José Narcelio Marques Sousa

Fui eu quem induziu meu amigo José Pereira a jogar sinuca. O seu primeiro contato com o esporte foi na minha casa, onde existia uma antiga e excelente mesa Tujaque Magestic. Naquela oportunidade dei-lhe uma surra acachapante. Determinado, o amigo adquiriu a sua própria mesa, aprendeu fundamentos e artifícios da sinuca, tornou-se um jogador habilidoso, e nunca mais consegui ganhar dele.

Hoje, certamente, ele me agradece a iniciação nos maravilhosos e mirabolantes meandros dinâmicos do jogo. Quanto a mim, de tanto ser surrado pelo pupilo, adquiri tamanha ojeriza pelo esporte, que dele me afastei definitivamente. José Pereira pode até recordar uma ou outra partida de sinuca, dentre as inúmeras que me venceu. Lembrar todas elas é improvável. Mas, da primeira derrota que sofreu, ele jamais esquecerá.

As ações do nosso dia a dia são tabuladas como sendo uma primeira vez ou a repetição de uma primeira vez. Acontece que a primeira vez é única, pois guarda a magia de ser a primeira vez. Das muitas primeiras vezes de nossas vidas, algumas são catalogadas como primeira e única vez, e nem todas ficam armazenadas na cachola. Mas, se puxarmos pela lembrança, pelo menos as mais significativas estarão presentes nas recordações. Quem esquecerá facilmente, por exemplo, experiências radicais como aquele único mergulho ao fundo do mar ou o primeiro salto de paraquedas? E por aí vai…

Da infância, eu guardo na lembrança a primeira vez que calcei um par de sapatos – pequenas botas de couro com solados de borracha. Sentia-me um adulto quando, sem qualquer auxílio, eu as colocava e reproduzia nos cadarços, o nó ensinado por minha mãe. Também me lembro do desejo, nunca concretizado, de ganhar a primeira bicicleta e aprender a pedalar. Sem perspectiva de adquiri-la, consolava minha frustração invejando a do filho do vizinho… E como machucava vê-lo desfilar serelepe, flanando a sua vaidade em passeios pela rua onde morávamos.

Recordo bem do primeiro cocorote a me fazer agachar de dor. Isso, por conta de inocente espiadela pelo buraco da fechadura do quarto onde uma prima se trocava. Querem saber? Nunca reclamei da dor lancinante, nem do calombo na cabeça, tampouco da visão deslumbrante da prima desnuda.

Da adolescência, as lembranças da primeira vez que abarcam meus pensamentos são mais consistentes. Não posso descartar a impagável recordação de abrir a porta, ligar a ignição e dirigir meu primeiro carro, presente do pai pela aprovação no vestibular. Ainda recordo a satisfação de levar a namorada para jantar fora, pela primeira vez, pagando a despesa com o primeiro salário.

Emociono-me ao lembrar a sensação de ter nos braços meu primogênito, pela primeira vez. Bem como a triste experiência de sepultar, pela primeira vez, um parente próximo. E, de sentir, pela primeira vez, a realidade de que a morte é a única certeza que temos no transcorrer do pouco tempo de vida de que dispomos.

Existe uma primeira vez inesquecível, tanto para o homem quanto para a mulher. Trata-se da primeira experiência sexual, chamada carinhosamente de “minha primeira vez”. Não interessa que tenha sido prazerosa ou desastrosa. Essa sensação inenarrável marcará, com a mesma intensidade, a lembrança do iniciante no processo de fazer amor ou de fazer sexo.

O extraordinário é que não ocorre um ato sexual idêntico, pois são variadas as sensações de cada momento e diferentes as circunstâncias de cada ocorrência, e isso faz de cada um deles, a primeira vez.

José Narcelio Marques Sousa, é engenheiro civil.

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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