Seu Francisco, dono de uma sortida venda em Nova-Cruz, também chamada de “Armazém de Secos e Molhados”, era muito sério e não gostava de piadas. Muito religioso, em casa não admitia que os cinco filhos falassem palavras chulas nem arengassem, principalmente nas horas de refeições. A bem da verdade, gostava que todos comessem em silêncio. Para ele, a hora da refeição era sagrada. Era o momento de se agradecer a Deus o alimento recebido.

Também não admitia que as filhas falassem em namoro. O filho mais velho, já casado, fumava, mas não na sua frente, ou da mãe, pois, décadas atrás, isso era considerado falta de respeito aos pais.

Na venda de Seu Francisco se comercializava uma grande variedade de produtos, incluindo cigarros “Astória”, “Gaivota” e “Continental”, e produtos alimentícios como chocolates “Refeição” e “Torrão”, Pirulitos “Kibom” e chicletes “Adams”, açúcar, arroz, araruta e café em grãos. E ainda: Enxada, foice, ciscador, ferro de engomar “Estrela” e “Itacolomy”, querosene “Jacaré”, Cimento “Zebu”, e o indispensável penico.

Para quem não conhece, o penico ou urinol é um recipiente branco, arredondado e de fundo chato, que antigamente era mantido no quarto, sob a cama. Era usado como vaso sanitário, principalmente para urinar. Os penicos mais comuns eram os de ágata e ainda podem ser encontrados em lojas antigas.

Nessa época, em Nova-Cruz, as “casinhas”, ou aparelhos sanitários, ficavam do lado de fora das casas. Por isso, o uso do penico era comum, para atender às eventuais necessidades fisiológicas durante a noite.

Era véspera de São João e, logo cedo, chegaram uns matutos na venda de Seu Francisco, para comprar penicos e também outras mercadorias. Eram todos conhecidos do comerciante e fregueses habituais. Muito sisudo, o comerciante vendeu, além de alguns penicos, outras mercadorias costumeiras, como sabão, açúcar, arroz, óleo, manteiga e papel higiênico. Seu Francisco ficou muito satisfeito com a grande saída das mercadorias, e se mostrou até brincalhão.

A feira de milho para o São João estava muito movimentada. Os matutos saíram da venda, dizendo a Seu Francisco que iriam comprar milho para que suas patroas providenciassem as iguarias típicas para a noite de São João. Despediram-se do comerciante e ouviram dele uma simpática saudação:

– Feliz São João! Comam muita canjica, muita pamonha, muito milho assado e cozido e soltem muitos traques! Boa sorte com os penicos!!!

Sem qualquer pretensão de fazer gracejo, Seu Francisco provocou gargalhadas em quem ouviu sua saudação junina.

Violante Pimentel  –  Escritora

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