A QUEM É DE DIREITO –
A quem é de direito, escrevo estas linhas não para cobrar afeto, mas por auto cobrança, para (me)lembrar que a verdadeira amizade, aquela que atravessa o tempo e as ausências, não floresce sozinha. Somos responsáveis por nossa presença, por nossa reciprocidade, somos guardiões dos laços que escolhemos nutrir. As amizades antigas e importantes, aquelas que resistem às distrações da rotina e aos ruídos digitais, pedem atenção consciente — gestos que confirmem que o cuidado é mútuo.
Em tempos de hiperconexão e solidão crescente, vínculos “leves” nos lembram a fragilidade da saúde mental na humanidade contemporânea, onde nasceu a amizade de “Baixa Manutenção”, aquela que não exige presença constante. Tornou-se uma das formas de vínculo humano. A enxurrada de informações e interações superficiais estão gerando ansiedade, exaustão emocional e até uma redução na nossa disposição para encontros reais.
Um estudo da Universidade de Oxford (2016)mostrou que pessoas com amizades sólidas liberam mais ocitocina e apresentam maior resiliência ao estresse, beneficiando não só a mente, mas também o corpo. A Harvard Business Review (2019), por outro lado, revelou que a sensação de solidão cresce justamente nessa era.
Em um cenário dominado pelas redes sociais, onde estamos “sempre conectados” e, paradoxalmente, cada vez mais solitários, como lembra o sociólogo Zygmunt Bauman (2003), vivemos tempos de relações líquidas, em que os laços tendem a ser frágeis, imediatistas e facilmente descartáveis.
A Associação Americana de Psicologia já aponta a correlação entre uso excessivo das mídias digitais e aumento de ansiedade e depressão. Em um tempo em que vivemos rodeados de notificações, mas cada vez mais órfãos de vínculos profundos.
“O vínculo só existe onde há eco: dar sem receber é gesto, receber sem dar é vazio, mas quando o afeto é mútuo, nasce a eternidade em instantes” — (Aristóteles, filósofo grego)
A célebre frase de Antoine de Saint-Exupéry, em O Pequeno Príncipe: “Tu te tornas eternamenteresponsável pelo que cativas” ecoa como um hino de ternura e cuidado. Porém, vista com olhar mais crítico, carrega uma armadilha: atribui ao sujeito o dever absoluto de zelar por qualquer afeto despertado, mesmo quando não há reciprocidade. É um convite à culpa e à servidão emocional, como se o simples gesto de abrir espaço ao outro fosse suficiente para aprisionar-nos em responsabilidades que, muitas vezes, não escolhemos.
Assim, a frase de Exupéry se revela incompleta: somos responsáveis, sim, por aquilo que conquistamos juntos — e não apenas pelo que oferecemos unilateralmente. Talvez devêssemos ressignificá-la: não nos tornamos eternamente responsáveis por tudo o que cativamos, mas por aqueles que também nos cativam.
A responsabilidade verdadeira não nasce do unilateral, mas do encontro que nos transforma mutuamente. Só aí há liberdade, só aí há vínculo. E a pergunta que resta é: quantas vezes carregamos culpas por afetos não correspondidos, quando, na verdade, a verdadeira responsabilidade só deveria nascer onde existe reciprocidade? O que nos cativa sem retorno é laço que sufoca; o que nos conquista em mão dupla é relação que liberta.
Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás?
Quantos você ainda vê todo dia?
Quantos você já não encontra mais?
(Oswaldo Montenegro, cantor brasileiro)
É fundamental termos consciência de quem, de fato, se preocupa conosco: amigos e familiares que, mesmo em meio às próprias lutas, encontram espaço para nos acolher. Em uma rotina acelerada, é fácil deixar esses vínculos à margem, distraídos pelo trabalho, pelas telas ou pelas urgências que nunca cessam. Como, certa vez, disse o argentinoQuino, através das tiras de Mafalda: “O urgente não nos deixa tempo para o importante.”.
A modernidade nos ensina a organizar compromissos, metas e contas, mas não nos pede para organizar afetos. Enquanto é tão necessário escrever uma lista, não de tarefas, mas de nomes: aqueles que são presença em nossa vida, aqueles a quem devemos um pouco mais de atenção, para que nada nos roube o gesto simples de uma mensagem, uma visita, um encontro marcado.
A filosofia antiga já nos alertava: para Sêneca, a vida é curta demais para desperdiçarmos com vínculos superficiais. Ainda assim, deixamos de cultivar o essencial, como se o tempo fosse infinito. É nesse instante que o arrependimento pesa — porque nenhum gesto atrasado devolve o tempo que negligenciamos.
Cuidar das relações é, também, cuidar de nós: uma forma de não deixar que a pressa do mundo nos afaste do essencial. Afinal, que sentido há em acumular conquistas, se esquecemos de regar as raízes que nos sustentam?
E você, já pensou em quem são os nomes que merecem estar na sua lista, antes que o silêncio da ausência fale mais alto que a presença tardia?
Observação: Esta crônica pediu para nascer. Entre a alegria de um reencontro online após anos de distância e a angústia, após receber a notícia de uma grande amiga sobre um câncer (com meses sem diálogo), logo após, cirurgicamente, a resposta grosseira e com pouca humanização de um recém conhecido, após dedicada atenção.
Atenciosamente,
Tatyanny Souza do Nascimento – Psicanalista e escritora
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