NA ONDA DAS PRIVATIZAÇÕES –

Via de regra, os processos de privatização obedecem a um receituário  bastante conhecido. Primeiro, saneia-se e enxuga-se a empresa a ser vendida, para depois repassá-la aos investidores privados. Segundo, divulga-se que a privatização vai reduzir o preço do produto/serviço. Terceiro, assegura-se que com a privatização aumenta-se a eficiência da empresa.

Ao final do governo Michel Temer, sua equipe econômica cogitava à venda do sistema Eletrobrás, sob alegação de má gestão e dívidas nas empresas integrantes do sistema, o que era contestado pelos sindicatos do setor elétrico, haja vista que a Eletrobrás dava lucro, praticava uma tarifa bastante inferior ao preço de mercado e já tinha posto em prática um plano de aposentadoria extraordinária para seus funcionários, resultando numa economia anual de recursos de R$ 877,0 milhões. Naquela altura, o governo também cogitava arrecadar R$ 12,2 bilhões com a venda do controle acionário, o que era considerado por especialistas um valor irrisório, na medida em que afirmavam que “só para construir um parque com os 48,6 mil MW de capacidade de geração do sistema Eletrobrás, seriam necessários investimentos da ordem de R$ 370 bilhões”, demonstrando que o preço pretendido estaria muito aquém de um sistema de energia desse porte.

Agora, no governo Jair Bolsonaro, o Ministério da Economia, através da criação da Secretaria-Geral de Desestatização e Desimobilização, fundamenta a importância da privatização de empresas públicas, sobretudo daquelas deficitárias e que necessitam de recursos do Tesouro para sobreviver, como forma de arrecadar recursos para redução da dívida pública. A lista é extensa, haja vista que temos hoje 138 empresas estatais !

Vale dizer, mesmo apresentando indicadores competitivos e sendo responsável por 30% da geração de energia elétrica produzida no país, a  venda do sistema Eletrobrás, integrado pelas empresas Eletronorte, Eletrosul, Furnas e Chesf, volta a correr o risco de ter seu controle acionário entregue à iniciativa privada.

É relevante ressaltar que, se levada a efeito, à privatização da holding do sistema elétrico deverá impactar à economia nordestina, através da venda da Companhia Hidroelétrica do São Francisco – Chesf, cuja jurisdição estende-se a 8 estados do Nordeste. Dispondo de 12 hidroelétricas, das quais 8 ao longo do rio São Francisco, e praticando uma tarifa média de R$40/MWh, essa empresa tem uma importância crucial para o desenvolvimento da região, não só por responder por uma potencia total instalada, da ordem de 10,3 mil MW, dando suporte à implantação de novas indústrias e ao agronegócio, mas, também, por gerenciar o principal rio do Nordeste, conferindo ao “Velho Chico” o carácter de multiuso: fornece água para o polo irrigado de Petrolina/Juazeiro; permite a navegação fluvial; viabiliza o turismo regional; e abastece inúmeras cidades ao longo de seu percurso.

Ao privatizar à Chesf, uma das empresas mais enxutas do sistema Eletrobrás, não há garantias de que a iniciativa privada assuma todos os benefícios proporcionados por essa estatal na região, onde se incluem, além dos já referidos, o saneamento do rio, o pagamento de royalties a municípios que tiveram parte de suas áreas inundadas, para a construção das hidroelétricas e, sobretudo, a condução do programa de revitalização das margens e nascente do São Francisco, indispensável para a contensão da erosão e do assoreamento, mormente nos períodos de cheia, como advogam os ambientalistas de plantão.

Não seria forçoso reconhecer o descrédito da população com a privatização de grandes empresas públicas responsáveis por serviços essenciais. Pesquisa realizada pelo Datafolha, indicou que 71% dos brasileiros ouvidos são contra a privatização de estatais, enquanto que 20% opinaram a favor. Privatizar o setor elétrico não deve significar só a captação de mais recursos, mas, também, a modernização dos sistemas, a melhoria na eficiência energética e, principalmente, a prática de tarifas mais baixas para o consumidor final. Chega de contas com bandeiras vermelha, verde e amarela!

 

Antoir Mendes SantosEconomista

 

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