NELSON FREIRE E

Parece que o Ano Novo finalmente começou. O carnaval acabou em todo o país e no último sábado aconteceram os últimos desfiles das escolas de samba, para a alegria dos cariocas e paulistas, além de turistas que assistiram aquele espetáculo. Nas outras cidades, os últimos blocos e trios elétricos foram às ruas, e o povo fez a sua catarse. Depois da quarta-feira de cinzas as coisas começaram a voltar ao normal, embora em ritmo lento, a partir da quinta e sexta-feira. Mas teve o fim de semana, usado para matar as saudades daquele  dolce  farniente. Uma rotina por demais conhecida por todos. “Tudo como dantes no quartel de Abrantes” já diz o velho ditado.

Mas esta segunda feira já se inicia diferente e cheia de expectativas. A começar pela espera de novos lances novelescos, motivados pelos fatos envolvendo a politica nacional. Como a luta entre Dilma versus Cunha; o depoimento de Lula na Lava-Jato; as informações inquietantes sobre o nível de desemprego; o aumento da inflação; o aumento do custo de vida; os novos aumentos de impostos; a aprovação ou não da CPMF; o aumento da criminalidade; a guerra contra o aedes aegypti; a queda da Bolsa e o aumento do dólar; a desvalorização das ações da Petrobrás e outras querelas mais.

Volto um pouco o relógio até a semana passada. Como não sou um grande folião, aproveitei parte do período para descansar, ler e assistir a programas interessantes na televisão. Assisti a muitos filmes, a entrevistas, documentários e shows, e também aos canais que mostram a vida animal de uma forma realista, nua e crua. Fiquei impressionado com tudo que vi. E a cada episódio, pensava cá com meus botões sobre as semelhanças entre nós, racionais, ditos homo sapiens, e eles, a quem chamamos pejorativamente de bichos, os animais irracionais.

Tirei algumas conclusões do que vi e uma delas foi de que todos nós, animais habitantes deste planeta Terra, somos muito parecidos. Não por acaso, o nosso DNA é quase igual ao do macaco. E continuei a pensar. Por exemplo, a nossa violência e agressividade desmedida não difere tanto da praticada pelas outras espécies. Comecei a me convencer que a carnificinas dos outros, grandes ou pequenos, é a mesma que nós praticamos entre nós mesmos. Só que eles agem para própria sobrevivência. Conosco não é por essa razão. Alguém já disse que o “homem é lobo do próprio homem”. Só que não nos comemos, da forma literal e conhecida. Mas o fazemos de outra maneira, muito mais sutil e perigosa.

Somos engenhosos, usamos o cérebro para maquinar planos, geralmente com o intuito de prejudicar os outros, seja por despeito ou inveja. E são muitos os planos e as jogadas maquiavélicas que, na maioria das vezes, deixam as vitimas com irreversíveis sequelas. A velha estória, por exemplo, do “mata até a mãe para subir na vida”. Ou ainda, “se eu não tenho, ele também não pode ter”. E isso a gente vê com frequência em todos os segmentos da sociedade. Qualquer que seja o nível intelectual, social ou econômico das pessoas. Letrados, analfabetos, ricos, pobres, brancos, pretos, mulatos, cafuzos e por aí vai.

Essas coisas se tornaram ainda mais visíveis entre nós, depois que as redes sociais democratizaram o direito de se publicar opiniões. O que se tem visto é a proliferação de informações, algumas tidas como “verdades absolutas”. Cada um escreve o que quer, dependendo do seu interesse, da sua ideologia ou do seu estado de espirito. Se você é a favor de alguma bandeira, ela se torna quase um dogma. Caso contrário, passa a ser errada e equivocada. Um anátema. Essa prática não deixa de ser autofágica. Pois não há uma verdade absoluta em nada no mundo. E para cada fato existem as versões que, para sermos corretos, devemos considerar, antes de alardearmos um julgamento.

