-a em goma (fécula) e farinha, todos isentos de quaisquer resíduos do famigerado ácido e, portanto, completamente inócuos. Esse tipo de matéria, sem nenhum embasamento científico, representa um grande desserviço à população e prejuízo a algum incauto, crédulo e ingênuo leitor. Seria bom que você fizesse um adendo à matéria, informando que não há "veneno" algum, nem perigo algum no consumo da secular iguaria "Tapioca". Cumprimentos.

  • Que estranha esta notícia! Se a tapioca pode matar penso, todos os alimentos feitos com polvilho doce de mandioca também poderiam matar: pão de queijo, biscoito de polvilho, sequilhos etc. Que eu saiba só há uma espécie de mandioca que contém Ácido Cianídrico. No nordeste é conhecida como " mandioca brava". Este tipo de mandioca é usado na produção de farinha de mandioca. O processamento retira ou inativa o acido cianídrico. Já vi crianças intoxicadas após a ingestão desta espécie de mandioca "in natura", mas nunca ouvi falar de alguém que tenha sido intoxicado pela ingestão de farinha de mandioca.

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