COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: COISAS DE EXPEDITO NO SÍTIO LAGOA VELHA – 

Conforme tinha prometido, se aproximando o São João, Expedito me liga, dizendo que vai alugar um UBER, para me visitar no Sítio Lagoa Velha.

Ainda mais, há tempos não viaja, por conta do vírus chinês, mas como já tomou as duas doses da vacina falsificada da China, vai dar uma saidinha do Seridó, para rever as terras do Agreste.

Chamei Niel, e mandei logo separar umas caipiras e uns guinés, pois sabia que o consumo das “penosas”, ia ser grande.

Como, recentemente, eu tinha ido a Natal, estava com a adega abastecida de Cachaça Extrema. Sem preocupação.

Enfim, essas eram as providências básicas para receber o meu amigo, que é pessoa de hábitos simples do seridoense, que anda com a sua rede debaixo do braço, e diz que qualquer umbuzeiro é suficiente pra armar sua “tipoia”.

No mais, era garantir que lá no supermercado de Bento, tivesse sempre um bom queijo de manteiga de Jucurutu, sem poder faltar uma boa carne de charque, para as feijoadas plenas de toucinho, costela, pé e orelha de porco.

Na conversa, foi logo dizendo: Dotô, nem si impreocupe de comprá carne seca – que hoje chamam de carne de sol – pôs eu levo uma manta de chã de fora, preparada pelo meu cumpade Joca, de orige de um boi capado qui ele ingordô na “vazante” das beirada do assude.

O BOI

Escuto Expedito dando boas risadas e pergunto qual é a graça.

Ele fala: istava si rindo de mim mermo.

Quem já si viu “boi capado”?

Dotô, isso é redudança. Boi, já qué dizê, um garrote capado.

Olha Expedito. Pelos costumes de hoje, não estão mais fazendo muito, essa diferença.

Antigamente quando se falava “touro”, significava que era um animal reprodutor, portanto, que não era castrado.

Hoje é comum dizer e ouvir falar, por exemplo: o filho de Lula Ladrão, aquele que juntava bosta de elefante no zoológico, roubou tanto, que tem não sei quantas fazendas e mais de cem mil bois, somente numa delas.

Expedito. É tudo no confinamento, e tudo “inteiro”, sem ser capado.

É verdade Dotô. Como eu num vejo mais a Grobo, só assisto as coisa no youtubi, asto dia tava vendo uns filme sobre aqueles minino besta da JBS, e o reporte falava qui êlis tem confinamento de boi, no Brasil, Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Austrália. Tudo boi.

 

MESTRE GUGA, A SURPRESA

Uma coisa não falei para Expedito, foi a presença no Sítio Lagoa Velha, do meu amigo, e dele também, Augusto Coelho Leal, o Mestre Guga, escritor imortal da Academia Norte-Rio-Grandense de letras, que foi conquistar uma mulher bonita e gente muito boa, lá no Seridó, e até escreveu um livro pra ela, “Rosinha dos Limões”.

Aí meu amigo, logo na chegada, foi uma festa.

Sendo ainda no início da tarde, programei para ir beber umas cervejas, com tira gosto de tilápia, lá no restaurante de Valmir, o “Restaurante Pôr do Sol”, e depois ir lá na “Pousada Pedra Grande”, do casal amigo Junior Gurgel e Lorena, onde encontramos Dudu Vila e sua mulher Marluce, agora também empresários do turismo, como proprietários da “Vila Feliz” e do “Flor da Serra Artesanato”.

Foram grandes papos.

Quando estava próximo à hora do jantar, Expedito falou: Dotô Antonio, eu sôbe qui tem um lugá muito bom, lá im Gamelera, qui é o “Restaurante Delícias da Josy”.

Diz qui tem uma piza, muito boa, e, cumo tá na hora do jantá, uma sopinha cazêra, tombém, além de muito docinho gostoso, qui eu sôbe qui tem lá.

