ARTIGO: Ivenio Hermes

A LIÇÃO DA PIPA: UMA LIÇÃO VINDA DE DENTRO –

Uma das amarras que mais nos atam para ampliar nossas relações sociais é algo que insistimos em esconder: o preconceito. Talvez não percebamos, mas vivemos escolhendo nossas amizades pelo aspecto exterior das pessoas, quando o mais importante é percebermos o interior das pessoas.

A beleza exterior é passageira, hoje somos magros amanhã seremos gordos, hoje somos gordos amanhã seremos magros, hoje somos jovens amanhã, idosos, hoje somos considerados atraentes, mas amanhã, sob a ação inexorável do tempo com todas as suas intempéries, não sabemos como estaremos. Se nos ativermos à aparência externa, deixaremos de vislumbrar e valorizar as belezas das pessoas em suas diferentes idades, diferentes etnias, diferentes formas físicas, enfim, nos prenderemos a conceitos pré-definidos que tudo tem a ver com o preconceito, e não com o pensamento de que somos todos seres humanos, únicos e especiais dentro de cada esfera da vida.

Pensando em quanto é grande a tendência humana em não enxergar o conteúdo e dar mais importância ao exterior, a pipa pode nos trazer uma grande lição, não a pipa que é um brinquedo de papel ou de tecido que se lança ao vento, mas uma outra pipa, que é definida pelo dicionário Priberam[1] como uma vasilha grande, bojuda, de aduela, usada para guardar e envelhecer vinhos.

Por fora, poderia aparentar somente um barril desgastado, mas por dentro, contém a essência de algo muito apreciado, que ilustra o quanto seu lado interno pode representar nossas escolhas…

Cada ser humano é constituído por uma natureza única e especial, edificada ao longo do tempo pelo contato com outras pessoas, pelo convívio e pelo aprendizado que as relações humanas se encarregam que imprimir nas paredes de nossa essência imaterial na forma de uma obra de arte chamada caráter.

Visto pelo lado de fora apenas, somos uma pipa simples, desgastada ou não, conservada ou não, de diferentes cores, madeiras, estruturas de todo e qualquer material que seja necessário para nos tornar seres que andam, pensam, trabalham, sofrem… vivem!

Há uma pipa que fica localizada na ERS 235, km 10.5 em Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul. Dentro dela, pintada e encrustada em cada tábua, existe uma verdadeira obra de arte, de fato, é a maior arte gravada no interior de uma pipa. Quem passa pela estrada nas idas e vindas à Gramado e Canela, talvez nem perceba aquela bela e “experiente” pipa, que encerra em seu interior uma equação de vida única, em uma obra única e uma marca única, assim como cada um de nós, quando cada vivência nos torna únicos e especiais, essa pipa também é única e especial.

Assim como somos uma obra de arte resultante da interação com diversas pessoas, também devemos refletir sobre a contribuição que seremos na obra de arte da vida de outrem, onde mostramos quem realmente somos e qual o reflexo de nossa imagem terá sobre as pessoas com as quais convivemos.

Não adianta nada julgarmos as pessoas pelas aparências, por preconceitos, pois somente nos afastamos de possíveis contatos que ampliariam o que somos. O simples conceito de uma arte não se aprende nas escolas ou nas universidades, é preciso conhecer seu significado, conhecer o que seu conteúdo quer e pode nos transmitir, ninguém se torna essencialmente conhecido apenas pela sua imagem, é seu interior que fundamenta o que ela é, o que pode trazer de contribuição para outros, para sua comunidade, para o meio em que ela vive.

O interior da Pipa da Bina é um grande exemplo da diferença daquilo que somos por fora e daquilo que somos por dentro. As aparências nos levam a não despertar interesse necessário para conhecer outras pessoas, conhecimento esse que é basilar nas verdadeiras e sólidas relações. Primeiro precisamos nos interessar por cada semelhante, buscar conhecer e assim termos a mínima chance contribuir para que a grandiosidade da obra de arte que cada um de nós somos.

Vincit omnia veritas!

Ivenio Hermes – Escritor e pesquisador criminal

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores