CHATO DE GALOCHA –

Fui a Mossoró, aproveitei a viagem entrei até Boi Selado perto de Jucurutu e fui à fazenda de Manoel Carmelito Feliciano da Silva, conhecido carinhosamente pela população como Mane Cabeleira, ou Cabileira que é como o povo o chama. Homem calmo, alto, gordo, bonachão, desses bons da gente se sentar e jogar conversa fora. A sua fazenda uma beleza, do alpendre da casa grande da pra gente visualizar as serras querendo verdejar com as últimas chuvas. Nunca tinha visto Mane afobado, foi a primeira vez. Fui chegando na casa de Cabileira que carinhosamente chamo de Manezinho. De longe, avistei Mane andando de um lado para outro e percebi que o homem estava nervoso. Parei a minha caminhonete na sombra de uma jaqueira, desci e fui me aproximando e perguntando:

– Tudo bem Manezinho? Como estão as coisas por aqui?

– As coisas vão bem, doutor Augusto, mas eu não estou bem não.

– Porque amigo, estás doente? Estou te vendo forte e disposto, o que está acontecendo?

– Doutor Augusto, o senhor sempre que pode passa por aqui para a gente prosear. É uma prosa alegre, sadia. Quando o senhor vai embora eu comento com Joaninha. Como o senhor deixa saudades

– Obrigado Manezinho pela consideração, eu também gosto muito de vocês. Por falar nisso, como vai a Dona Joaninha?

– Vai bem, mas agora ela passa o dia ouvindo um disco que o senhor deu pra ela. Mas deixa pra lá, desculpe não ter mandado o senhor se sentar, sente-se, por favor. Escute a minha história pra vê se eu não tenho razão e o porquê desta minha raiva toda. Aqui tem um cidadão, que é tão chato, mais tão chato, que o seu apelido é chapadão. O sujeito é desses cabras feio, magro veio, xexelento, torto que só escoliose em galho de jurema, avermelhado que só pimentão. O filho da puta do desconjurado tem uma cara que parece mais com aquela jaca murcha que ta perto do pneu da camionete do senhor. Pois bem doutor, esse amardiçoado veio hoje aqui, passou a manhã toda conversando merda para Joaninha e Francisquinha minha cunhada. O homem pra cima de mulé véia é conversador, ele é igual a defunto pra gostar de coroa, acho que o desgraçado errou de profissão e em vez de ser professor o miserável devia ter feito uma sociedade com os Vilas e colocado uma casa pra vender coroa lá em Natal.

Doutor Augusto, a Francisquinha enviuvou faz pouco tempo. Ainda no enterro do falecido, eu notei que o peste já estava com os zoios má intencionados, pra pobrezinha. Já comecei a ter raiva do infeliz naquele momento. O cara é conversador, liso que só tábua de escorrego, mas vive contando goga. Anda num carro véio financiado, tomador de cachaça fiado, vive fazendo conta nos bares, mais gosta de se amostrar, se amostra mais do que as bundas das muié lá na praia do senhor.  O cabra já botou diadema de vaca na testa, mas se gaba de viver comendo gente que eu até pensei comigo mesmo. “Isto num é mais nem um homem, parece mais uma onça”. Doutor Augusto o senhor já conheceu gente assim?

– Já Manezinho, conheço desde pequenininho, muita gente parecida com esse cidadão.

– E como o senhor aguenta?

– Olha Manezinho, quando a gente é criança a gente vai a via dos fatos, mas quando vamos envelhecendo, a gente vai vendo as coisas de outra maneira e aprendendo a conviver com esses abestalhados.

– É mesmo né doutor, o senhor tem toda razão. É por isto que gosto de conversar com o senhor. O senhor fez com que eu me acalmasse… (pausa)

– Ô muié, para de ouvir esse disco! Tu passa o dia todo ouvindo esse disco, com essas músicas bonitas    e o cantor com essa voz cavilosa no pé do teu ouvido. Eu já estou ficando desconfiado. Se levanta, e traz o café de doutor Augusto.

Dei uma risada e disse para Manezinho:

– Amigo, não tenhas ciúmes deste cantor, pois este cantor, sou eu, seu velho amigo. Foi esse o disco que gravei e essas músicas bonitas, algumas letras e músicas são de minha autoria.

– Doutor Augusto esse cantor é o senhor?  Benzó – Deus. Joaninha, liga de novo a radiola.

– Manezinho o papo ta bom mais tenho quer ir. Até mais amigo.

-Até doutor, boa viagem, vá com Deus e volte logo, vou ficar ouvindo sua música.

-Tchau amigo.

 

Guga Coelho LealEngenheiro e escritor

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