COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: OUTRAS COISAS DA FAZENDA UMBUZEIRO (II) – Antonio José Ferreira de Melo

COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: OUTRAS COISAS DA FAZENDA UMBUZEIRO (II) –

 

COISAS DO SEGURANÇA OTAVÃO

Uma senhora da localidade, que não prezava pela testa do marido, se apaixona por Otavão, um dos nossos “seguranças”.

Como o marido viajou, ele vai dormir com ela, e eis que, inesperadamente, o marido volta.

O corno, entra na casa sem fazer barulho e ao chegar no portal do quarto, que tinha uma cortina como porta, se depara com a cena, e, como se diz na música, “fica de frente pro crime”.

Otavão, quando escutou o barulho da cortina se abrindo, olhando na direção dela, só viu a imagem do marido traído, que também era um cara de grande estatura.

Como dizia o povo da comunidade: “tanto tinha de grande como de chifrudo”.

Segundo Otávio me falou, tomou um susto danado, pois não sabia o que ia acontecer, e qual seria a reação do corno.

Ele me disse: Doutor Antonio, tava tão boa a brincadeira, mas, de imediato, perdi todo o “intusiasmo”.

Saindo de dentro da casa, o corno foi tossir lá do lado de fora, no alpendre da frente, para mostrar onde estava, e a mulher diz a Otávio: tenha cuidado pois ele esconde uma foice embaixo das telhas.

Otavão saiu pela porta da cozinha, e, pelo meio do mato, escapou até a fazenda, se livrando dos cachorros, nos quintais por onde passava.

Cheguei no Umbuzeiro no outro dia, e Chico Tim, que era o “gerente”, me sugere levar o “conquistador”, para que ele ficasse um tempo na outra fazenda, até que o problema se “aquetasse”.

Foi o que fiz.

O RETORNO

Passadas duas semanas, levo Otavão de volta pro Umbuzeiro.

Como dava carona a uma senhora, Otávio ia na carroceria da camionete.

Chegando no povoado, nem me lembrei da relação do meu passageiro com qualquer problema, e, veja a “leseira”: paro em frente da casa do corno, para falar com ele, que estava na beira da estrada.

Não lembro com qual intenção ou necessidade, mas, quando me dei conta do problema, não tinha mais jeito.

Para minha surpresa, veja bem a forma da recepção.

O corno apertando a mão de Otávio, diz: “CUMPADRE OTAVÃO, PENSEI QUE TINHA ABADONADO NÓIS”!!!!!

Aí, meu amigo, foi rir, disfarçadamente.

COISAS DO SEGURANÇA ZÉ DE LAURA

Zé de Laura não tinha nada de conquistador. Os seus dotes de beleza estavam longe de lhe tornar um galã.

Porém, entre as suas idiossincrasias, uma delas me chamava a atenção.

Ao acompanhar a matança de um animal, Zé colocava um caneco na veia que foi sangrada, e bebia um copo do sangue.

Dizia ele, que em função disso, não tinha doença de qualquer qualidade, e, no particular, falava que era suficiente para lhe dar forças para enfrentar os perigos.

Tipo “corpo fechado”.

Com todas essas “propriedades”, inventei de experimentar. Dei um gole e passei o resto do dia cuspindo.

O jeito foi beber uma lapada de cana.

OS CAMINHÕES CARREGADOS COM ESTACAS

Pelo abandono, por falta de recursos do proprietário anterior, se fazia necessário reconstruir todas as cercas, o que veio a consumir vários milheiros de estacas de sabiá.

Lembro o dia que passei no gancho, em São Gonçalo, e comprei as estacas, ainda arrumadas, em dois caminhões

Como costumamos dizer, dois caminhões de estacas.

Era tudo arrumadinho. Estacas perfeitas. Grossas e “linheiras”, sem torturas.

Como o dono do ponto de venda, já era meu conhecido, e eu acho até, que ainda hoje, vende estacas num terreno em frente ao Nordestão, paguei aos caminhoneiros, e mandei deixar na fazenda, pois ia olhar um gado para comprar e só chegava mais tarde.

Quando cheguei no Umbuzeiro, o segundo caminhão ainda estava sendo descarregado, e ao invés das estacas perfeitas, eram finas e tortas, sem qualidade.

As perfeitas apenas envolviam a carga.

