QUEM MANDOU VOCÊ PARTIR?! –

(Em memória de Genival de Andrade Frazão

e demais vítimas do Covid-19)

Há tempos venho refletindo sobre a partida prematura de um ente querido, familiar ou não, do qual não tive tempo de me despedir.  Isso acentuou-se nesse tempo consumidor de vidas pelo tenebroso vírus pandêmico atual.

Passei a observar a relação “morte versus proximidade” comparando-a a uma série de números naturais, onde o ‘infinito’ (morte pelo vírus) está muito distante do ‘zero’, posição em que, certamente, desejamos estar. No entanto, à medida em que os casos vão se deslocando do infinito para perto de onde estamos, sentimo-nos ameaçados e amedrontados.

A angústia vai se instalando, pois tomamos consciência de que não temos controle algum sobre a situação que se avizinhou.

Um sintoma, um teste, uma agonia pelo resultado eleva o estresse. Se ‘negativo’, um ufa de “ainda bem” . Se ‘positivo’, em alguma parte do nosso organismo se instala o desespero, com pensamentos de “é o fim”, levando o indivíduo a se questionar frente a essa situação.

Os números dos casos, crescentes dia a dia, eram apenas nos noticiários. Naquela estatística não tinha nenhum amigo, nenhum conhecido e muito menos nenhum familiar. Até que uma febre, uma apatia, uma dor de cabeça, rouba-nos o paladar e o olfato.

Busca-se o socorro. Leva-se a um dos locais preestabelecidos, como ponto de atendimento aos casos graves. Triado e confirmado, vem a internação.

Será esse o momento do último olhar? Será o último ‘vai dar tudo certo’ ou ainda o último ‘eu te amo’?

Nesse instante se instala uma separação repentina e, certamente, assumimos literalmente a nossa inutilidade. Nada está ao nosso alcance, a não ser parar por alguns instantes e sair sem saber o que esperar. Resta a fé. A oração se intensifica. A busca pela misericórdia de Deus é a esperança. A corrente de súplicas pela cura é o único elo que liga o ‘eu’ com o ‘outro’. O ente amado, o amigo, o parente está entregue ao desígnio do Pai, ao carinho dedicado do médico e aos incansáveis afetos das enfermeiras e afins, que se desdobrarão em salvar aquela vida.

Voltar para casa e esperar um aviso alvissareiro, uma boa nova, é desesperador. Cada vez que toca o som do telefone dispara o pulsar do coração. Então a notícia. Para uns uma explosão de alegria, de ‘Graças a Deus!’ Para outros uma enxurrada de lágrimas, de ‘Oh! Meu Deus!’.

Num ansioso teclar, a missão de anunciar aos demais parentes e amigos a ‘volta dele ao lar’ ou comunicar a ‘ida para o lar do Pai’.

Aplausos ou choros. Vivas ou lamentos. Graças ou saudades.

Para esse, a vida segue. Para aquele, segue a vida sem ele.

Daí, a minha reflexão: tanto tempo que eu tive e, apenas fui somando as voltas percorridas pelos ponteiros do relógio. Deixei para amanhã o alô que poderia ter dado ontem. Deixei para depois o reatar da amizade. Deixei para amanhã o estender dos braços para acolher. Deixei para amanhã o perdoar, as minhas e as tuas ‘falhas’.

Agora é tarde.

Nenhum beijo na fronte, nenhum segurar de mão, nenhuma palavra de conforto, nenhuma oração, nenhuma forma de despedida.

Quem mandou você partir?!

Resta-me a promessa de Jesus: “Na casa de meu Pai há muitas moradas”. Oxalá, um dia, sejamos vizinhos.

Não perderei a nova oportunidade de te abraçar, de te acolher e, com a permissão de Deus, interceder por aqueles que deixaram de ser solidários por falta de tempo.

Portanto, caro amigo(a), se cuide, pois quero o bem que o teu sorriso me faz, ainda aqui.

 

 

 

Carlos Alberto Josuá Costa – Engenheiro Civil, escritor e Membro da Academia Macaibense de Letras ([email protected])

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