Então, eu falo: Expedito, vale a pena ir lá. Josy, além de ser uma excelente cozinheira, é uma mulher bonita e educada.

E ele diz: vamo simbora.

Foi aquele sucesso. Josy se divertiu muito com as coisas de Expedito, Mestre Guga, disse alguns enxerimentos, e, todos nós, rimos muito.

Tinha um pessoal que estava fazendo trilha na região, que se integrou nas nossas brincadeiras, e, no final, todo o grupo disse que ia fazer a maior propaganda do restaurante.

Chegando no chalé do Sitio Lagoa Velha, como, Expedito e Guga não se encontravam, fazia tempo, o papo rolou franco.

Lá pras tantas, da noite, eu precisei dizer: senhores, aqui temos todo o tempo do mundo, também, para conversar.

Mas agora, vamos dormir, pois daqui há pouco, quando amanhecer, tomamos leite cru, com conhaque, no curral, e, para o café, Ana, mulher de Niel, já fez canjica, teremos milho cozido e coalhada, ovo frito e queijo assado, com café bem quente, para forrar o bucho, pois vamos dar um passeio até Araruna, na Paraíba, que é dia de feira, e tem muito o que a gente ver por lá.

Ainda bem, que os quartos tem isolamento, pois a roncaria, e outras “cositas”, foram grandes.

Digo isso, porque acordei para beber agua e fazer xixi, e pensei que o barulho, era algum fenômeno da natureza.

Por volta das sete horas, acordamos, “na marra”, e fomos todos para o curral.

Durante a “tirada” do leite, Niel aproveita para contar as mais novas presepadas Gameleirenses.

Eu, fico só ouvindo.

Uma delas é a história de Rosinha e Quincas.

Segundo Niel, Rosinha, que é muito fogosa, já não muito satisfeita com o desempenho de Quincas, mandou ele ir “simbora”, mas o dito cujo não foi.

O motivo dele não ir embora, é não sair, para não perder a parte que tem direito na casa.

Pra provocar a saída dele, Rosinha resolveu rebocar homem e trazer pra dentro de casa, mas Quincas, faz de conta que não tá nem aí. Nem liga.

Segundo comentam, ele diz: “taí, Rosa pensa que é assim!”

Dali, não saio.

Outra história é a de Francisquinha, que foi para uma vaquejada, com Severo, e, chegando lá, ele se embriagou e foi para um forró dançar, deixando ela sozinha.

Francisquinha, se aporrinhou, não esperou por ele, e voltou para casa.

Quando Severo chegou, já pela manhã, dia claro, encontrou Manezinho esparramado na sua cama.

Então, pergunta: Francisquinha, o que é isso?

E ela responde: você tá cego? Não tá vendo que é Manezinho?

Pois é. Ele agora vai ficá aqui cum nóis, e você, pode ir pros forró dançá com as quenga.

Até hoje, o trio permanece morando na mesma casa, e Severo, solto na buraqueira dos forrós.

COISAS DA HISTÓRIA DE GAMELEIRAS

Expedito se solta para colocar pra fora os seus conhecimentos regionais, e explica para Guga, que, a origem do município foi o Sítio Monte Alegre, que ficava na Serra de São Bento, e já em 1870, era conhecido como área de criação de gado, virando, depois, um povoado.

Sabe porque mudou de nome? Pergunta.

Como Guga não sabia, ele diz. Seu Guga, foi purque criaro o Município de Monte Alegre, isso já agora, pelo ano de 1953.

Então, pra não ficar dois Monte Alegre, e, como na região tinha muita arvore chamada gameleira, mudaram o nome du povoado prá Monte das Gameleiras.

Sabe quem mudou o nome? O Deputado Theodorico Bezerra, que mandava e desmandava na região.

Aí, Guga pergunta: e quando mudou o nome, Monte das Gameleiras, já ficou sendo Município?

Não seu Guga. Monte das Gameleiras só virou Município em 1963, quando foi desmembrado de Japi.

