DETESTO MEU NOME –

 Em algum momento da vida já nos deparamos ou iremos nos deparar com alguém insatisfeito com o próprio nome ou sobrenome. Trata-se de uma manifestação de desagrado decorrente de ato inteiramente alheio à vontade do reclamante, pois resulta de decisão de exclusiva responsabilidade dos pais diante da pia batismal ou de um balcão de cartório de Registro Civil.

Impõe-se ao cidadão, no seu nascimento, tamanho constrangimento anunciado prematuramente que lhe deveria ser facultado ou facilitado o direito, mesmo na mais tenra idade, de mudança do nome civil se assim desejasse.

São tantos os exemplos de extravagâncias perpetradas pelos pais, quando do batismo de indefesos recém-nascidos, que tratados e mais tratados poderiam ser escritos sobre os casos. Assim como serem analisadas as causas e consequências de tais absurdos por estudiosos em ortografia etimológica.

Na minha epopeia de engenheiro rodoviário, conheci um servidor público deslumbrado com os nomes de pronúncias complexas estampados nas laterais das máquinas de terraplenagem no órgão em que ele trabalhava. Eram as logomarcas dos fabricantes dos equipamentos pesados. Não fez por menos o ditoso funcionário, tascou nos três filhos que gerou os prenomes Huber Warco, Michigan e Caterpillar.

Uma vez ou outra, vira epidemia no país registrar filhos com nomes estranhos ao nosso vocabulário. De acordo com o ídolo ou devaneio dos pais, surgem verdadeiras aberrações linguísticas lançadas nos costados dos desamparados filhos. Se existe tanto fervor em homenagear alguém, por que não modificar o próprio nome em vez de agredir um cristão completamente ignorante do mal que lhe estão fazendo?

Uma minha cunhada pediatra, residente em Brasília, quando na ativa prática da Medicina, vingava-se desses devaneios impostos aos rebentos de forma inusitada. Ao verificar a ficha da criança e ver um agressivo nome estrangeiro, chamava o paciente dizendo: “Davide! É a sua vez de ser atendido”.

Comumente era corrigida pela mãe zelosa: “É David, doutora”. Ao que a cunhada retrucava: “Eu só entendo português. Aqui está escrito Davide”. Enquanto isso David ouvia, sem entender, o seu nome sendo aportuguesado. O mesmo ocorria com os Michael, Malcolm, Melanie, Dylan ou Tiffany que surgissem pela frente.

Um colega contou-me da existência de um certo Winston Churchill, em Pernambuco. Churchill, um garoto negro morador em favela num subúrbio de Recife, era um excelente jogador de futebol. Nas peladas que disputava no campinho da várzea, toda vez que tocava na bola alguém gritava: “Passa a bola, nêgo Xuxa!”. E por Xuxa, e não por Churchill, ficou conhecido o cidadão.

Nabucodonosor, um meu colega de profissão e dileto amigo, somente superou o trauma do nome na meia-idade. Quando jovem, jogador exímio de ping-pong, ao comparecer a torneios do esporte nos ginásios de sua cidade natal, ao ouvir o seu nome convocado para alguma disputa, enfrentava o anúncio debaixo de apupos, gracejos e uma enorme carga de constrangimento.

Entretanto, o mais aterrador caso de meu conhecimento é o daquele indivíduo, fã ardoroso das atrizes de cinema Ava Gardner (norte-americana) e Gina Lollobrigida (italiana). Ao nascer a sua primeira e única filha denominou-a impiedosamente de Ava Gina.

Em tempo: agrada-me muito o nome que tenho.

 

José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro e Escritor

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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