Acompanhado dos meus dois “guarda costas”, “convenci” os caminhoneiros, os verdadeiros donos das estacas, a me devolver o dinheiro e ainda terem o trabalho de carregar o caminhão, sem a nossa ajuda, com as porcarias que tinham descarregado.

“Convence-los”, não foi fácil, porém, diante da ameaça de manter os caminhões presos e até fazer uma grande uma fogueira, eles acharam melhor reconhecer que tinham agido desonestamente.

 

A FEIJOADA

Normalmente, chegava no Umbuzeiro nas tardes das sextas feiras, ainda em tempo de ver o gado que vinha para o curral, e, as vezes, até com a possibilidade de montar num cavalo, para tomar conhecimento de alguma coisa mais urgente.

Ao chegar, mandava preparar uma feijoada, que se tornou costumeira, e os meu empregados, bem como alguns vizinhos, já tinham como programa, tomar cachaça depois das 7 da noite e jantar lá pelas 22 horas, muitos saindo “trupicando” em direção às suas casas.

Vez por outra tomávamos conhecimento que algum dormiu no caminho.

Era uma forma de manter um bom relacionamento, saber das estórias e histórias da região e também, como o álcool “afrouxava” a língua, tomar conhecimento de tudo o que tinha se passado, durante a minha ausência.

Estando na fazenda, vez por outra, convidava vizinhos e recebia pessoas amigas das comunidades próximas, e até de outros municípios.

No entanto, por falta de comunicação, as vezes, chegava alguém de surpresa.

DAS VISITAS INESPERADAS, UMAS NEM TANTO:

 

WILSON BOCA DE CAÇAPA E A BURRINHA

Entre essas visitas inesperadas, mas que já eram constantes, uma delas, a mais frequente, era “Wilson do Banco do Brasil” ou “Wilson Boca de Caçapa” ou “Wilson Boca de Fole”.

Esses eram uns dos apelidos dele, fazendeiro, proprietário de excelentes terras no Município de Parazinho.

Na época, era meu amigo, e chegava na fazenda já me provocando, dizendo que ali não tinha nem comida e nem bebida.

Dizia que já andava com a “burrinha”, para não ficar sem beber.

A “burrinha, como ele chamava, era uma pequena barrica de madeira, cheia de cachaça.

Mas ele sabia que tinha o que beber e o que comer.

Uma vez, na época da safra de caju, D. Neta, mulher de Chico Tim, tinha preparado um ensopado de caju, cuja “forma e gosto” se assemelham a lagosta e só os conhecedores, fazem a diferenciação.

Quando Wilson chegou, nessa noite, dizendo que que não tinha o que comer, eu falei: D. Neta traga a lagosta do meu jantar, para esse faminto, que não tem o que comer em casa, e vem matar a fome aqui.

Ao experimentar a “lagosta”, Wilson puxou o prato e disse: esse aqui é só meu. Comeu até não poder mais, e se foi, elogiando a lagosta e o meu uísque.

WILSON E A PISTOLA

Num certo final de semana, eu estava recebendo um grupo de casais amigos de Natal, e ele chegou no Umbuzeiro, bebeu mais do que a conta e, ainda quis se “enxerir”, para as senhoras dos meus amigos, que lhe levaram na galhofa.

Ao sair, desorientado, perdeu-se no caminho da volta, indo bater lá para os lados de Touros, onde deve ter deixado cair a sua pistola, uma vez que algumas estradas, eram em propriedades particulares e possuíam porteiras, o que obrigava descer para abrir e depois fechar.

Dias depois nos encontramos na ANORC, no Parque Aristófanes Fernandes, e ele, querendo aparentar brincadeira, me acusou de ter escondido a sua arma e não ter devolvido.

Isso nos levou a discutir, sua acusação imperdoável provocou uma cisão no nosso relacionamento e nunca mais ele apareceu no Umbuzeiro.

Eu gostava da sua amizade. Pena que nos desentendemos, e eu fui obrigado a me afastar dele, para que não brigássemos.

POMPEU E AS PIMENTAS

O meu amigo Pompeu, geólogo e proprietário de terras na localidade de Bebida Velha, me visitava com frequência.

Tinha como mania, “esculhambar” com os meus molhos de pimenta, dizendo que não ardiam.