Ói seu Guga. Monte das Gameleiras, naceu prá sê importante.

Hoje, num tem nem 3.000 habitante, mais, daqui a pouco, nus fim de semana, vai tê mais gente de fora, du que us daqui.

Como tá na Serra da Borborema, tem clima frio, durante quasi todo o ano, a sede tá mais ou meno a130 km de Natal, purtanto, bem pertinho.

As vêz, uma pessoa de Natal, gasta menus tempo de vir e vortá, qui si fosse prá uma praia.

As pousada é tudo cheia nos fim de semana, quasi o ano todo, e no inverno, tá tudo lotado, o tempo todo.

Quando chove, e inté quando num chove, no meio do ano, as temperatura chega a 13 grau.

É interessante, a neve – qui num é aquela do sul – qui aparece aqui e cobre tudo.

Os turista acha ótimo.

Hojí, já si iscuta umas fala diferente. São os istrangero chegando.

Daqui á pôco, o povo daqui tem qui aprendê ingrês.

Aquí, tem de tudo prá si fazê. Inté quem gosta de aventura, pode decê nas pedra, cum aquelas corda, ou subí feito lagartixa, si agarrando nus buraco do lagero.

Alí, junto ao Sítio Lagoa Velha, onde nós foi vê o Cruzeiro, é um dos lugar mais visitado, e istá a 550 metros de artitude.

COISAS DA HISTÓRIA DE ARARUNA

Agora, eu é que vou mostrar os meus conhecimentos.

Guga. O nome Araruna vem do tupi “a’rara una”, que significa arara preta.

Embora não fossem pretas e sim de plumagem azul escuro, existiam, muitas delas, na região da serra, mas sumiram, pela ação do homem.

Hoje, quase você não vê, nem “periquito tapacu”, também conhecido como “verdelinho”.

Pois é. Araruna se localiza na parte mais alta da Serra da Araruna e está a 580 metros acima do nível do mar, se limitando com quatro municípios do Estado do Rio Grande do Norte: Japi, Monte das Gameleiras, Serra de São Bento e Passa e Fica.

Guga, seu colega, Dadá, engenheiro, e uma grande figura do Seridó, o homem da Cachaça Samanaú, me diz: “Toinho, eu não tenho inveja de nada, a não ser, quando chove na fazenda do vizinho e não chove na minha”.

Eu, como também não tenho inveja de nada, as vezes, me dá uma sensação, parecida com inveja.

Araruna está 30 metros mais alto do que Gameleiras e até o Parque Estadual da Pedra da Boca – que muitos pensam ser do Rio Grande do Norte – é da Paraíba.

Além do famoso Barão de Araruna, das antigas, de passado mais recente, tinha influência na área, José Targino Maranhão, político paraibano, ex-deputado estadual, ex-deputado federal, ex-senador e ex-governador da Paraíba.

Eu costumava perguntar, como danado tem asfalto, nas terras da Paraíba, até oito quilometros da entrada da cidade de Monte Gameleiras?

Taí, a explicação.

O PASSEIO ATÉ ARARUNA

O percurso é pequeno, mas tá bonito de se ver.

Passamos pelo Distrito de Magalhães, paramos no pé da serra da Macambira, que chega a nos fazer pensar: como Deus é grande, por tanto contraste e grandiosidade.

Seguindo em frente, apesar do pouco inverno, tudo é verde. Muito milho e feijão plantados, as vezes, de serra acima, aguardando a chuva que Jesus ainda deverá mandar.

Chegando em Araruna, depois de um pequeno “city tour”, olhando o que resta do casario antigo, fomos para a feira.

Vi, que Eduardo Vila tem razão, quando sai de Serra de São Bento, para fazer feira em Araruna.

Uma diversidade grande de produtos, e de boa qualidade.

Depois das compras, foi beber uma cervejinha gelada, e voltar para o Sítio Lagoa Velha, onde nos esperava, galinha e guiné torrados, com o respectivo pirão, além do arroz feito com o caldo, que mais parece um risoto.

