1- Os adeptos do isolamento horizontal possuíam um forte argumento: salvar vidas em primeiro lugar; os estragos na economia se resolveriam depois. Portanto, “Fica em casa”.

Curiosamente, várias dessas pessoas apoiaram a manifestação da Gaviões da Fiel, na Av. Paulista, onde os participantes saíram de casa, desrespeitaram o distanciamento social e vários não usaram máscara.

Será que o mote “fica em casa” nada tinha de técnico e sim de político?

2- O DEM tomou uma boa medida ao expulsar de seus quadros Sara Winter. Não há lugar para fascista no jogo democrático.Todavia, chamou-me a atenção uma parte da nota redigida pelo seu presidente nacional, ACM Neto: “considerando que os Democratas repudiam veementemente quaisquer atos de violência e de menosprezo às instituições brasileiras”.

Ora, Rodrigo Maia e David Alcolumbre menosprezam diariamente nossas instituições políticas. Ambos sentam em cima de vários pedidos de impeachment, tanto do Presidente da República quanto de juízes do STF. Mais do que menosprezo, é um escárnio contra a vontade popular; mostra como a democracia representativa pode ser manipulada por líderes que estão mais preocupados com seus interesses políticos do que com o bem-estar geral da população.

3- Esperei alguns dias para rever as filmagens do confronto na Av. Paulista. De um lado, vi imagens de senhora em cadeira de rodas, crianças e pais de família com bandeira do Brasil. Salvo uma jovem com taco de baseball, corretamente detida pela PM, não vi manifestantes carregando pedras. Como tem sido o padrão das manifestações pró-Bolsonaro.

Do outro lado, jovens de físico avantajado, carregando pedras e avançando disciplinadamente e com aparente voz de comando. Representando o movimento ANTIFAS e a Gaviões da Fiel corintiana. Marchavam de um modo diferente do que estou acostumado a ver em torcidas organizadas.

A diretoria da Gaviões nutre simpatias por Lula. Ponto positivo político para este grupo, pois na incapacidade dos partidos de esquerda em mobilizar suas militâncias, deixaram a rua apenas para a “direita”.

A esquerda mostrou estar viva. Embora uma coisa seja um movimento político com o ANTIFAS; e outra, seja uma torcida organizada, pois há corintianos que apoiam Bolsonaro.
Seria a parte falando pelo todo. Belo caso de metonímia.

Exagero considerar os brutamontes como sendo terroristas. Não utilizaram uso de armas de fogo, bombas etc., não sequestraram ninguém, nem fizeram operações típicas de guerrilhas. Tudo muito amador.

Quando apareceram vestidos de preto e marchando, imediatamente lembrei-me dos “camisa negra” de Mussolini, da SS de Hitler, ou mesmo dos recentes black shirts tailandeses (esta é uma organização informal, no sentido de não pertencer ao Estado, tal como a Gavião).

Foi então que percebi estar olhando o grupo errado, pois o movimento se dizia “pró-democracia” e a ANTIFAS e Gaviões usaram métodos fascistas de manifestação.

4- Os manifestantes “antifas”, em Curitiba, tacaram pedra em bancos e no Fórum. Isto já deve ter rendido uns 200 mil votos (chute) para Bolsonaro, em 2020.

Depois, arrancaram a bandeira do Brasil que estava hasteada no Palácio do Iguaçu, sede do governo do Estado, e tocaram fogo. Mais 500 mil votos para Bolsonaro (chute). Além de ser crime.

São ações típicas de anarquistas: não respeitam a propriedade privada e almejam destruir o Estado (Fórum) e seus símbolos (bandeira).

Que medidas tomarão as autoridades? A bandeira é um símbolo nacional. O que fará o Presidente?

5- A dupla Celso de Mello e Alexandre de Moraes está, aparentemente, em uma enrascada jurídica.

Mello terá de tirar um coelho da cartola para obrigar Bolsonaro a prestar depoimento presencial, pois à Temer foi facultado o depoimento por escrito.

Já o “democrata” Moraes fez uso da famigerada Lei de Segurança Nacional para enquadrar o ministro Weintraub. A lei tipifica como crime “fazer, em público, propaganda de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social”.

Ocorre que as declarações do Ministro da Educação foram feitas de modo privado e quem as tornou pública foi… o Ministro Mello.

