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Consumidor ainda paga redução da conta de luz do Governo Dilma

Na maior parte de sua vida pública, a ex-presidente Dilma Rousseff acumulou experiências no setor elétrico. Depois de cinco anos como secretária de Minas e Energia no Rio Grande do Sul, ela foi alçada ao ministério do setor pelo presidente Lula, em 2003, onde redesenhou o modelo do sistema nacional de energia. Sua exposição na pasta garantiu passagem para a Casa Civil e pavimentou o caminho para sua eleição como presidente em 2010. No Palácio do Planalto, Dilma lançou, em 2012, sua maior ação voltada ao setor: a redução de 20%, na média, das contas de luz. Preparada com a orientação do marqueteiro João Santana, a proposta seria o grande legado de Dilma, de olho na reeleição, em 2014. A petista venceu a disputa eleitoral, mas a medida tornou-se um entulho normativo, que demandou uma série de remendos e cujos efeitos são sentidos até hoje no bolso dos consumidores residenciais, comerciais e industriais.

No capítulo mais recente das tentativas de ajustar a desordem provocada pela decisão de 2012, a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) definiu que nove transmissoras serão indenizadas em R$ 54,4 bilhões ao longo dos próximos oito anos – valor que pode subir a R$ 62,2 bilhões após correções. A fatura será repassada aos brasileiros. O pagamento entrará em vigor a partir de julho e deve aumentar a conta de luz em 7,17%, em média. O valor que chegará ao consumidor depende de uma série de fatores, como o custo de geração de energia e outros subsídios, sendo definido por cada distribuidora. Pelas projeções da Aneel, o aumento da tarifa nos Estados deve variar entre 1,13% e 11,45%. Na reunião que definiu o reajuste, o diretor-geral da Agência, Romeu Donizete Rufino, disse que a indenização é uma decisão do governo e que a Aneel apenas “disciplina” o que foi acertado.

Anunciada na época em rede nacional de rádio e televisão pela presidente Dilma Rousseff, a Medida Provisória 579 teve o apoio de grandes empresários e entidades setoriais. O texto propunha adiantar a renovação das concessões para geradoras, transmissoras e distribuidoras de energia que venceriam, na maior parte, em 2015. Em contrapartida, as empresas tiveram de aceitar redução de tarifas, de 20%, em média. O governo se comprometeu a arcar com as indenizações por investimentos em estruturas e equipamentos feitos entre junho de 2000 e o final de 2012 das empresas que aderissem à proposta. O problema é que investimentos das transmissoras realizados antes desse período não tinham sido totalmente amortizados e não puderam ser quitados via tarifa. Sem as indenizações a partir de 2013, devido as restrições orçamentárias do governo federal, o pagamento não saiu e o passivo deixou as companhias numa situação delicada e se traduziu em maior insegurança jurídica ao setor.

Uma portaria de abril de 2016 do Ministério de Minas e Energia definiu que as indenizações às transmissoras começariam a ser pagas a partir deste ano, até 2025, e que essa conta seria repassada aos consumidores, mas a Aneel só bateu o martelo sobre o tema poucos dias antes do Carnaval. O atraso acumulado desde 2013 gerou uma correção dos valores e acrescentou ao menos R$ 35,2 bilhões aos R$ 20 bilhões que as empresas deveriam receber originalmente. Ainda que não ideal, a decisão é vista como justa pelas transmissoras, porém o número a que a Aneel chegou é menor do que as empresas calculavam.

A fatura de indenização às transmissoras é apenas mais um dos efeitos colaterais do voluntarismo da ex-presidente sobre os bolsos dos consumidores. A ideia original da MP 579 era aproveitar a proximidade do fim das concessões para atacar uma queixa da indústria sobre o alto custo da energia, em especial num momento de desaceleração do setor. A medida estava baseada em três itens: desoneração de encargos sociais, antecipação da prorrogação das concessões e um subsídio extra de R$ 3,3 bilhões do governo à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo cujo objetivo é universalizar o acesso à luz. O problema é que o plano foi malfeito, provocando uma série de questionamentos sobre as regras de indenização e ruídos de comunicação do governo com as partes envolvidas. Nem todas as geradoras aderiram à iniciativa, por não aceitar rever os contratos de venda de energia para as distribuidoras a um valor menor. Quando os contratos antigos começaram a chegar ao fim, as distribuidoras passaram a receber menos energia das geradoras que não aderiram ao plano. A diferença teve de ser comprada no mercado à vista, a um valor mais caro.

Somado a isso, a falta de chuvas em 2013 demandou o acionamento das termelétricas e pressionou ainda mais o custo da energia. Para garantir que a tarifa não subisse aos consumidores, o governo injetou R$ 20 bilhões entre repasses às distribuidoras e indenizações às empresas que aderiram ao plano. Com um custo pesado ao Tesouro, o preço da energia, medido pelo IPCA, fechou 2013 com uma queda de 16%. A situação do setor elétrico ficou ainda mais preocupante em 2014, ano de eleição. O regime de chuvas não tinha melhorado e o consumo disparou no começo do ano devido ao forte calor. As distribuidoras, que estavam comprando energia mais cara das geradoras, precisaram adquirir mais R$ 1,8 bilhão em eletricidade para atender a demanda. Para piorar, o governo atrasou o repasse da ajuda prometida, prejudicando ainda mais as empresas. A liberação aconteceu apenas em março, e foi de R$ 1,2 bilhão. Já em fevereiro, as distribuidoras compraram mais R$ 3,5 bilhões em energia, e a situação dos reservatórios das hidrelétricas continuou preocupante. As distribuidoras tiveram mais problemas de caixa devido a diferenças em compras de energia realizadas no ano anterior.

O governo tentou solucionar novamente através do repasse de R$ 4 bilhões vindos do Tesouro e contratação de dois empréstimos no mercado, um de R$ 11,2 bilhões em abril e outro de R$ 6,6 bilhões em agosto, além de novas rodadas de leilões de energia. Apenas em 2014, a fatura extra do setor elétrico que recaiu sobre o governo federal somou R$ 54,8 bilhões, entre subsídios e indenizações. Mesmo assim, a energia fechou o ano com uma alta de 17%  Na época, o TCU alertou que a sustentabilidade do setor estava em risco devido à dependência dos aportes do Tesouro e à necessidade das distribuidoras por empréstimos.

Em 2015, logo após a reeleição de Dilma, a redução afundou de vez. O ajuste fiscal iniciado pelo então ministro Joaquim Levy, congelou o repasse de R$ 9 bilhões em subsídios e autorizou o repasse integral para as contas. O resultado foi um avanço de 51% no preço da energia. A conta também trouxe impactos para a Eletrobras, cujas subsidiárias tiveram de aderir ao plano do governo. A estatal teve três anos seguidos de prejuízo e precisou contar mais tarde com um aporte do governo federal. A situação começou a se normalizar em 2016, com a melhora dos reservatórios e o fim do tarifaço do ano anterior. Para os especialistas, a aventura de baixar as tarifas por decreto estava fadada a dar errado desde o começo, e a resolução dos problemas das transmissoras é apenas parte do problema. Quando a MP veio, ela não foi boa para ninguém. A maioria que aceitou estava ligada à Eletrobras. “Mas quem estava no setor à época sabia que a conta não fechava. Ainda é cedo para prever se as consequências e as faturas de cobranças relacionadas à MP chegaram ao fim. Há algumas indenizações às geradoras que ainda não foram pagas. A situação só deve melhorar em 2024 ou 2025, quando poderá haver alguma queda de tarifa.

Ponto de Vista

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