Umas boas lapadas de Cachaça Extrema, foram bebidas, para “abrir o apetite”, repetidas no durante.

A tarde, só merecia uma boa rede.

A SAIDEIRA

No dia seguinte, Guga já se preparava para voltar para Natal, que Alzira vinha lhe buscar, então falei pra Expedito.

Amigo. Guga não vai ficar por aqui, amanhã, para comermos o churrasco de uma marrã, com 12kg, bem gordinha e suculenta, mas teremos a companhia de Niel, Ana e os meninos, Raniel, Miguel e Emanoel.

O que escutei, não gostei.

Expedito fala: Dotô Antonio, já passamo esses dia cumendo seu pirão, mas, amanhã, eu vou simbora.

Eu falo: mas Expedito, vão me deixar sozinho? As “mininas” já me telefonaram dizendo que vinham passar o fim de semana, e a maior atração era você…

E agora? Quando chegarem aqui, “vai ser o canto mais limpo”, e o que eu vou dizer?

Infelizmente Dotô, num vô pudê ficá.

Tenho qui passá no Seridó pra receber umas conta das mercadoria qui vendi, e Nana me telefonou prá eu ir pru Clubi dos Radioamador, pois Missia do Paraguai, vai tocá lá.

No fim de sumana, vou beber uma taça de vinho cum Regina, e ispiá umas cerâmica qui ela tá fazeno, e, nu dumingo, talveis, vá dá um pacêio de barco, lá pelo rio Potengi, cum um pessoal amigo.

Ô coisa boa, tê a vida livre, Dotô. Tem muita coisa prá si fazê, e vivê “como Deus qué e consente”.

Expedito, essa visita de vocês, foi uma visita de “buscar fogo”. Nem deu tempo para comer a feijoada, mas tenho que concordar que a vida é curta, e a gente tem que fazer o que acha melhor.

Pois é Dotô, o sinhô sermpri me disse. Expedito, quem vai na cabeça dos outros é piolho, e eu, agora, só fasso o qui eu quero.

Tô perto dos meus filho, tenho tempo de cunversá com meus neto, virei pai outra vez e acompanho a vida das minhas netas.

Incrusive, quando tô no Seridó, vou pegá elas na escola, como fáis um avô di respeito.

Tô curtindo, e vou curtir meus últimos tempos, como um pai e um avô, di mermo.

Prá outras coisa, eu vou no rumo da venta. Onde me viru, e mim dá vontade, é pra onde eu mim mando.

O tempo é pôco prá si tê arrependimento, e é comu o sinhô diz: “a vida é fáci. Nois é qui cumprica”.

Nisso, escuto uma voz no celular, e era a voz de Expedito.

Meio assustado, “apuro o ouvido” e ouço o que ele diz, repetindo: Dotô, Dotô, ô dotô. O Sinhô parece qui tá sonhando, desdi hoje, qui num fala nada.

Quase que acordando, abro os olhos, olho em redor, e digo.

É Expedito. Eu cheguei à conclusão, de que a gente também VIVE, no pensamento.

Agora, depois desse papo, vou tomar um banho, beber uma lapada de cana, e comer uma galinha torrada, que Ana, preparou para o almoço.

Um grande abraço.

Como sempre, Expedito, sem desligar o telefone, continua falando, e escuto ele dizer: qui papo? Vôtis. Meu Deus du Céu, o Dotô tava era sonhando. Quem danado tava batendo papo cum ele, si, nem eu, tava falando?

Esse viru chinêis tá dexando a gente um meio disorientado.

Qualqué dia desse, vou chamar Sêu Guga pra ir lá im Gameleira, fazê uma surpresa prá Dotô Antonio.

Achu qui ele tá é pricisando di cunvessá.

 

 

 

 

 

Antônio José Ferreira de Melo – Economista – [email protected]

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

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