Aguardemos a possível criatividade jurídica de Suas Excelências.

6- Tudo indica que estamos vivenciando algo inédito, na história de New York City.

A polícia local desistiu de impor o toque de recolher. Ou seja, abdicou de impor o poder que lhe é conferido pelo Estado. Com isto, os saqueadores estão livres para depredarem as lojas.

Por que a polícia tomou esta decisão? Esta é a pergunta do momento. Foram orientadas a se recolherem com receio de um conflito monstro que poderia levar a nova morte de inocentes? Ou a polícia se recusou a cumprir ordens do prefeito? (O que seria um motim). Disputa entre o governador e o prefeito de Nova Iorque? Ou seria uma estratégia do Partido Democrata de tentar jogar no colo de Trump a responsabilidade pela desordem?

Em breve, saberemos. Seja o que for, a situação é muito grave. E a crise tende a recrudescer.

7- Política é, em última instância, a disputa pelo poder e pela ordem. Ponto. Onde há poder não há desordem. Onde há desordem não há poder, ou seja, não há política.

Sem entrar na análise sociológica das manifestações, vandalismo é sinal de falta de poder das autoridades e isto incentiva a desordem.

Parece que as atuais forças de segurança não estão dando conta de conter a desordem. É preciso que sejam reforçadas. Há um protocolo que foi estabelecido durante manifestações similares, em 1992, na cidade de Los Angeles.

Chamou-se a Guarda Nacional da Califórnia. A desordem continuou. Federalizou-se a Guarda Nacional, ou seja, outras Guardas Nacionais vieram em socorro. Passaram a ser comandadas pelo Presidente Bush, que arcou, inclusive, com os custos de deslocamento e salários da tropa.

Mesmo assim, os saques continuaram. Só aí é que o Exército foi convocado. Primeiro, a divisão leve de infantaria, enquanto blindados ficaram nas cercanias da cidade. Felizmente, a desordem foi controlada.

Só não entendo porque Trump está querendo pular a etapa da federalização das Guardas Nacionais e convocar, de imediato, o Exército. Só pode ser uma jogada eleitoral, ou seja, tentar se colocar como o defensor da ordem, ao contrário dos fracos governadores, principalmente os que forem do Partido Democrata. Do outro lado, os vândalos, que precisam ser contidos por um líder que tenha autoridade.

8– Prestem atenção as palavras do ex-ministro da Defesa, Raul Jungman:

1) “E um aspecto fundamental de uma democracia de fato é que não existe tutela e muito menos capacidade de veto das Forças Armadas.”
Ora, persistem enclaves autoritários, que são vetos à autoridade civil, no aparato estatal desde 1985 até os dias de hoje, incluindo a gestão de Jungmann. Ou seja, ele sabe disto.

2) “As Forças Armadas pertencem à Constituição.”
O problema é que a CF de 1988 recepcionou o artigo 142, que não é democrático.Este artigo foi imposto pelo General Leônidas Pires, caso contrário zeraria o processo constituinte. Jungmann também sabe disto.

O que está por detrás de sua dissimulação?

9– Ia comentar pelo meu alívio de nunca mais ter aparecido um analista para tentar justificar o comportamento político por suas características psicológicas. Sentia-me aliviado, com medo de perder meu espaço como analista que usa apenas ferramentas políticas.

Aí, surge Tarso Genro para queimar minha língua. E, desta vez, com uma análise mais sofisticada do que a dos psicólogos facebookeanos. Ele consegue misturar características políticas e psicológicas. Para ele houve um pacto para a assunção de Bolsonaro.

“Que pacto é esse? Esse pacto foi o seguinte: vamos tolerar um psicopata no governo — porque o Jair Bolsonaro é um psicopata, é nitidamente um psicopata –, mas, em contrapartida, ele tem que garantir as reformas”, explicou.

Tarso Genro foi um dos petistas que pediu o impeachment de FHC. Sem haver razão sólida para este pedido.

 

 

 

Jorge Zaverucha – Doutor em ciência política pela Universidade de Chicago (EUA), é professor titular do departamento de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco. Autor do livro “FHC, Forças Armadas e Polícia – Entre o Autoritarismo e a Democracia” (2005, ed. Record)

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