Quando eu colocava a feijoada, ou qualquer outro “salgado”, ele pegava um garfo, espetava as pimentas e, simplesmente, comia as próprias, para acompanhar a bebida.

Realmente, Pompeu é muito resistente ao ardor.

Uma vez na ANORC, Ximbica chegou com um “spray” de pimenta e ele colocou no churrasco e comeu.

Uns amigos de Pureza, que sabiam da minha paixão por molho, me deram duas pimentas “Gurupi”, que trouxeram da Amazônia, para que eu tirasse as sementes e plantasse.

Foi o que eu fiz, e coloquei as cascas dentro do molho.

Porém, para saber a intensidade do ardor, mordi a ponta de uma delas, e tive o desconforto de passar um bom tempo sentindo as consequências, como se fosse uma brasa dentro da boca.

Quando Pompeu chegou, lhe falei: Pompeu, tem duas pimentinhas, aí no molho, que são “brabas”. Experimentei, e vi que ardem muito.

Ele falou.

É? Pois vão ser o meu “tira-gosto” de hoje.

Quando comeu a primeira, começou a passar mal, demonstrando falta de respiração, num processo de asfixia, que poderia lhe levar à anóxia.

Tentando superar o problema, trouxemos açúcar, jogamos agua gelada nele, demos leite gelado, limão espremido, e tudo o que foi “milacria”, procurando resolver a situação, pois, caso fossemos lhe levar para João Câmara ou Pureza, imaginávamos que ele já chegaria morto.

Graças a Deus, uma das tentativas, não sei qual, deu certo, e Pompeu, se recuperou.

Pensa que se arrependeu?

Na semana seguinte já chegou “esculhambando com o molho, dizendo que ia comer a outra.

Precavidamente, eu já tinha jogado fora e mandado desfazer o plantio.

Gurupi, nunca mais.

“JOÃO”, MEU AMIGO – O REFÚGIO

Esta semana, tentei falar com essa grande figura, que é meu amigo, e não consegui.

Como esse povo tem mania de mudar o número do celular, pode até ser que tenha acontecido isso, e ele não tenha me comunicado.

Lhe mandei um E-mail, mas até agora, não tive resposta.

Já tem uns dias que nós não nos falamos, mas são coisas desse nosso tempo.

Amigos não precisam estar constantemente se vendo ou se falando.

Amigo “é uma coisa que existe”.

Como disse Milton Nascimento, na sua “Canção da América”, lá pelos idos de 1980:

“Amigo é coisa pra se guardar

No lado esquerdo do peito

Mesmo que o tempo e a distância digam não”

Afinal, até com os meus filhos, fico feliz, apenas pelo contato virtual. Às vezes, apenas, gostaria que fossem mais frequentes.

Com os amigos, que não são aproximados pelo sangue, a internet e o celular, já nos deixam aproximados e satisfeitos, por conseguir lhes falar, e a frequência, depende dos assuntos.

Bem, mas, dessa vez, não consegui o contato, e, também, não consegui sua autorização, para contar uma história da qual ele faz parte.

Porém, como essa tal história também faz parte do folclore da Fazenda Umbuzeiro, e não são coisas fictícias, não poderia deixar de contar, e, para tanto, vou fazer isso, mas não vou dizer o nome certo.

Vou chamar de “João”, esse meu amigo.

Lá vai.

Certo final de semana, acho que no final da tarde de uma sexta feira, tenho a alegria de receber a visita inesperada de “João”.

Para a minha surpresa, ele vinha se refugiar ou se asilar no Umbuzeiro, depois de se separar da mulher.

Lhe acompanhava a sua futura companheira, e depois minha amiga, com quem veio a se casar.

Refeito da surpresa, fomos comemorar, bebendo e tomando banho no olheiro de Pureza.

Depois da farra, procurei acomodar o casal nas humildes instalações existentes à época.

Como “João” demonstrava cansaço, eu falei: amigo, fique tranquilo que aqui não existe horário e ninguém vai mexer com você.

Falei para Chico Tim: “deixe ele dormir até a gata miar”.

Até hoje “João”, se lembra disso, e eu também.

Nos encontramos, recentemente, lá no Iate, e aproveitamos para colocar os assuntos em dia.

Assim, eram as coisas, nos bons tempos da Fazenda Umbuzeiro.

 

Antônio José Ferreira de Melo – Economista – antoniojfm@gmail.com

 

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores
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