DEVAGAR COM O ANDOR, QUE O SANTO É DE BARRO – Ney Lopes

DEVAGAR COM O ANDOR, QUE O SANTO É DE BARRO –

Ney Lopes – jornalista, ex-deputado federal e advogado – nl@neylopes.com.br

Para entender o atual quadro político nacional cabe recordar a surpreendente vitória de Bolsonaro originária da onda “antipartidos” e “antipolíticos” de 2013.

Discurso de pureza ética transformou o “capitão candidato” em “avalanche eleitoral”.

Com o Presidente recuperado do atentado, agora começa o governo. Percebe-se na engrenagem oficial, a seleção de auxiliares baseada na lógica de “tentativa e erro”, ou seja, várias escolhas, até que seja encontrada aquela que funcione.

Na maioria dos escolhidos, o Presidente optou por nomear, quem não poderá demitir. Fecha a porta e joga a chave pela janela, além de ter a “vigilância” permanente do seu vice.

Existe essa conjuntura político-administrativa, pelo fato do presidente não ter grupo político-partidário, o que dificulta a governabilidade democrática. É obrigado a recrutar quem não conhece e fazer aliança com as forças armadas.

Admite-se que sejam difíceis os inícios de governos. Entretanto, no atual as dificuldades aumentam e sinalizam que algo deve ser corrigido. Vejamos fatos concretos.

Vários comentários diários de Bolsonaro no Twitter – e o mais grave dos três filhos com mandatos – contradizem seus principais assessores. A prova foi a demissão inesperada do ministro Gustavo Bebianno, fiel escudeiro da campanha eleitoral, causada por denuncia do vereador Carlos Bolsonaro.

O deputado Eduardo Bolsonaro, em Washington, colocou o boné de Trump na cabeça e garantiu que o Brasil transferiria sua embaixada para Jerusalém, o que causou estranheza até ao vice Mourão e abriu conflito com os árabes. Ele foi o mesmo que ameaçou fechar o STF, com “um soldado e um cabo”, caso impugnasse a candidatura do pai.

O senador Flávio Bolsonaro tem assessor investigado por movimentações financeiras suspeitas. Cada declaração de um filho do Presidente é como se fosse dele. Os três foram eleitos, graças ao prestígio paterno, embora ostentem a bandeira da “antipolítica”.

O próprio presidente anunciou decreto pessoal de elevação do IOF, como meio de reduzir a alíquota máxima do Imposto de Renda. Marcos Cintra, subordinado ao ministro da Economia, foi taxativo ao afirmar que as mudanças de impostos viriam depois, “no tempo certo”.

Onyx Lorenzoni, simplesmente declarou que o “presidente estava equivocado” (????)

No meio do torvelinho de combate ao déficit público anuncia-se que uma das soluções será – como sempre – transferir ônus para servidores públicos, aposentados, pensionistas e assalariados (elevação da alíquota para 14% na previdência).

Enquanto isso, o ministro Paulo Guedes falou duro: “Todo mundo vem pedir subsídios, dinheiro para isso, dinheiro para aquilo. Eu falo: o que vocês empresários podem fazer pelo Brasil? Quebraram o Brasil”.

Faltou o ministro anunciar qual será a cota de sacrifício desse setor da economia para ajudar a “fazer caixa” e reduzir o déficit previdenciário. Ou, tudo continuará como “dantes no quartel de Abrantes”?

Para se ter uma ideia, o total de subsídios dados pela União em 2017 chegou a 354,7 bilhões, equivalente 5,4% do PIB, sem fiscalização do retorno social.

Esses “subsídios” – alguns permanentes – são receitas, que o governo deixa de ter e falta ao custeio da previdência, bancada, mês a mês, pelo bolso dos servidores, assalariados e empresas.

Outro gerador de crises têm sido as declarações impróprias de ministros. A ministra Samares Alves revelou preconceito ao afirmar: “Menino veste azul, menina veste rosa”. Foi mais além: “O Brasil é o pior país da América do Sul para se criar menina. Se eu tivesse que dar um conselho para quem é pai de menina, mãe de menina: foge do Brasil”.

O colombiano naturalizado Ricardo Vélez Rodríguez, ministro da Educação, acusou brasileiros de “canibais, que rouba coisas dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião; ele acha que sai de casa e pode carregar tudo”. Até hoje, nada aconteceu. É o caso de dizer: “tutti buona gente”!

Diante de tal realidade, a missão do Presidente Bolsonaro – inegavelmente de boa fé e com sensibilidade social – torna-se complexa.

Os “solavancos” contínuos lembram o ditado popular: “Devagar com o andor, que o Santo é de barro”.

Uma verdade deve ser dita: até agora, os militares no governo não lhe trouxeram problemas.

Para levar o barco, o governo talvez que tenha que inspirar-se em Jean Paul Sartre, quando escreveu: “Viver é isso: Ficar se equilibrando o tempo todo, entre escolhas e consequências”.

 

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal e professor de Direito Constitucional (UFRN)nl@neylopes.com.br www.blogdoneylopes.com.br
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