José Narcelio Marques Sousa

Eu visitei o Rio de Janeiro pela primeira vez, em 1968, ainda estudante universitário. A cidade enfeitiçou-me. Depois de formado, matriculei-me num curso de pós-graduação e vivi o Rio durante um ano. Concluídas as incursões turísticas tradicionais, enveredei por localidades que cariocas escondem, malandramente, da curiosidade de estranhos ao meio, a fim de preservar o ambiente somente para eles.

Familiarizado com a cidade, me propus explorar o interior do estado. Em primeiro lugar Niterói, Paquetá e a Região dos Lagos dando prioridade a Cabo Frio e Búzios, este último por lembrar Brigitte Bardot. Em seguida, a Região Serrana visitando Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo. Faltava excursionar pelo Sul Fluminense.

Retornei ao Rio inúmeras vezes, entretanto, nunca consegui concretizar aquela derradeira visita, porque sempre algum imprevisto obstaculizava o intento. Cheguei a visitar Angra dos Reis, mas faltava conhecer Paraty.

Em 2013, finalmente, viabilizei a ansiada viagem. Apenas um final de semana, mas, o suficiente para escarafunchar o Centro Histórico daquele patrimônio nacional. Éramos quatro: eu e minha mulher Edilza, ciceroneados por Raissa – sobrinha da esposa estabelecida no Rio – e, Silvinha, uma amiga carioca.

Chegamos a Paraty ao meio-dia da sexta-feira. Deixamos as malas na pousada e pé no mundo. Era setembro e sem qualquer festival programado, portanto, um período tranquilo para caminhar pela cidade. Durante a tarde conhecemos os pontos icônicos do local, já emendando na programação noturna. Uma beleza!

Por volta das dez da manhã do sábado, deixamos a pousada e fomos à praça onde está localizada a Igreja Matriz N. S. dos Remédios, para um circuito de charrete. A primeira que avistamos, fechamos com o condutor-guia o preço do passeio.

Com todos acomodados no rudimentar veículo, eu perguntei: “Qual o seu nome, jovem?” – um rapaz beirando 25 anos de idade. “Juvenal!” – respondeu ele. “E o do cavalo?” – um belo espécime bretão. “Sa…são!” – falou Juvenal sussurrando. “Como é mesmo?” – insisti. E ele continuou com um “Sa…são!” nada audível.

Juvenal não era fanho nem gago, pois conversáramos minutos atrás. “Desculpe-me, mas não entendi o nome do animal. Você pode repetir num tom mais alto?”. Ele angustiado falou: “Sansão!”. Ato contínuo, o cavalo deixou escapulir uma bolota de esterco que pousou num saco plástico aberto e amarrado nos dois suportes de madeira atrelados ao animal para tracionar a charrete. Procedimento esse, em obediência a exigência da prefeitura para não sujar as ruas do Centro Histórico.

“Bonito nome. Vamos lá, Sansão!” – falei incentivando o animal. E Sansão retribuiu ao estímulo deixando escapulir duas bolotas de esterco, para desespero de Juvenal. Então percebi existir algum reflexo condicionado que motivava o animal a defecar ao ouvir o som de seu nome. Era a deixa que eu precisava. “Há quanto tempo você possui Sansão?”, “Qual a idade de Sansão?”, “Sansão já cobriu alguma égua?”, não parei de fazer perguntas, enquanto Sansão cagava adoidado.

O coitado do Juvenal vendo o saco abarrotado de bosta, mas sem querer admoestar o cliente, acelerou com chicotadas o passo do cavalo para terminar logo o circuito. Há muito deixara de ser guia, preocupado com a trabalheira que teria caso o saco rompesse ante o volume fecal produzido por Sansão.

Concluído o passeio, agradeci a Juvenal e dei-lhe boa gorjeta para minorar seu mau-humor. Enquanto as mulheres se afastavam, eu me aproximei do cavalo, alisei sua cabeça e com o mesmo propósito de antes falei: “Até breve, Sansão!”.

As mulheres, que antes antipatizaram Juvenal, depois de explicado o ocorrido, condenaram-me pela maldade, embora se esbaldando de tanto rir.

José Narcelio Marques Sousa é engenheiro civiljnsousa29@gmail.com

Ponto de Vista

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