Sou adepto da frase atribuída a Voltaire, de que “posso ser completamente contrário a tudo o que você diz, mas defendo ardorosamente o direito de você dizê-lo”. Esse é um dos pilares da democracia. Apenas acho que, como seres racionais, devemos refletir sobre a forma de expressar nossas opiniões e nossas criticas. Porque muitas vezes as pessoas são tentadas a generalizar. Até por desconhecimento do assunto e sua origem. E noutras circunstâncias, agem por pura, simples, desnecessária e gratuita agressão.

Anos atrás eu viajava de carro a Recife e chegando ao vizinho município de Paulista, me deparei com um problema. Uma carroça trafegava lentamente na avenida, congestionando todo o trânsito. Parei o carro e pensei em me dirigi ao condutor do veiculo para reclamar. Foi quando percebi que era uma carroça com um enorme barril cheio de água. Atrás do barril estava escrito: “Nunca diga dessa água não beberei”. Naquele momento, tirei instintivamente a maquina fotográfica do porta-luvas e fiz uma foto. Meses depois, ela venceu um concurso de fotografia, no longínquo Rio Grande do Sul.

Quero dizer com isso que, se eu tivesse ido tirar satisfações com o carroceiro, talvez não tivesse tido o insight de perceber que estava diante de algo bonito e diferente. Que me valeria um premio tempos depois, pela rara beleza da cena e seu conteúdo. Passei anos procurando nas minhas outras viagens terrestres algo semelhante, mas nunca encontrei. Aprendi com esse episódio que é necessário refletir sempre sobre o que nos aparece á frente, antes de emitirmos opiniões que podem ser equivocadas.

Participei na semana passada de um pequeno debate num grupo de WhatsApp, sobre os problemas brasileiros. Percebi quão fácil é criticar. Todos fazem isso. A maioria das pessoas culpa a classe politica. Mas se esquecem de que os políticos não vieram de Marte ou de Júpiter. Políticos não caem do céu. São pessoas como qualquer um, escolhidas através do voto, eleitos porque uma parcela da população assim o quis. Se for necessário haver mudanças, elas têm que começar a partir de nós mesmos. Melhorando o nosso senso de observação e a capacidade de analisar propostas.

Há muita coisa errada sim, não podemos obscurecer isso. Culpa do Governo e dos políticos? Sem dúvida eles têm uma imensa parcela de responsabilidade, embora não sejam os únicos culpados. Seria tudo reflexo da nossa colonização, da nossa gene, da errada prática de se querer tirar vantagem de tudo, do jeitinho brasileiro, da apatia do povo, que só reclama quando o seu sapato aperta, sem a menor noção de coletividade? Sem dúvida essas coisas também são responsáveis pelo atual estado de coisas. O fato é que temos que lutar muito para reverter a já crônica situação que se abateu sobre o nosso país.

Há uma palavra chave que pode mudar tudo isso: Educação. Mas precisa haver vontade politica para se realizar essa que é a maior e verdadeira revolução. Como aconteceu há três décadas nos Tigres Asiáticos, que hoje são grandes potências. Por isso eu confesso que no carnaval vivi momentos de tristeza. Ao ver multidões, em plena crise, saindo ás ruas para pular e dançar a Metralhadora. Foi quando pensei comigo mesmo: Por que essa multidão não sai às ruas para exigir Politicas Publicas efetivas do Governo Federal nas áreas mais criticas que existem no país, como a Educação, a Saúde e a Segurança?

Termino aqui essas reflexões pós-carnavalescas, que resolvi compartilhar com você, caro leitor, para começarmos a pensar juntos sobre alguns dos tópicos abordados. Como a responsabilidade nas críticas, a necessidade de evitarmos julgamentos precipitados, a revitalização da nossa humanidade, a objetividade nas nossas cobranças, a seriedade na hora das escolhas e finalmente, a necessidade de saber o que de fato queremos para o nosso futuro. E agora eu paro por aqui. Afinal, foram muitas reflexões para um curto período momesco. Que, ainda bem, terminou, Ufa!

Nelson FreireEconomista, Jornalista e Bacharel em Direito

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