RELEMBRANDO ANTONIO ANDRADE DE LIMA –

Já escrevi que silenciar a memória de um homem é a maior revelação de nossa covardia. Às vezes, fico a pensar que Macaíba, em vez de reverenciar, pune os seus mortos. Ainda menino, quando passava pela rua Dr. Pedro Velho, gostava de me quedar à distância, na contemplação imaginosa do Solar do Caxangá. Procurava adivinhar os mistérios circunstantes daquele casarão, desde as frondosas copas das árvores ao seu interior, as suas criaturas, envoltas em um passado distante que me trazia a mente, o rosto, a silhueta, os passos, a voz, de um homem que não conheci: o Major Andrade. As diferenças políticas mantinham os limites. Mas, a curiosidade de menino e de adolescente eram ilimitados. Cresci nesse ambiente de ressurreição.

O Major Andrade foi chefe político e prefeito nos períodos conturbado dos anos vinte, trinta. Era uma figura patriarcal, proprietário de vastas terras que representavam quase dois terços da Cidade de Macaíba, atualmente. A Capela São José, de 1882, ao lado do Solar, é o testemunho eloquente da nobreza familiar. Era a época em que as famílias abastadas edificavam nos seus domínios os templos da religião de sua devoção. O Major Andrade viveu nos tempos áureos de Macaíba burguesa, onde do seu Caxangá as notas musicais dos pianos povoavam a noite aristocrática da cidade. Líder da Oposição, no inicio, ao lado dos Mesquita contra os republicanos do Cel. Mauricio Freire, o Major Andrade, devotado seguidor do famoso José da Penha, salientou-se também como industrial e proprietário da Fábrica de Cigarros 15 de Novembro. Outro aspecto digno de menção, era a sua banda de música que confrontava com outra, do mesmo gênero, mas do partido político da situação.

Voltei a contemplar o Solar em 1966, no seu silêncio, na solidão própria e digna do que tinha sido, e, numa noite, decidi entrar à convite, para conhecer D. Segunda, mulher espartana, de forte temperamento. O Major Andrade já havia desaparecido mas a sua presença se fazia sentir naquela sala de móveis sisudos e clássicos e até os seus passos eram por mim imaginados e reconstituídos no corredor de abajur lilás.

Relembrar tudo isso significa não apenas resgatar-lhe a memória mas acima de tudo dizer, que toda construção preservada é a sombra projetada de um homem na posteridade. A minha homenagem a todos os seus descendentes.

Os seus descendentes diretos: D. Inah (Matriarca das famílias Andrade de Lima e Cordeiro), Dr. Vicente Andrade de
Lima e D. Consuelo, ambos já falecidos.

 

 

 

Valério Mesquita – Escritor, Membro da Academia Macaibense de Letras, Academia Norte-Riograndense de letras e do Conselho Estadual de Cultura  e do IHGRN– [email protected]

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