http://www.operariosdaweb.com.br/wp-content/uploads/2014/06/cena-de-a-historia-real-de-david-lynch-1365795059101_956x500.jpg

David Lynch é um dos grandes nomes do cinema surrealista, além de ser uma das figuras mais excêntricas que conheço. Veste sempre um paletó preto e branco e é do tipo que odeia quando perguntam sobre seus filmes. Seu cinema possui uma linguagem extremamente hermética, recheada de simbolismos e particularidades, que provocam uma grande dicotomia em sua carreia: seus filmes ou são amados ou são odiados. Mas como grande parte dos diretores têm um ou dois filmes que fogem dos seus eixos idiossincráticos, Lynch não poderia ficar de fora.

Em “História Real” (Straight Story), o diretor nos apresenta a antítese de toda a sua obra. A começar pela parceria feita com os estúdios Disney, o que logo nos leva a crer que o filme é feito para todas as idades.

A película nos conta a verídica história de Alvin Straight (Richard Farnsworth), um senhor de 73 anos que vive na pacata cidade de Laurens no Iowa. Certa tarde, através de sua filha, Alvin recebe a notícia de que seu irmão Lyle, o qual não o vê há dez anos, sofre um derrame e encontra-se em estado crítico de saúde. O impacto da notícia o faz repensar em toda a sua trajetória de vida e no tempo em que ficou longe do irmão. Em um ato impulsivo, Alvin decide percorrer 500 quilômetros até Mount Zion, no Wiscounsin, para rever o irmão. Por não ter habilitação e não gostar de andar de ônibus e avião resolve fazer o caminho de uma forma inusitada: pilotando um cortador de gramas.

A partir daí, o filme assume o caráter de road movie, e começamos a acompanhar toda a trajetória do personagem ao encontro do irmão. Por ser um homem de idade avançada, Alvin carrega uma gama de experiência e maturidade, que vai sendo revelada durante a narrativa. O percurso é mostrado de uma forma contemplativa, construído com belíssimos planos gerais da geografia local, com imagens de campos de centeio e milharais, que são fundamentais para a concepção estética do filme.

No decorrer da viagem, vários personagens vão surgindo de encontro a Alvin, e o mesmo acaba sendo visto como uma espécie de mentor. Em um dado momento, conversando com um grupo de ciclistas, um deles questiona o que há de pior na velhice e, elegantemente, Alvin responde que “a pior coisa é poder se lembrar de toda a juventude”. A estrada nos ajuda a conhecer o passado de Alvin, pois ele vai sendo revelado durante seus diálogos. A trilha sonora do compositor Angelo Badalamenti (parceiro de Lynch em diversos projetos), além de belíssima, é fundamental para a composição dramática do personagem. Arrisco-me a dizer que foi a trilha mais bonita que já ouvi em um road movie.

“A história Real” é um filme poético e seu roteiro não possui complicações, muito pelo contrário, é a total simplicidade que o torna magnífico e comovente. A atuação de Farnsworth lhe rendeu a indicação ao Oscar do ano 2000. Assistam. E se em algum momento uma lágrima escorrer de seus olhos, é sinal de que a mensagem foi realmente compreendida.

PS: Para quem não compreende o termo, road movie ou filme de estrada, é um subgênero criado para definir filmes onde a narrativa se desenvolve a partir de uma viagem. A própria estrada também acaba se tornando um personagem.

LUCAS GALVAO IMG_20140602_160441128 LUCAS

Lucas GalvãoBacharel em Cinema e Critico  

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *