…E FORAM FELIZES PARA SEMPRE –

As histórias de trancoso ou da carochinha sempre despertaram o interesse das crianças e, porque não, dos adultos embevecidos pela narrativa, pela curiosidade e pelo desfecho, quase sempre, poético.

Contar e ouvir histórias transportava o imaginário para o campo da realidade (não vivida) e, associava diversão e reflexão. Na hora de contar histórias todos se uniam em laços de amizades, em convívios culturais diferentes ou não, porém dispostos a viverem as emoções surgidas com o desenrolar dos fatos. O imaginativo individual criado conforme a amplitude da percepção tornava a história em uma transmissora de conceitos e valores que iam se moldando ao entendimento de cada um.

Contar histórias parece ter nascido com o próprio homem, pois cenário e acontecimentos já estavam postos para exercitar a sua criatividade. Como exercício, “E Deus moldou o homem com o barro e soprou para dar-lhe vida”: Que tipo de barro? Qual a sua cor? Qual a sua consistência? Qual o modelo para o molde?  O sopro foi leve ou intenso? Qual a reação do criado ao confrontar-se com o Criador? Certamente cada ouvinte formará em sua mente aquilo que melhor lhe convêm à sua largueza imaginativa.

O bom das histórias de trancoso é que elas são isentas de quaisquer considerações científicas. Elas proporcionam um bordado de palavras que vão assumindo uma magia e criando uma fantasia que prende a atenção de quem se dispõe a ouvi-las. Realidade e ficção vão se emaranhado em emoções que podem fazer chorar, sorrir ou até ser cúmplice da situação narrada.

Eu sempre gostei de ouvir e de contar histórias. Eu vou criando os personagens e as vivências de acordo com o interesse do ouvinte. Tem horas que o nó aperta e dá um trabalho danado para repor os pontos nos is.

Para colocar meu neto (Lucas Josuá Rocha) para dormir, me inspirava naquela famosa do “contar os carneirinhos”, só que eu criei a historinha da seguinte forma:

Era uma vez um menino que queria alcançar o céu. Ele então teve uma idéia e ligou para Lucas:

-Alô, você tem uma escada grande?

-Tenho. Vou levar para você.

O menino então começou a subir… a subir… a subir… Mas ainda estava muito longe das nuvens, quanto mais do céu. Ele então ligou para outro amigo e pediu mais uma escada grande, bem grande, para emendar uma na outra. E assim fizeram. E ele começou a subir… a subir… a subir… e nada de chegar perto.

Foram emendando escada com escada até que ultrapassaram as nuvens. Encantado com o feito, o menino chamou Lucas para subir e ver o azul infinito. E Lucas foi subindo… foi subindo… subindo… subindo…  subindo… E quando Lucas chegou lá no alto chamou outro coleguinha e este começou a subir também. E foi subindo… subindo… subindo…

Lá pelo meio da história, de tanto unir as escadas e demandar esforço para galgar cada degrau adormecia Lucas ou caia no sono eu, ou ambos. Quando era eu, ele dizia: “Vovô não vai  subir mas não? Cansou?”.

Pois é!

Mas as histórias que hoje me contam, que leio e que acompanho nas mídias e na vida real são de emoções muito fortes. Elas exprimem o atual comportamento que a sociedade experimenta, onde não mais se cria uma narrativa para alegrar, para despertar a curiosidade, para dar amplitude ao imaginário, para torcer por um final feliz.

O personagem deixou de ser o menino, a menina, o velhinho, a fada, a bruxa malvada e passou a ser o “eu”. Eu fiz isso, fiz aquilo, eu sou o mais sábio, eu sou o mais inteligente, eu sou o mais destemido, eu sou o tal. As histórias perderam seus encantos, pois saíram do campo imaginativo para o campo do esnobismo, para a falta de humildade, para o menosprezo da condição do outro, pelo pensar apenas na primeira pessoa do singular.

No palco da vida atual, os contadores de lorotas exigem que o holofote dirija seu foco apenas para ele. Não percebe que o público vai cansando por não ser dado espaço para um outro ator, que possa também “entrar pela perna de pau e sair pela perna de pinto”.

Portanto vou criando fins para muitas histórias, na esperança de que algum dia a lâmpada mágica livre todos nós (os aladins) das angústias e dos desacertos que hoje amargamente nos submetemos.

Finais como:

E então as crianças, todas alimentadas, brincavam com saúde…

E então todos os jovens aprenderam a ler, a escrever, a terem os seus valor morais e de forma substancial para, de cabeça erguida, assumir o “amanhã” de sua vida…

E então todos os idosos tiveram amparo, respeito, assistência familiar e proteção do estado, de tal forma que apenas extraímos de seus sorrisos a gratidão pela vida e pelo descanso…

E então todos, sem cotas, sem discriminações, foram capacitados pelas excelentes escolas, entraram para o mercado de trabalho e puderam traçar a trajetória de suas vidas…

E então as famílias unidas pelos laços da compreensão entre si foram respeitadas e abençoadas…

E então o amor, a caridade, a solidariedade, deram-se as mãos e foram felizes para sempre…

E então a humanidade compreendeu que Deus é o Pai de todas as raças…

E então Deus, na Sua benevolência, “abraçou” cada um de seus filhos…

São muitos os finais para as nossas histórias.

Que tal criar um final feliz também para a sua história!?

 

 

 

 

Carlos Alberto Josuá Costa – Engenheiro Civil, escritor e Membro da Academia Macaibense de Letras ([email protected])

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

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